Carlos Eduardo - Estamos no hospital desde de seis horas

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Estamos no hospital desde seis horas e ainda não temos notícias. Bruna está chorando encostada no meu peito, não tenho nem coragem de me mexer. Não quero que ela se afaste. Bruna precisa de ajuda. Precisa de alguém, mas não tem ninguém aqui por ela. Percebi quando chamou sua agente. Quem é que chama uma funcionária numa hora dessas?

Acho que a avó dela vai ficar bem. A enfermeira do Home Care garantiu que situações como aquela eram comuns na condição da avó de Bruna. Minha parceira, entretanto, está inconsolável. Principalmente, porque Dona Adelina vai ter de passar uns dias na UTI para observação.

─ Você já pode ir se quiser... – A agente olhava para mim com piedade. Daniela sentou-se ao nosso lado no sofá. Começou a fazer carinho nos cabelos de Bruna. ─ Eu a levo para casa. Não se preocupe. Você já fez demais. Obrigada. – Ela me disse isso e começou a tirar a moça do meu colo. Foi me dando um aperto grande no coração, pois Bruna continuava agarrada a mim.

─ Eu não quero ir agora. – Ela me abraçava ainda mais.

─ Minha querida, já é tarde. – Daniela insistiu de maneira educada. – Sua avó está muito bem assistida. Você não poderá vê-la. Vá para casa, princesa. – Era como se falasse com uma criança. – Amanhã você precisa estar maravilhosa para aquela campanha, não é mesmo?

Quem vai pensar em campanha publicitária numa hora dessas? Que mundo é esse? Quem é essa mulher tão mesquinha? Meu estômago revirou de nojo.

O estímulo, entretanto, fez Bruna se acalmar um pouco. Ela respirou fundo. Limpou o rosto com as costas das mãos e se levantou. Quem é essa garota que pensa em dinheiro numa hora como essa? A única pessoa da família dela estava na UTI. Eu continuava enojado.

─ Bruna, - segurei o seu rosto entre as minhas mãos – se você quiser, eu fico com você aqui...

─ Não posso ficar, Kadu. – Ela já estava de pé. Muito determinada. – Tenho trabalho bem cedo amanhã de manhã e ainda nem decorei as falas. – Acho que meu olhar denunciou toda a minha censura por causa desse apego tão grande ao dinheiro. Aquela ganância me deixava com ânsias. Bruna deve ter percebido o meu julgamento, porque me encarou com altivez e disse – Não me censure, garoto. Você não sabe quem sou eu ou de onde eu vim para me julgar. Está vendo essa estrutura aqui, enfermeiro, médico especialista, ambulância, UTI... Tudo isso é muito caro. E quem paga sou eu. Não tenho nem papai nem mamãe para bancar minhas festinhas, ok? Eu posso ser atriz, mas vivo num mundo bem mais real que o seu.

Ela pegou a bolsa e deu meia volta sem me dar tempo de pedir as minhas já tradicionais desculpas. Bruna estava certa. Voltei a sentar no sofá da sala de espera. Fiquei ali sem ter mais o que dizer observando Daniela abraçar Bruna e caminhar com ela até o elevador.

Como eu sou idiota. Nem todo mundo tem pai e mãe para ajudar. Bruna não tinha ninguém. Desde quando ela pagava as contas? Desde quando todas as responsabilidades eram dela? Senti imensa admiração por ela, pela força que demonstrava ter encarando tudo isso.

Eu estava enlouquecendo por ter de administrar uma casa de show. Mesmo tendo todo o auxílio possível. Nem sequer o investimento inicial era meu. Meu pai ajudava na contabilidade. Minha mãe nas relações públicas, nos contratos. Eu carregava o nome e o prestígio deles nas costas. Tudo mais facilitado.

E não pagava nada. Eu não tinha contas minhas, não pagava aluguel, nem prestação de carro. Eu não tinha risco, nem responsabilidade. Só aí me dei conta que eu era um menino sendo carregado nos ombros de adultos, apenas preparando meus primeiros passos com uma rede de segurança ao meu redor. E que isso já era bem difícil.

Bruna, no entanto, já era adulta. Para ela, não tinha o talvez. As coisas tinham de funcionar. Fiquei me sentindo a pior das criaturas por ser tão mesquinho.

Resignei-me a esperar. Eu precisava me redimir. O sol estava nascendo quando uma médica veio procurar por Bruna na sala de espera. Eu me apresentei como representante dela. A médica não se convenceu facilmente e perguntou quem eu era.

─ Sou o namorado dela. – Respondi com firmeza.

Assim que a médica me deu as informações, mandei uma mensagem de texto para o celular da Bruna.

Ainda tô no hospital. Dra Sara avisou que sua avó está estável e q vai pro quarto hj.

Não demorou muito, a resposta chegou em letras garrafais: OBG.

***

Por Onde AndeiOnde histórias criam vida. Descubra agora