A cada dia que passa, eu me surpreendo mais com a minhas habilidades de ginasta. Desde que comecei com Jodernan e Jefferson, não consegui mais parar. É uma loucura esse negócio! Fiz primeiro um passinho ou outro, passei pelo free style e agora estou rodopiando em giros no chão e passos aéreos na influência do hip hop com tanto interesse que não me vejo parando tão cedo. Haja força muscular e coordenação.
Eu aproveito cada minuto da lição. Fico no escritório só contando os minutos para a próxima aula. Hoje, além dos problemas da Atmosfera, ainda tive que dividir minha atenção com um carro. Alguém me deu um carro. Alguém não, Bruna "Encrenca" Drummond.
À princípio, quando vi o carro chegando, pensei que o pessoal da seguradora tinha sido mais eficiente do que o normal. Mas estranhei, uma vez que carros blindados demoram ainda mais do que os convencionais para chegar.
Só quando dei uma olhada mais de perto no carro, o mesmo modelo popular que eu tinha, foi que percebi que não era blindado e fui perguntar o que tinha acontecido. Aquela maluca não me diz nada. Não pede desculpas. Simplesmente compra um carro e coloca na minha porta, como se eu fosse obrigado a aceitar. Muito maduro. Muito racional.
Meu pai dava risadinhas. E minha mãe me escaneava de cima a baixo, provavelmente, espantada com o meu desempenho sexual digno de um presente desse valor. Isso se ela tivesse acreditado em alguma das asneiras ditas pelo meu irmão.
─ Carlos Eduardo, o que significa isso? – Ela me perguntou com sangue no olho.
─ Ainda não tenho certeza, mamãe. – Corei.
─ Como esse carro veio parar aqui?
─ Estou tentando descobrir... – Eu já sabia mais da metade do enredo, mas não queria envolver a minha mãe nessa novela. Olhei para papai implorando por auxílio.
─ Débora, minha querida, deixe o seu filho resolver os problemas dele. Kadu já é um rapazinho, não está vendo? – Ele abraçou minha mãe por trás com carinho e a levou para o escritório. Ela foi bastante contrariada.
─ Eu não criei filho para ficar ganhando carro de mulher. – Ainda a ouvi comentar pelo caminho.
─ Você prefere que ele ganhe carros de homens, meu amor?
─ Não me provoque, Vitório. Não me provoque.
Quando meus pais saíram, não tive alternativa a não ser assinar o recebimento da mercadoria para não atrapalhar mais nem o meu serviço, nem o daqueles funcionários, nem o trânsito do local que estava bem lento por causa da carreta de entrega.
Bruna, a centenas de quilômetros de distância, ainda conseguia me causar problemas. E agora? O que é que eu ia fazer com aquele carro?
E, para completar o dia, a bendita entrevista para a revista adolescente. Nunca senti tanta vergonha na minha vida. Além de responder a perguntas indiscretas como o que me atrai nas garotas e se a dança me ajuda na hora da conquista, o pessoal da produção ainda me fez tirar uma série de retratos com os figurinos do programa.
Acho que eles vão precisar de muito photoshop para tirar a vermelhidão do meu rosto. Eu não nasci para isso. E o pior ainda estava por vir. Minha mãe fez questão de ressaltar que sou herdeiro de tantas casas de shows da rede Atmosfera espalhadas pelo país e pelo exterior.
Sua intenção foi boa de divulgar a minha boate aproveitando dos meus quinze minutos de fama. Os olhos da repórter brilharam. Eu soube ali que o meu sossego iria acabar.
***
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Por Onde Andei
Ficção AdolescenteNo quarto volume da série Nando, pela primeira vez, temos a visão simultânea dos dois protagonistas: Bruna e Carlos Eduardo. Ela, atriz desde menina, não está acostumada a confiar nas pessoas. Resolve os seus problemas a sua maneira, nem sempre acer...