Ondori

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      Mamãe dizia que a viagem não foi tão cansativa quanto Papai afirmava entre um resmungue ou outro. O passeio era uma vontade antiga da Mamãe. Um lugar mágico chamado Liberdade. Um festival onde as pessoas penduram um montão de fitas coloridas pelas ruas ao som de tambores com nomes esquisitos, fazem pedidos e votos pendurando cartinhas em todos os lugares, dançam de maneira engraçada e oferecem comidas diferentes das que comemos em casa.

"Pense na experiência cultural que as crianças terão."

Papai ria, dizendo que a experiência seria da mamãe com seu peixe cru - e lembrava que era alérgico a camarão. "Peixe cru? Eca. O que estava acontecendo com a mamãe? Semana passada foi brócolis". Ao meu lado, um pequeno monstrinho de olhos esbugalhados e de grande apetite estendia os bracinhos rechonchudos, alcançando a fita vermelha que prendia meu cabelo.
- Mamãe! O monstri... O maninho puxou a minha fita outra vez – dei língua para ele.
- Deixe que brinque com a fita, Ana. Quando seu pai encontrar uma vaga para o carro arrumarei seu cabelo novamente. Até lá pare de implicar com seu irmão, por favor, querida.
- A imaginação fértil da minha princesa guerreira – Papai sorria enquanto fazia carinho na Mame e eu não poderia estar mais feliz. Na verdade poderia sim, se tivesse minha fita no cabelo exatamente como estava antes.

         Mamãe tinha razão quando disse que aquele lugar era mágico. Antes mesmo de chegar à rua era possível ouvir o ritmo dos tambores do taiko, ou coisa assim. Na carcunda de Papai pude ver um grande e enfeitado palco onde algumas pessoas dançavam, gritavam e tocavam com tanta animação que eu podia sentir o ritmo dentro do meu peito. "Tum-tum-tum". Estava tão feliz que muitas vezes me esquecia de onde estava e batia na cabeça de Papai como se fosse meu próprio tambor. Ao lado dele, Mamãe alimentava o Monstrinho e trazia o sorriso da mais linda princesa guerreira de todos os tempos. A Rainha do Papai, vulgo Mamãe.


       Descia a rua maravilhada com a mágica daquele novo lugar com tantas pessoas de olhinhos puxados, como minha amiguinha da escola. Papai pedia para eu parar de puxar meus olhinhos com os dedos. Dizia ser uma falta de respeito. Não entendi muito bem e por isso continuava a puxar meus olhinhos e sorrir a cada barraquinha. Mamãe já havia comido um doce de feijão – eca! – e se dirigia a uma daquelas barraquinhas vermelha e branca. Havia lindos passarinhos de papel espalhados na bancada. O-ri-ga-mi. Conhecia pica-pau, beija-flor, nunca ouvi falar desse passarinho origami.

- Não, minha linda – Mamãe explicava – Origami é a arte milenar das dobraduras de papel. Cisnes, sapos...

- Eu faço aviõezinhos e barquinhos – não sei o que disse de tão engraçado, mas a Mamãe e o vendedor riram de mim nesse momento. Descobri que além de princesa guerreira eu era uma artista milenar.

       Papai estava na barraquinha ao lado e tentava comprar o que dizia ser uma lanterna para a Mamãe. Achei que ele estava sendo enganado, aquilo também era feito de papel. Onde ele colocaria as pilhas? Por falar em papel, Mamãe havia comprado biscoitos da sorte, mas não me achei tão sortuda porque havia papel dentro do meu biscoitinho. Mamãe tentava explicar que havia uma mensagem naquele papel, não me interessei. Muito mais interessante era a lojinha do outro lado da rua. Haviam fitinhas como em todas as outras, mas tinha algo que me chamou mais atenção: bonecas! De acordo com a plaquinha: ON-DO-RI. Eram bonecas de pano com olhinhos costurados em uma expressão meio boboca. As meninas traziam cabelinhos de lã trançados, vestidinhos coloridos e um leve cheirinho de morango ou maçã verde. Os meninos com bonezinhos e macacões cheiravam a baunilha. Poderia trocar todas as lanternas ou passarinhos da festa por uma daquelas bonecas, quem sabe duas ou três. Como era difícil decidir qual a mais fofinha.

- Olá, linda criança – uma voz rouca soou e então se podia ver uma vovó baixinha, de olhos rasgadinhos e de sorriso largo no rosto – Procurando uma amiguinha?

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