Setembro

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Quando me vi no mundo era como se estivesse visitando o Éden: tudo era lindo, novo, eu estava ali mas não era parte de nada daquilo. Era uma estranha, estava de passagem.

Quis pertencer, ser aceita, adaptar-me àquele maravilhoso tédio do que é perfeito, mas como nada é perfeito, o tédio era aparente e ser aceita não me importava mais.

Passei a agir como eu quis, com as minhas regras, (in)conseqüências e desejos: eu era livre. Estrangeira e livre. Como em Pessoa:

"Lydia, ignoramos

Somos estrangeiros, onde quer que estejamos"

Nadine sabia que era domingo assim que abriu os olhos, mas não se moveu. Chorou lágrimas curtinhas em suspiros pequenos.

Sete anos voaram nas folhas de calendários com imagens que nem se lembrava mais...

Naquele dia entrou em casa e vira sua mãe sentada apática e seu irmão mais velho ao telefone, transtornado. Sabia que tinha sido seu pai, mas como?

Só algum tempo depois descobriu o que havia de errado naquela cena de setembro: o vizinho que segurava a mão de sua mãe se tornou seu padrasto em apenas seis meses.

Nadine sabia bem o que foi a sua vida sem o pai querido, seu amigo de todos os momentos, para inveja dos meninos.

Da cama, através da claridade das cortinas, Nadine adivinhava a vizinha saindo com os cachorros e ouvia, do andar de cima, as passadas lentas e pesadas daquele que acabara de acordar.

Em algum lugar uma janela foi fechada e Nadine se encolheu.

Aprendendo a voarWhere stories live. Discover now