Estava fazendo um frio inacreditável pelas ruas daquela pacata cidade, havia poucas pessoas perambulando pelas calçadas. Enfiei ambas as mãos no bolso do jaleco e torci para que a sorte estivesse ao meu favor. Procurei pelo lugar que sempre me encontrava com Tiberius e gritei duas vezes pelo seu nome, mas ninguém respondeu. No máximo, umas duas pessoas olharam para mim de longe como se eu fosse um maluco. Ignorei os olhares acusadores de cada uma delas e fiquei cabisbaixo, notando o quão estúpido eu estava soando naquela hora. Eu estava sozinho. Não tinha ninguém para me abraçar, ninguém para dizer que tudo ficaria bem. Nem sequer alguém para reclamar comigo. E honestamente, eu já estava sentindo falta da minha família "postiça".
Sentei-me no mesmo banco que eu teria me encontrado com o Garoto Smurf pela primeira vez e esperei pelo melhor. Quando achei que não tivesse mais esperanças, vejo um garoto de cabelos azuis vindo em minha direção. Era como a luz no fim do túnel, até imaginei que aquilo fosse uma miragem. Espera... era uma miragem? O frio já está invadindo meu cérebro o suficiente para distorcer meus próprios pensamentos?
- Hector? - o garoto sussurrou, precisando tomar uns passos a mais para confirmar. Balancei a cabeça afirmativamente e deixei que ele se pronunciasse. Era mesmo Tiberius! - O que está fazendo aqui?
- O que você acha?
Ele me olhou de cima a baixo, exatamente como na primeira vez que nos conhecemos, só que neste momento, Tiberius estava brincando. Ele abandonou a pilha de panfletos que ele carregava em uma mão - nem sei como ele ainda consegue andar por aí com essas coisas - e sentou ao meu lado.
- Acho que está bancando uma de nerd no meio da rua. - concluiu, observando meu jaleco meio sujo de lama - Você costuma fazer isso sempre?
- Só quando não estou de bom humor. - ele não disse nada por um tempo, nem eu. Tiberius, de repente, deu umas batidinhas em meu ombro e sussurrou um "eu sinto muito".
- Tenho que ir logo. - explicou-se apressadamente - Esses folhetos não vão se distribuir sozinhos. Te vejo amanhã, cara. Melhoras.
Uma força estranha dentro de mim falou mais alto. Eu não queria ficar ali, mas também não queria voltar pra casa. Sem contar que ainda tinha esse Black Hat. Já estava cansado de apenas ouvir falar dele ou de seus estranhos planos para seus subordinados. Eu queria conhecê-lo, acabar com todo esse mistério. Me aventurar como nunca eu havia me aventurado. Dessa vez, eu não queria que tudo fosse normal.
- Espere. - exclamei, obrigando o Garoto Smurf ficar estático. Levantei-me da cadeira e tentei ajeitar umas partes amassadas do meu vestuário. Tiberius me lançava olhares de dúvidas, não era de me admirar - Diga a esse Black Hat que ele não precisará imprimir mais folhetos. Eis aqui seu novo ajudante.
Houve um intervalo de tempo entre minha fala e as risadas desjeitosas de Tiberius. Aquela não era a reação pela qual estava esperando, portanto cruzei os braços e esperei que aquela sessão de "vergonha alheia" tivesse seu fim.
- O que foi? Eu sou um bom candidato!
- E o único. - afirmou, limpando as lágrimas que havia despejado de tanto rir - Ah, qual é, Flug! Você tem uma vida, cara.
Flug.
Ninguém nunca havia me chamado daquela maneira. Eu me senti mais forte, mais determinado e feliz por ter o sobrenome daquelas nobres pessoas, que cuidaram de mim até agora, apesar das tantas adversidades. Eu gostei disso.
- Leve-me até ele. - pedi, soando mais como uma ordem. Tiberius ainda me olhava com aquela expressão duvidosa, mas não me ignorou.
- Tudo bem. Mas depois não diga que eu não avisei. - sorri brevemente e segui o garoto.
Andamos por alguns minutos, e, no meio do caminho, Tiberius jogou o resto dos panfletos no lixo mais próximo que encontrou. Ele deveria estar se sentindo mais leve, agora. Menos cansado. Enquanto continuamos a caminhar, vi que algumas das poucas pessoas nas ruas me lançaram olhares conturbados. Era como se eu estivesse montado num elefante ou algo assim. Precisei de segundos para entender que o motivo disso era Tiberius. Talvez ele já fosse conhecido por aquela região.
Não.
Talvez seu chefe fosse. Isso fez com que, pela primeira vez, o nome "Black Hat" soasse como uma maldição.
- Eu falei que a cartola negra era sinônimo de punição, Flug. Pena que você não quis me ouvir. - Tiberius ronrona, fazendo menção ao chapéu negro que estava presente em todos os panfletos que ele havia distribuído. Engoli em seco e tentei manter a postura.
Não funcionou.
( . . . )
Finalmente parecia que tínhamos chegado. Incrível como o chapéu negro estava por todos os lugares. O próprio estabelecimento da Black Hat Corp. possuia o formato de uma cartola. Ela estava presente até no nome do chefe de Tiberius! - se é que esse era realmente o nome dele.
- Podemos entrar? - questiona ele, mais como uma sugestão. Faço que sim com a cabeça, apesar de todo o meu corpo ser envolvido por uma onda de choque avassaladora. Dentro da casa era ainda pior. Todos os móveis eram negros ou da cor vinho.
- Seu chefe tem um gosto excêntrico.
- Achei que os cartazes já revelassem isso. - comentou - Uhm... escuta. Vou ter que desativar o sistema de segurança, antes que entremos na cobertura da casa. Fique aqui e não mova nenhum músculo.
- Nenhum músculo. - repito, fingindo ser confiável. Quando Tiberius sai da minha vista, corro logo para a primeira porta que achei. Tudo era magnífico demais para ser desperdiçado!
A porta à minha frente possuía uns arabescos banhados a ouro. Havia duas letras cravadas na madeira dela: B.H. Eu sabia que estava pondo a mão no fogo, mas não liguei. Apenas entrei lá.
Era um escritório. Se a sala já era um breu, aquele lugar era como estar na plena escuridão, meus olhos já estavam irritados.
- Droga, onde tem um interruptor?
- Bem aqui. - alguém respondeu e as luzes acenderam, repentinamente. Tive uma sensação semelhante a ser empalado vivo, mas nem sabia por qual motivo. Quando ousei me virar para trás, me deparo com o vislumbre mais terrível que eu já havia encontrado.
Ele se comportava num terno preto, usava uma cartola como a dos panfletos e um monóculo mal colocado no olho esquerdo. Seu semblante exageradamente sisudo reprimiu todas e quaisquer palavras que eu gostaria de dizer naquele momento. Eu estava atônito demais para fazê-lo. Era como se ele sugasse toda a felicidade de mim.
Como se ele fosse o próprio pesadelo.
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INCÓGNITA ;; villainous
Fanfiction⠀˗ˏˋ⠀𝐈𝐍𝐂𝐎𝐆𝐍𝐈𝐓𝐀⠀ˎˊ˗ ⠀⠀⠀DR. FLUG ERA APENAS um adolescente quando conheceu o Mestre da Vilania. Ele tinha sonhos e uma família adotiva que o amava, apesar das tantas adversidades que enfrentava. Sua vida muda, porém, quando ele conhece um est...