O homem com um revólver

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Anderson suava frio. Não por medo ou nervosismo. "Estou suando de adrenalina!" pensava. Depois parou para pensar se adrenalina fazia suar. O sol quente de Palmas sempre foi pior do que o da maioria dos outros lugares do Brasil. Não importava a hora do dia, ele sempre suava.
"Eu vou embora é para os Esteites. Esta merda de país é um forno! Anderson se pegava muitas vezes xingando o clima, as pessoas, os pássaros, os motoristas e principalmente o cheiro dos cadáveres no mato dos fundos.
- Cara, minha esposa está chegando em casa agora. Não faz isso comigo não! - o homem chorava para o seu executor.
Anderson estava acostumado com o desespero e com apelos. Mas não dava a mínima. Seu negócio era poder colocar as balas no tambor do 38 sem escorregar por causa do suor. Isso sim ocupava sua mente! Por que diabos tudo é tão difícil na minha vida?
O homem clamava e chorava,mas era como se Anderson não estivesse ali no quarto. E não estava, na verdade. A cortina feita de lençol rasgado não estava. Nem o defunto que ainda estava vivo ali. Para Anderson, a única coisa que estava ali era o churrasco com William e Johnny. Ele estava atrasado com aquela execução, e isso iria atrapalhar seus planos para mais tarde. Por um momento parou para reparar que o homem chorava e implorava. Seu lábio superior se ergueu, mostrando os dentes sob um sorriso... Sob o sorriso.
- Uai, menininha, está chorando agora? - Anderson perguntou, cruzando as pernas. Sua banha oleosa brilhava sobre o short que usava. Não podia mais usar camisa. Aquele bairro estava pegando fogo.
Talvez porque o próprio inferno veio buscar essa encomenda. Concluiu. A irmã Dulce nunca esteve tão perto do inferno.
- É um privilégio, não é?- Anderson perguntou, mantendo o sorriso e empurrando com a ponta do polegar a bala para dentro. O homem arregalou mais os olhos, sem conseguir coordenar seu sistema motor. Ficou com medo tanto por não entender a pergunta do seu assassino quanto porque não estava nem aí. Só queria ir embora, vivo. Ainda que fosse sem alguns dedos, queria era respirar por uns bons anos.
- O próprio diabo veio te buscar aqui na irmã Dulce - Anderson explicou.- É um privilégio que poucos marginais podem ter. Você e os seus amigos são homens de sorte.
- Por favor, você não precisa m matar! Não fiz nada de propósito! Foi sem que....
- Não ofenda minha inteligência!- Anderson sorriu ao dizer a frase do Poderoso chefão, seu filme favorito. - Não ofenda a minha inteligência, seu bostinha! Hayana me disse que vocês mexeram com ela lá na praia! Ela veio a mim com os olhos cheios de lágrimas.
- Não!- o homem gritou apavorado.- Não fui eu que mexi com ela, foi o cabeça!- Ele indicava o corpo ensanguentado do homem careca, no canto do quarto. - O cabeça parou a moto ma frente dela e ficou fazendo gracinha. Ela tentou sair, mas ele foi atrás! Eu fiquei chamando o Cabeça e o Goiaba.....
- Você acha que " O Padrinho" é um nome ameaçador? - Anderson o interrompeu. - Ouvi dizer que o nome do Poderoso chefão em Portugal é " O Padrinho" por favor! Isso é nome para se dar para um filme como esse? - Anderson empurrou o tambor do revólver para dentro e puxou o cão com o polegar.- Cara, não é pessoal, são apenas negócios!
BAM
A cabeça do homem explodiu para trás e voltou sem vida para a frente, pendendo sobre o peito nu.
- É assim mesmo camarada, a vida é injusta!  Você precisa ser um guerreiro para vencê- la!- Anderson disse para o morto enquanto puxava do bolso o maço de cigarro Hollywood.- Isso aqui é uma merda né, Will? Essa cidade é complicada, e tudo é difícil né não? A vida é dura, mas nós precisamos ser mais, não acha?
Antes de acender o cigarro, o celular tocou. A luz acendeu com o nome William primo.
- E ai bode! Anderson gritou com ânimo.
- Fala, bode! Beleuza?
- Beleza. O Johnny chegou?
- Chegou faz horas. Ele está lá em casa já. Cadê você bode?
- Eu estou terminando de me arrumar....- Anderson apontou a 38 para o outro homem que estava amarrado no quarto ao lado. Sua boca estava tapada com fita adesiva e, quando percebeu que o executor estava ao telefone, começou a gemer. - Só um minuto primo.
Anderson caminhou como um leão em direção à zebra que está com as patas quebradas e não consegue correr.
- Se você fizer algum barulho, terá uma morte bem nojenta, entendeu?
O homem fechou os olhos para conter as lágrimas, mas parou de gemer. Anderson esperou dois segundos antes de voltar para o celular.
- Will, estou terminando de me arrumar e já estou indo.
- Poxa vida, Estranho, tu ainda está na irmã Dulce?
- Relaxa cara! Eu chego ai rapidinho.
- Beleza, mas tem como tu trazer pelo menos dois refrigerantes?
- Peraê. - Anderson tapou o fone com a mesma mão que segurava o revólver e perguntou para o homem amarrado.- você tem uns trocados ai?
O homem arregalou os olhos. O que esse doido quer?
- Caramba, maluco! Trocados! Money, verdinhas, contos! Dinheiro, Zé mané! Tem dinheiro ai?
Ele respondeu com vários acenos positivos.
- Tem mais de dez pilas?- Anderson perguntou , e o homem fez que sim novamente.
Anderson voltou ao celular.
- pode deixar mano. Eu levo duas cocas geladinhas!
- Beleza estranho.
Anderson guardou o celular no bolso e quando foi acender o cigarro, percebeu que já não estava na boca.  A porcaria desse cigarro caiu da minha boca de novo?
- por que eles não fazem uns cigarros que fiquem parados? Não é difícil inventar uma colinha que prende pelo menos o bagulho em um dos lábios né não?
Anderson rodou o tambor do revólver e começou a assobiar a trilha sonora de O poderoso chefão. Virou- se para ficar de frente para o outro homem. Quantos haviam sido nessa tarde? Cinco, seis, quatro? Anderson achava que já havia mandado quatro ao encontro do seu patrão. Eu sei que Vito não iria concordar com isso, mas alguém tem que dar continuidade aos Corleones, não, Mike?
  A presa viu o sorriso no rosto bonito de Anderson. Sua franja caía na frente dos olhos.... Aqueles olhos negros! Anderson brilhava com o suor. Estava sem camisa, e sua barriga volumosa parecia bem firme. A presa sabia que ia morrer, e a ultima coisa que pensou foi que morreria nas mãos de um bandidinho que usava havaianas.

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⏰ Última atualização: Jul 05, 2017 ⏰

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