- Eu tranquei o carro? – Stephen se perguntou ao entrar no consultório.
Ele não parava de olhar para os três pequenos quadros na parede. Os três se completavam, formando a imagem de uma tulipa de pétalas vermelhas, a preferida da psicóloga Andrea. Mas não era a imagem que chamava a atenção de Stephen. O do meio está um pouco para a esquerda, pensava, tentando controlar a vontade de se levantar e arrumar o pequeno quadro.
Compromissos médicos o deixavam nervoso e ansioso. Com isso, sentia uma vontade enorme de organizar tudo, desde os quadros tortos na parede branca até as revistas todas bagunçadas na mesinha de vidro no centro da Sala de Espera.
Stephen fez de tudo para se segurar. Roeu as unhas, passou as mãos nos cabelos, mexeu no celular. Nada adiantou. Quando se deu conta, já estava com meia bunda – como dizia a mãe – na poltrona, podendo assim alcançar toda a mesinha e suas revistas. Tentou separar por marca, mas o espaço era pequeno para acomodar mais de oito marcas diferentes de revistas. Tentou por ano, mas eram todas do mesmo. Tentou por assunto, mas não ia ficar nem um pouco equilibrado, tendo em conta que mais da metade era sobre carros. Por fim, dividiu em três colunas, cada uma com mais ou menos seis revistas, separadas por mês de lançamento.
Com um sorriso no rosto e um alívio no peito, pegou uma das revistas e folheou suas páginas sobre viagens.
Já estava na metade da vigésima página, quando a porta do consultório foi aberta e uma mulher de altura mediana e cabelos castanhos entrou. Stephen abaixou a revista e a observou andar até a recepcionista.
- Bom dia, senhorita Lara – disse a recepcionista.
- Bom dia, Carolina.
Enquanto Carolina olhava em seu computador os horários do dia, Lara olhou por cima do ombro para Stephen. Reconheceu o rapaz, que logo virou o rosto para os quadros tortos, de alguns dias atrás.
- Logo após o senhor Stephen - disse Carol, balançando a cabeça na direção das poltronas. – Pode se sentar e aguardar.
- Obrigada.
Das três poltronas pretas do consultório, duas estavam livres. Por alguma razão, aquele rapaz sempre se sentava na do meio. Lara ocupou a vaga à direita dele e percebeu a cara feia que fazia para os quadros.
- Não gosta de flores? – Perguntou.
- Oi? – Stephen a olhou com as sobrancelhas erguidas e a testa franzida. Percebeu como os olhos da mulher eram lindos.
Timidamente, Lara sorriu.
- Certa vez, li algo na internet que falava que quando uma pessoa encara alguém por muito tempo, ela quer beijar esse alguém. Ou matá-lo. – Riu. – Imagino que não tenha atração por flores.
Stephen sorriu. Lara, mentalmente, concluiu que aquele era o sorriso mais belo e sincero que já havia visto.
- Ah! Não! - Ele apontou para os quadros. – Não estão alinhados. Isso está me deixando mais nervoso ainda.
A mulher olhou, olhou e não viu nada fora do lugar.
- Tem certeza? Acho que estão perfeitos.
- Parecem mesmo, mas não estão.
A conversa fluiu. Stephen falou de seu Transtorno Obsessivo-compulsivo e de suas obsessões por limpeza, organização e verificação. Por duas vezes, se perguntou se havia trancado o carro e se havia fechado a janela do quarto. Lara apenas sorria e olhava para aquele sorriso e aquele olhar afetuoso que só ele possuía. Quando era perguntada sobre o motivo de estar ali, desconversava. Não queria ver mais ninguém se afastando após contar seu problema.
- Stephen, pode entrar. – A recepcionista interrompeu a conversa.
O sorriso de Lara diminuiu até desaparecer. Stephen, sem jeito, se despediu e entrou. Por cima do ombro, a mulher o viu entrar na sala e quando a porta se fechou, olhou para a mesa de centro. Observou todos as revistas bem-organizadas sobre o vidro e sorriu.
De pé, caminhou até os quadros e os observou. Arregalou os olhos, percebendo que realmente, o quadro do meio estava fora do alinhamento. Por meio centímetro.
Pensando em Stephen, foi até a mesa de Carolina e pediu uma folha e um papel.
- Entregue isso para o rapaz quando ele sair. – Foi até a poltrona e pegou sua bolsa marrom. – Ah, vou me atrasar dez minutos.
Quase uma hora depois, Stephen, sorrindo, saiu da sala da psicóloga e partia para a porta, quando Carol o chamou.
- A senhorita Lara mandou te entregar isso.
Stephen pegou o papel e sorriu.
- Obrigado, Carol. – Parou na porta. – Tchau.
Mais tarde, naquele mesmo dia, Carolina arrumava sua bolsa.
- Tenha uma boa noite – disse Andrea, a psicóloga, saindo do consultório.
- A senhora também! – Esperou ela sair e voltou a procurar em sua mesa. – Onde diabos se meteu aquela caneta?
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E aí, pessoal! Tudo bem? O que estão achando de Stephen e Lara?
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Eu Tranquei o Carro?
RomanceStephen estava inquieto. As revistas bagunçadas na mesa de vidro o incomodavam. Os quadros quase alinhados o incomodavam. Tudo na sala de espera da psicóloga o incomodava. Menos a mulher que havia acabado de entrar. Um romance leve sobre TOC, segred...