Capítulo 3 - O novo serviço de Inácio

272 26 0
                                    

Eu vinha cansado querendo me recolher, o meu corpo estava dolorido e tudo o que eu queria era me deitar mesmo que minha dormida não fosse lá grandes coisas. Nós dormíamos todos juntos, mas na outra fazenda era ainda pior. Esta agora, de Seu Gonçalo, eu ia dormir melhor futuramente, é que estavam construindo outro barracão para que fossemos melhor acomodados e eu soube que estavam precisando de mão de obra de escravo, mas acontece que eu estava nos canaviais. Eu queria fazer parte da nova construção da senzala, também não sabia ao certo se iria ser separado as mulheres que tinham crianças. Onde eu dormia, estávamos muito amontoados e eu queria um pouco de paz mesmo que essa paz fosse impossível para um escravo. O que eu queria era me deitar em minha palha e me aquecer com o fogo que era acendido a noite, ele dava uma esquentada das boas.

Mas de noite, em meio ao fedor que exalava eu não podia fazer nada, a não ser chorar em minha alma e para completar um negrinho teve uma dor de barriga a noite e ficou sem poder segurar e fez as necessidades dele ali em um cantinho do barracão, porém estava muito forte o odor. Que mau cheiro terrível! A latrina ficava do lado de fora e a noite nem pensar em sair, então tivemos que dormir com mais fedor do que de costume. Severo apareceu no outro dia usando uma gargalheira, e ele nem com toda a humilhação a que estava sendo exposto se deixou intimidar e estava mais magro do que o de costume. Eu tratei de tomar meu ralo café e partir para o trabalho, Seu Germano já estava aos gritos conosco, e quanto ao negrinho, ficou ali encolhido na palha, tinha dores no corpo e mal podia falar. 

Íamos em fila, um atrás do outro, mas ao fazer a contagem parece que os orixás tiveram piedade de mim ou o diabo me escolhera para ser beneficiado com o bem ou com o mal. Isto depois de corridos os vinte dias que tinha enfrentado sol a pique e já estava me acostumando em arrancar as canas para a moagem. Juro que já estava me acostumando! Até minha dor de fome eu acostumei que ela passava quando eu estava cortando a cana, mas foi aí que Seu Germano falou: - E , você negro! Fique onde está! Você e (apontou para Gabriel, um negro forte, de sorriso largo), precisamos que venha conosco! Eu acho que não ia me castigar nem o Gabriel, mas tudo podia acontecer, a gente nunca sabia o que ia acontecer e ficamos esperando ele, os outros foram com os outros ajudantes para a lida. 

Seu Germano cravou aqueles olhos de mau em mim e me disse: - Você é um negro que pode ser melhor aproveitado devido a sua boa conduta e a baronesa precisa de um negro forte que nem tu para cuidar dos jardins, da plantação aos arredores da fazenda e para os serviços de peso na casa, não era isso que fazia na outra fazenda? Eu balancei a cabeça positivamente, mas sem olhar muito para o seu rosto. Como falei, eu tinha medo e ele continuou me encarando quando falou: - De agora em diante, negro, você prestará serviços na casa grande da fazenda, será um trabalhador doméstico, mas não se atreva a mudar seus modos porque se não a sua regalia será o chicote, entendeu? - Sim senhor! Esta foi a minha resposta. E virou-se para Gabriel: - Quanto a você, irá para a construção da senzala nova que irá abrigar as mulheres e crianças, mas só enquanto durar o processo de construção, depois voltará para o seu antigo trabalho. Gabriel ficou feliz com tudo que estava por vir, ele sairia do canavial, achava que teria melhor descanso.

Porém eu sendo forte e alto, não entendi muito bem e fiquei um tanto ressabiado, embora fosse um escravo de casa na outra fazenda, mas como eu nada podia fazer e pensar muito estava doendo a minha cabeça. Eu me dei o prazer de me sentir um pouco aliviado e tratei de aquietar o meu coração, pois eu sabia lhe dar com os matos e flores como ninguém e aquele ali estava precisando. A terra estava fofa mas um pouco seca, as flores não vingavam direito e estavam morrendo uma a uma, eu tinha muito trabalho ali e tratei de começar. Vi meu companheiro de canavial se afastar de mim, sendo levado para longe onde estava sendo feito o barracão, ele ia com expressão de felicidade nos olhos. Ah, coitado! Sentia um tiquinho de liberdade...

Fui levado também para conhecer a Baronesa. Ela se chamava Acácia, era muito branca e pálida, sua pele era de uma palidez extrema, até parece que ela estava doente, mas era a cor dela mesma, ela era a verdadeira brancura e foi rude ao falar: - Muito bem, saiba que está aqui para trabalhar e colocar esse jardim para embelezar minha casa. Espero que saiba fazer o seu serviço. Você terá acesso a cidade também, se quiser e precisar de fontes para regar o meu jardim. Eu o quero bem bonito até a primavera, por tanto o trabalho o espera. Vamos ver como se sai. - Sim, sinhá. Eu estava de cabeça baixa ao falar com ela, seria minha patroa direta já que o Barão não se mete nos arredores da casa e para falar a verdade, minhas desconfianças foram dando lugar a calmaria em meu coração e foi com alegria que me dirigi do lado de fora da casa onde estava o jardim. - Vixe! Aquilo não era jardim, não! Era um amontoado de terras,  mas eu reconheci as plantas, acariciei elas. - Quem fez isso com ôces? Falei e me permitir ficar olhando-as até que iniciei a arar a terra, cavar e molhar. Arranquei todas as ervas ruim e os mato que lá estavam estragando a flor. Tinha flor, mas elas ia murchar logo e não iam vingar se não fossem bem cuidadas, tinha um bom trabalho pela frente e era isso que eu sabia fazer muito bem, e na minha condição de escravo, eu estava no céu e agradeci as orixás a permissão.

O Dedo de Deus (Obra não revisada)Onde histórias criam vida. Descubra agora