Encontros

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Quando era pequena, sua mãe sempre lhe contava histórias sobre o lugar onde construíra algumas de suas melhores lembranças da juventude. Além do mais, fora ali que seus pais se conheceram, carregando um significado particularmente especial. Ele, como um palestrante convidado para falar sobre como, tão jovem, conseguira construir e fazer prosperar uma das maiores empresas do país, e ela apenas uma estudante que se interessara demais pela história que aquele homem tinha para contar.

Jamais imaginou que, anos depois, seria seu sonho pisar no mesmo lugar em que sua mãe estivera um dia. Mas, dentre as muitas brincadeiras que o destino pregava, lá estava, parada em frente à Universidade Estadual de Magnólia, localizada na pequena cidade interiorana conhecida pelo amplo cultivo da flor de mesmo nome. Nascida e criada na capital, nunca havia pensado que um dia trocaria o cheiro de poluição e fumaça pelo aroma das flores. Muito embora o desejo estivesse presente em sua alma, achava que as possibilidades não permitiriam que aquilo se realizasse.  

Sempre protegida por ser a herdeira das Companhias Hertz, era a primeira vez em sua vida que estaria por conta própria, tendo que cuidar de si mesma. Admitia que aquilo a assustava um pouco. Contudo, a empolgação vencia qualquer medo que pudesse surgir. Seria bom pelo menos uma vez ter a chance de respirar, sem pessoas ditando cada um de seus passos.

— Senhorita — Virgínia, a mulher que a criara após a morte da mãe, chamou. Havia muitas lágrimas em seus olhos e podia notar o esforço que fazia para que não escorressem pelo rosto. Tinha pouco mais de cinquenta anos, cabelos grisalhos e uma personalidade completamente amável. Com certeza seria uma das coisas que mais sentiria falta de seu antigo lar —, tome cuidado, ouviu? E prometa que irá me ligar ao menos uma vez por semana.

— Não se preocupe, Virgínia. Eu juro que vou ficar bem. E não pense que vai se livrar de mim só porque vou morar em outra cidade agora. Prometo que vou te encher todos os dias.

A senhora sorriu, puxando-a para um apertado abraço, sem mais conseguir conter as lágrimas, que agora caíam incessantemente.

— Aquela casa irá parecer tão vazia sem a senhorita. Sabe como seu pai está sempre trabalhando. Acho que a única pessoa com quem vou poder conversar vai ser o Jun, mas mesmo ele anda tão ocupado ultimamente ― Júnior, ou Jun, como era mais conhecido, era o filho do jardineiro. O pai de Lucy nutria grande afeto pelo menino desde que o conhecera, quando tinha dez anos. Já ela apenas se tornara próxima dele quando já era mais velha. Ainda assim, era seu melhor amigo na capital. Tinha conseguido um bom emprego nas companhias Hertz e estava sendo treinado pelo próprio dono da empresa. ― Aliás, Senhor Júlio, não vai se despedir da sua menina?

Encostado no carro até o momento, mirando o chão como se houvesse algo extremamente interessante nele, estava Júlio Hertz, também conhecido como seu pai. Desde que descera do carro, não tivera coragem de olhar para a filha. É verdade que até pouco tempo seu relacionamento com ela era bastante tempestuoso, mas aquilo não queria dizer que não sentiria falta de Lucy.

Respirou fundo quando moveu seu olhar até ela. Nunca pensou que veria o pai, um homem forte, com postura rígida fortalecida pelo bigode que cultivava desde a juventude, com os olhos marejados. Sua pequena menina havia se tornado uma linda mulher e ele nem se dera conta de como o tempo passara.

― É claro ― disse, caminhando em direção à filha. ― Tome cuidado, Luciana. Suas coisas estão todas em seu novo apartamento, não precisa se preocupar com nada. Já está tudo acertado ― entregou-lhe então um papel e uma chave. ― Este é o endereço, chame um táxi para não se perder. Não quero que se meta em problemas já no seu primeiro dia. Não me faça viajar até aqui apenas por um erro seu.

A song of fireOnde histórias criam vida. Descubra agora