Quatro

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- Quer comer alguma coisa Isa? - Pergunta o Lucas quando chegamos em casa

- Não, obrigada - Subo para o meu quarto e me tranco nele

Caminho até a gaveta do meu criado mudo e tiro de dentro uma caixa de madeira antiga

Me sento na cama e abro a caixa. Pego dentro dela uma foto extremamente antiga, onde eu estou sorrindo no colo da minha mãe, eu tinha acabado de fazer um ano quando tiraram essa foto. Eu usava um vestido vermelho rendado e estava com um lacinho também vermelho na cabeça

Eu encontrei essa caixa um pouco antes de ser transferida pela primeira vez.

Eu tinha cinco anos, havia fugido do orfanato sem ninguém vê, caminhei pelas ruas sozinha, sem rumo e quando percebi estava parada enfrente ao prédio onde morávamos, eu não sabia que ainda me lembrava aonde morávamos. O prédio era antigo e não estava em bom estado, mas eu era feliz e era isso o que importava

Eu entrei no prédio e subi as escadas até o terceiro andar e entrei no apartamento duzentos e três

No mesmo instante subiu um cheiro ruim, comida ruim. Eu entrei no apartamento e pisei em algo pegajoso que na época eu não sabia o que era, hoje eu sei que era o sangue da Kate.

Eu entrei no apartamento olhei para a aquela enorme possa de sangue no chão e senti uma enorme vontade de chorar, mas não entendi o porquê. Eu andei pelo apartamento, estava procurando minha mãe, eu não sabia e não entendia o que estava acontecendo, a única coisa que eu queria era a minha mãe, mas ela não estava ali e nunca mais estaria

Eu me sentei na nossa cama de casal e vi encima de um criado mudo essa caixa, eu a abri e vi todas as coisas que minha mãe a guardava nela, naquela época eu não sabia ler, mas quando aprendi li todas as cartas que ela havia escrito

Depois daquele dia, eu nunca mais voltei aquele apartamento

- Eu sinto sua falta mãe - Digo com os olhos cheios de lágrimas - Eu queria você de volta, queria te-la novamente ao meu lado

Coloco a foto novamente dentro da caixa e pego outra. Nessa está a minha mãe ao lado de um homem. Meu pai.

Os dois sorriem nas fotos e carregam um olhar apaixonado. Olho para o verso da foto, onde há uma breve descrição:

O único amor da minha vida, eu te amo e sempre te amarei Marcos

Mais lágrimas brotam em meus olhos e algumas pingam na foto

Guardo a foto dentro da caixa, fecho a caixa e a guardo dentro da gaveta novamente

Fito o teto enquanto choro, choro como nunca me permiti chorar pela morte dela antes, choro pela falta que ela me faz, choro por ela simplesmente ter me abandonado, choro por saber que tudo isso também é culpa dela, choro por saber que tudo o que aconteceu é minha culpa e culpa dela

Olho para o lado e a vejo sentada ao meu lado me olhando. Seus olhos verdes voltaram a ser vivos e brilhantes, seu rosto perdeu a palidez, suas bochechas voltaram a serem rosadas. Ela volto a ser linda!

Ela está usando um vestido branco longo

- O que você está fazendo aqui? - Pergunto com a voz fraca

- Eu vim, porque você precisa de mim

- Não, eu não preciso, eu precisava de você a treze anos atrás, mas você me abandonou

- Não meu amor eu não te abandonei, eu apenas... - Ela abaixa a cabeça e deixa a frase no ar

- Você me abandonou, com quatro anos de idade! Você me deixou nesse mundo podre sozinha! Você presenciou as coisas que eu vivi e jamais fez nada!

- Eu tentei - Ela olha para mim com os olhos cheios de lágrimas - Eu sempre tentei te proteger

- Mas fracassou - Desvio o olhar dela e volto a fitar o teto - Você não poderia ter ficado? Por mim?

Olho para o lado e não a vejo mais

Suspiro fundo e me sento na cama. Estou ficando maluca, agora vejo e falo com mortos, era só o que faltava

Levanto da cama e caminho até a minha janela. Desço pelo telhado para ninguém me vê saindo

Caminho sentindo o ar frio da noite sobre o meu corpo. As horas que passo dentro do meu quarto passam que eu nem percebo

- ISA?! - Olho para trás e vejo o André vindo em minha direção encima de um skate

Contínuo a andar

- Oi Isa - Cumprimenta ele assim que me alcança

- Não te dei permissão para me chamar de Isa

- Não teria como você me dá algo que eu não pedi - Paro de andar e olho para ele

- O que você quer garoto?

- Sua companhia

- Não sou uma boa companhia - Volto a andar e ele continua me acompanhado encima do skate

- Mas eu ainda a quero

- André, por que você está no meu pé? É mais alguma pegadinha da Ariana? Se for, por favor, para eu não vou aguentar

Ele para e puxa meu braço me fazendo parar também

- Não é pegadinha, não estou tirando uma com a sua cara, eu quero ser o seu amigo

- Por quê? É isso que eu não entendo!

- Porque eu sinto que você é uma garota incrível, mal interpretada, mas uma garota incrível - Ele olha no fundo dos meus olhos - Eu sei que por trás dessa máscara de garota durona e mal-humorada, existe uma garota doce e feliz, mas que sofreu muito e ninguém se preocupa em entender isso, ninguém se preocupa em te entender

Sinto meus olhos arderem e desvio o olhar do dele

- Não te entendo garoto - Volto a andar

- O que você não entende? - Ele volta a me acompanhar encima do skate

- Esse seu interesse em mim

- Não é interesse, eu apenas quero ser seu amigo e isso eu já expliquei o que é

Paro de andar viro para ele e cruzo os braços

- Você sabe para onde está indo?

- Para qualquer lugar que você estiver me levando - Ele sorri e eu fecho a cara

- Sou sua guia só a partir de amanhã, hoje ainda sou livre, então, por favor, pare de me seguir

- E quem disse que estou te seguindo? Eu apenas estou andando pela rua

Olho para ele que está com um sorriso irônico nos lábios e dou meia volta para ir para casa e ele vem atrás de mim

Vamos o caminho inteiro calados

- Isabella? - Chama ele quando chegamos a porta da minha casa. Paro de andar, cruzo os braços e olho para ele - Vamos apenas tentar?

- O quê?

- Ser amigos, por favor, eu tenho certeza que você não gosta de ser solitária, mesmo dizendo a todo mundo que gosta - Abaixo a cabeça - Eu posso ser um bom amigo, só preciso que você deixe que eu seja

Ele vem até mim, segura meu queixo e ergue minha cabeça

- Estou pedindo sua amizade não para você casar comigo

Suspiro fundo

- Tudo bem André, seremos amigos

De Quem é a Culpa?Onde histórias criam vida. Descubra agora