Já era por volta das três da madrugada quando nós paramos numa loja de roupas e acessórios no geral. Audrey teve que passar na casa dela primeiro, o que acabou demorando uma eternidade, já que ela insistiu em tomar banho, e falar com os pais, o que demorou mais ainda já que eles deram a loca por ela sair este horário com "Vampiros sanguinários a solta". Enquanto a mim, eu só permaneci no carro, tecnicamente morta, deitada no banco ao lado do motorista, tipo literalmente deitada. Tinha até um travesseiro. Quando A finalmente chegou, depois do que me pareceu uma vida inteira de um vampiro, nos fomos para alguma loja aleatória no caminho até a Morada (que todos sabiam onde era). Felizmente, parecia haver roupas boas lá. E não só roupas.
- Fai, certeza que não quer descer? Eu sei o seu estilo, mas bem...pode ser que não goste do que eu pegar, além do mais, escolher é sempre bom
Ela soava preocupada, e eu entendia perfeitamente na verdade. Afinal, eu estava virando uma vampira! Mas sinceramente, qualquer coisa que me tirasse da minha vida atual serviria.
- Eu confio em você A, sei que vai fazer seu melhor. Mas pelo amor de deus, parece que estamos falando de algo terrível, não de uma escolha de roupas, não vai ser tão difícil.
- CLARO QUE É ALGO TERRÍVEL, imagina se você chega horrível lá? Vou me culpar eternamente se você for a novata vampira rejeitada, igual é na vida real.
- Tá, A, só vai logo - Dou um longo suspiro quando ela sai do carro, e volto a me deitar, com um braço na cara. Todas as minhas tentativas de fazerem a dor de cabeça passar haviam sido completamente falhas, então eu nem tentava mais. Tinha sorte de não ser de dia pelo menos, mas qualquer luz já deixava meus olhos um pouco fechados. Pois é, bem sensíveis.
Tateio o bolso esquerdo da minha calça, e pego meu celular. A primeira coisa que faço é abrir a câmera (infelizmente). Eu estava pálida, tipo, muito pálida! Ficava ainda mais estranho quando levava em direção que eu nem sequer era branquinha. E além disto, tinha a marca. Uma pequena lua crescente vermelha brilhava em minha testa. Eu achava que as marcas eram originalmente azuis, mas quem eu sou pra falar algo né? Passo sutilmente a mão por ela, o que me ocasiona um pequeno choque de dor. Mas parecia normal pelo menos, não algo estranho em alto relevo, estava mais pra uma tatuagem aquarela. Aumento o volume do celular, eu nunca deixava uma musica sem tocar, apenas no mudo. Truque para ter muitas execuções no Last. Pacify Her começa a tocar no ultimo volume, e fecho os olhos por um momento. E então A abre a porta do carro, com várias mochilas grandes, uma pequena com coisas de cabelo e afins talvez, e mais uma ou duas maletinhas. Ela dá um sorriso todo envergonhado e entra no carro, jogando as coisas no banco de trás.
- Você tá melhor? Sinceramente, não parece, mas sei lá né. Acho que falar muito não vai acabar ajudando também, mas tu sabe como é né? Eu só sei falar quando fica nervosa, e neste momento, eu to muita nervosa, então assim...
Interrompo ela com um aceno de mão. Além de estar aumentando minha dor de cabeça, eu não conseguia mais abrir os olhos. Digo, estavam muito pesados mesmo, parecia que havia uma bola de metal em cada um deles. Apesar da dor, eu não achava que seria impossível dormir, já que toda minha energia e concentração estavam indo para ficar acordada. Sinto que se eu chegasse a dormir, não ia ser legal. Pelo GPS, faltava aproximadamente 35 minutos para chegar a Morada.
- Audrey...- Eu só consegui sussurrar e apagar, no fundo, pude ver Audrey gritando meu nome, e o barulho das rodas do carro cantando.
Quando abri os olhos, pareciam que absolutamente nada havia mudado, e que eles continuavam fechados. A escuridão era completa e absoluta, e o silêncio ainda maior. Eu conseguia ouvir cada pulsação do meu coração como se fossem batidas numa porta, mesmo que não conseguisse enxergar nem um dedo a minha frente. Ficou assim por vários e longos minutos, ou horas, eu não sabia quanto tempo havia passado, até que algo começasse a acontecer. Primeiro, um som diferente do batimento (que era o único presente até agora), era como fogo, crepitante, um barulho de pequenos estalos vindo de muito longe, e pareciam chegar cada vez mais perto, porem lentamente. Então, como um raio caindo do céu, a luz se acendeu, me cegando momentaneamente. Quando consegui me acostumar e abrir os olhos de novo, e quando senti meus pés tocando o chão frio, eu tinha apenas uma certeza: Eu não estava mais viva.
Não sabia o porque disto, e nem como, mas não estava, eu conseguia sentir que estava livre, como nunca havia sentido antes, como se todo o peso sob meu corpo tivesse desaparecido e sobrasse apenas um pálido espírito, muito mais sensível a tudo. Parecia que eu realmente estava viva, apesar de achar que estava morta; deixe-me explicar: Eu conseguia sentir a energia vinda do solo, como se alimentasse meu corpo. Conseguia sentir a respiração frágil das plantas, como num dia de sol. Conseguia sentir a brisa que batia em meu rosto como um carinho do vento, alegre e cuidadoso.
Quando parei de me encantar com as coisas ao meu redor e parei para olhar, uma mulher me encarava. Jazia sentada na grama, envolta por uma fina camada de fogos, que a circundavam. Eu podia sentir o calor que emanava dela, e de seu sorriso. Ela parecia anormalmente pálida, mas mantinha aquele sorriso vencedor. Seu cabelo era como fogo também, vermelho e alaranjado, caindo ao seu redor como se fizessem parte do círculo ao seu redor. Ela parecia ter um ar ainda mais mortal, incógnito e antigo do que o vampiro que havia visto, como se realmente fosse poderosa o bastante para fazer qualquer coisa. Minha única reação foi ficar completamente hipnotizada por seu efeito, a olhando com cara de idiota.
- Eu esperei você por um bom tempo, Lasair, por mais tempo do que eu realmente achava que teria que esperar, onde esteve que demorou tantos anos?
Sua voz também soava poderosa, porem era tão calma, como se estivesse em completa harmonia com o lugar ao seu redor, e com fogo. Na verdade, quanto mais eu olhava, mais parecia que ela fazia parte do próprio fogo. Eu havia me perdido completamente em pensamentos, até que sua voz me alcançou de novo.
- Lasair, você sabe por que está aqui, não é? Ou será que se esqueceu de tudo? Eu preciso da sua ajuda mais do que nunca agora...
-Você...- Você? Senhora? Como me refiro a ela?- A senhora...me conhece de onde? Digo, parece que me conhece, mas...
- Então realmente não se lembra, minha querida Lasair. Eu não esperava que perdesse suas memórias...Eu sou Brighid, a deusa tríplice-chama, Poetisa, Médica e Ferreira. E você é a única que pode escutar minha doce voz.
-Deusa? Mas...o que aconteceu comigo? Eu só só humana, talvez vampira agora, mas...
- Lasair, aconteceu o que deveria acontecer com cada alma viva neste mundo. Você morreu.
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Enchanted
FanfictionO mundo mudou muito desde que os vampiros pararam de ser considerados algo estritamente ruim por muitos, mas sendo ainda mais odiados por alguns humanos. No meio disso tudo, apenas uma pessoa se encontra na capacidade de responder por ambos os lados...