Interlúdio 05

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Eu mal conseguia mastigar meu jantar. Por que Alisson estava ali? E tão deliciosamente bem vestido?

"Você está bonito." Sussurrei, percebendo tarde demais o motivo. "Esquece, eu sou um idiota. Claro que você está bem vestido, pensou que seria um encontro com a Kandi."

"Como assim, um encontro com a Kandi?" Alisson arqueou uma sobrancelha, e pareceu entender minha frustração. "Ah, não é nada disso. E pelo menos não tentei casar com ela!"

"Boa resposta." Falei, guardando a maldita rosa no meu colo. "Me desculpa. Não esperava que a Kandi armasse pra cima de nós."

"Eu sei. Eu mesmo pedi que ela fizesse isso."

Eu ergui meus olhos para ele, mas Alisson fingia concentração em cortar sua carne.

"Você... você quis estar aqui? Comigo?"

Alisson engasgou na própria comida, e ajudou a descer com largos goles de vinho.

"Eu... ahm.... n-não confunda tudo, me vesti assim porque esse é o lugar mais caro de Waikiki. E vou adivinhar que aquela louca pediu o prato mais caro, também."

"Desculpa. Eu pretendo pagar pra nós dois." Eu corei, ao mesmo tempo esquentando e tremendo, como se a brisa marítima se tornasse um sopro de gelo.

Alisson. Meu Alisson. Presença em todos os meus sonhos e pensamentos, desde a adolescência. Eu não podia alimentar ilusões, mas como faria isso naquele momento? Minhas férias se tornavam uma espiral de loucura cada vez maior.

"Michel, você merece alguém melhor que eu." Ele disse, rápido e brusco como um golpe de martelo.

Eu cutuquei as patinhas de caranguejo com o garfo, confuso sobre absolutamente tudo. Kandi me rejeitou, e agora Alisson estava ali, todo vermelho e hesitante, também me rejeitando mas não exatamente? Mas o que raios?

"Eu não posso consertar o que eu fiz, então abri caminho para que alguém decente aparecesse na sua vida. Eu queria que você fosse feliz, Michel." Disse ele.

Aquele monte de bobagem me surpreendeu tanto que eu paralizei, e deixei meu garfo cair no prato. Após circular a frase na minha cabeça vinte vezes, eu comecei a rir.

"Quis me fazer feliz fugindo de mim?" Eu o encarei, totalmente perplexo. Dessa vez Alisson foi homem o bastante para manter o olhar no meu. "Você não sabe o que me faz feliz, Alis. Não é você quem decide isso."

"Eu preciso te lembrar o que eu fiz com você?" Ele baixou o tom de voz, inclinando-se na mesa para que eu ouvisse. "Eu sou o último homem que você deveria querer, mas aqui estamos nós, quase trinta anos depois, e você ainda se hipnotiza com o meu corpo."

Meus olhos marejaram, e eu precisei desviar o rosto antes que uma lágrima descesse.

"Você diz que abriu caminho para outras pessoas e aqui está você, sabotando a única chance que eu já tive de ter uma família. Você mesmo ligou pra Kandi, não foi? O que disse a ela?"

Alisson logo abriu a boca pra responder, mas engasgou nas palavras. Ele secou a última taça de vinho.

"Eu disse que eu... eu.... Não importa. Eu senti que você faria algo estúpido, mas uma rosa de veludo com uma aliança? Isso é tão brega."

Meus lábios curvaram num sorriso de puro nervosismo. Eu já nem sabia o que sentia, mas o calor dentro de mim era como uma panela de pressão, e Alisson parecia aquecê-la de propósito.

"E daí se é brega? Talvez eu goste de brega. Talvez eu goste de receber rosas vermelhas, e beijos apaixonados na chuva, e assistir filmes bobos deitado de conchinha, até o sol nascer. Mas não tenho como ter certeza, não é?"

Ondas em Rebentação (AMOSTRA)Onde histórias criam vida. Descubra agora