Carlos Eduardo - Bem que eu estranhei

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Bem que eu estranhei a maneira tranquila com a qual Bruna "Problema" Drummond aceitou a minha resolução ao telefone ontem à noite. Hoje, nem bem dera sete da manhã, ela já me esperava no portão da escola com uma cara de poucos amigos. Veio me acompanhando com uma pisada dura até o estacionamento.

─ Nem ouse entrar na sala de aula. Nós precisamos conversar seriamente.

Não deu tempo nem de tirar minha mochila do carro. Ela foi logo me puxando para uma árvore de copa larga que ficava atrás do ginásio. Quase ninguém passava por ali.

─ Que história é essa de última dança, Carlos Eduardo? – Ela jogou a própria mochila no chão sem se importar com a sujeira e cruzou os braços. Bruna não era dada a meias palavras. Eu respirei fundo. Ela não estava para brincadeira.

─ Acho que é melhor a nossa parceria acabar. – Falei com convicção, mas algo lá dentro de mim dizia que aquilo era a maior estupidez que eu já fizera.

─ Por causa de um beijo? – Ela me olhava bem dentro dos olhos. Bruna tinha um poder de decisão impressionante. Ela tinha uma força de vontade impressionante. Eu lutava para não fraquejar. Eu não podia fraquejar. Ou então, eu não conseguiria mais resistir. E sabe-se lá o que poderia acontecer se eu deixasse de resistir àquela vontade tão poderosa. – Você tem ideia de quantos garotos eu já beijei na minha vida? De por quanto caras eu já me apaixonei? Eu sou assim, seu babaca. Se eu quero, eu faço. Não fico na vontade não. – Estava frio, mas ela nem ligava. Pelo contrário, suas bochechas estavam até avermelhadas, provavelmente de raiva. – Minha agente diz que eu me apaixono até pelo vento. Você acha que um beijinho à toa tira pedaço, garoto? Que eu vou mover céus e terra por causa disso? Que isso muda alguma coisa entre nós, seu idiota? Você não me quis. Ponto. Acabou. Não foi o primeiro, nem será o último. Não podemos simplesmente seguir em frente sem maiores prejuízos? Eu tenho namorado, caramba! Não vou esquentar por conta de um beijinho qualquer.

─ Bruna, não fica nem bem você falar assim de si mesma. – Não gosto de ver garotas em situações degradantes. Balancei a cabeça contrariado. Principalmente por causa de um programa idiota. – Você fica parecendo leviana...

─ Ah! Desculpe. – Dava para tocar a ironia dela no ar de tão palpável que era. – Eu me esqueci que você vem da terra dos meninos ricos e metidos, onde toda mulher é um símbolo de candura e pureza.

─ Bruna! – Eu me irritei. Ninguém tinha o direito de falar assim comigo.

─ Qual é, Kadu? – Ela voltou a me encarar. Eu tinha até medo daqueles olhos escuros e poderosos. – Você vai me deixar sozinha a essa altura do campeonato?

─ Eu vou falar com o Serginho, ele vai me substituir... – Abaixei minha cabeça, eu estava envergonhado. Não é certo abandonar o barco, mas eu precisava de espaço.

─ Eu não quero o Serginho. Eu quero você. Eu preciso de você. – Ela puxou meu casaco. Meu coração acelerou. – É em você que eu confio, Kadu.

─ Bruna...

─ Eu não vou permitir que você se afaste de mim. Você está entendendo, moleque?

─ Nós precisamos de espaço, Bruna. Estamos confundindo as coisas.

─ Eu não vou te dar espaço nenhum. Não quero espaço nenhum. Aliás, aqui não tem confusão nenhuma. Foi só um beijo, eu já disse. Acabou. – A escuridão dos olhos dela era insana. Eu morria de medo de me perder lá dentro. – A última coisa que eu sinto quando estamos juntos é confusão. Será que você não percebe que a nossa parceria é a maior certeza da minha vida inteira?

─ Não quero te fazer sofrer... – Fugia dos olhos inquisidores dela. Eu estava fazendo um esforço enorme para não ceder. Aquilo que ela dizia não tinha lógica, por isso me assustava, ao mesmo tempo, parecia tão certo. Mas eu não tive forças para encarar os olhos escuros de Bruna.

─ Você não conseguiria, moleque. Nem mesmo se tentasse. – Ela finalmente me soltou. Bruna me olhava com desprezo. Acho que percebeu minha covardia e desistiu de mim. Pegou sua mochila de volta e foi assistir à segunda aula.

***

Por Onde AndeiOnde histórias criam vida. Descubra agora