Capítulo 01

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"Lá vai o meu herói. Observe-o enquanto ele se vai."

(My Hero Foo Fighters)

— Annie! Annie!

Assim que ouvi a porta bater, Patrícia entrou no meu quarto, quando ergui a cabeça, tive tempo de retirar meus fones de ouvido e nada mais. Ela, provavelmente, tinha falado um monte de coisas que eu não ouvi, apenas respondi "tá bom" e voltei a colocar meus fones. Então ela se aproximou puxando os fones dos meus ouvidos.

— Annie, você precisa ouvir as pessoas, não é absolutamente nada educado fingir que ouviu ou responder alguém com um "tatata" como a senhorita faz muitas vezes — reclamou.

Normalmente a mulata, de lábios protuberantes e ancas largas, passava serenidade por onde caminhava, nada de risinhos e conversas em vão, estava sempre de prontidão ao seu serviço. Dona Patrícia era basicamente a governanta e também minha instrutora e tutora. Minha mãe nunca foi muito presente, sentia algumas vezes que ela me evitava, somado a isso, diziam que ela era doente. Dona P., por sua vez, era carinhosa e amorosa, com toda certeza, mas eu sabia disso porque via nos olhos dela, ela nunca tinha me contado uma palavra sequer sobre a nossa família ou o porquê de a minha mãe não dormir no quarto do papai há alguns anos. Eu nunca fui capaz de questioná-la, talvez porque não queria invadir a privacidade dela, ou por que realmente eu não queria saber, ou, no fundo, a verdade era que não me importava muito e tinha meus próprios problemas para resolver.

Era difícil ser uma garota de quase 16 anos que estudava em casa e vivia seguida e rodeada por guardas. Eram tantas regras que eu mal podia ativar a adolescente desorientada que havia em mim. Nada pessoal, mas ficava bem difícil fazer amigos assim. Óbvio que eu tinha alguns amigos, como Eric. Nós somos amigos desde que me conheço por gente, costumávamos escorregar pelos corrimãos do palácio, mas, de uns tempos para cá, Eric se tornou um pouco distante.

Dona Patrícia dizia que ele tinha outros afazeres, já que se tornara parte da Guarda do Palácio, mas eu discordava, sabia que tinha algo de muito errado nas coisas que às vezes pareciam ser acertadas.

Certamente meu pai daria o um cargo na guarda para o garoto, até porque ele praticamente foi criado junto comigo, sua família morava bem distante de nós e ele os via pouquíssimas vezes, mas era bem incomum ter um humano combatendo lado a lado com os soldados que, via de regra, eram elfos de orelhas pontudas, esguios e extremamente bem treinados.

Além do Eric, eu costumava conviver bastante com a Alice, quando nós nos conhecemos, a mãe dela a obrigou a ser minha amiga, não foi muito bom no começo, mas Krista persistiu tanto que, no fim das contas, não restou alternativa a não ser nos acostumarmos uma com a outra. Claro que eu preferia sair por aí e conhecer alguém por minha conta e risco, sem que parecesse que toda a minha vida estivesse sendo metodicamente coordenada por alguém que não fosse eu mesma e de um jeito muito peculiar, não que eu não tivesse outros amigos na infância, mas eles realmente não gostavam tanto de mim assim.

Há dois anos Alice saiu das dependências do palácio, ela era uma transmorfa, algumas vezes humana e outras um gatinho manso e dócil, costumava se gabar por poder mudar de forma, era engraçado às vezes. Quando ela se mudou para a escola na reserva, ainda estava aprendendo a controlar suas transformações, chegou a arranhar a canela de um dos soldados do papai. Quando me escreveu na primeira vez, contou que ficou de castigo por meses. Dona Patrícia disse que Alice devia voltar para o palácio naquele semestre, o que de certo seria bom, sentia falta das nossas festas do pijama e a ausência dela, quase sempre, tinha poderes mágicos de apertar meu coração.

— Annie! Está me ouvindo? — resmungou ela, novamente.

Ergui meu olhar para ela um tanto confusa.

A Maldição da Rainha • Série Demonangel (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora