Estávamos deitados no chão do quarto, onde o tapete é macio e confortável...
Não sei bem que horas são, mas sei que ja é bem tarde, passamos tanto tempo conversando, que o mundo continuou sem nós.
Estávamos deitados alguns centímetros afastados um do outro, mas eu sentia uma força invisível que me empurrava para mais perto dele. Meu coração bate freneticamente e minhas mãos estão suando, ficar tão perto dele é extremamente viciante.
- esse era meu quarto... - disse Ian de repente. - acho que já deduziu isso!
Virei-me de lado para poder olhar para ele, mas ele pareceu ter a mesma ideia, o que deixou nossos rostos muito próximos... Eu sentia sua respiração pesada, podia ver perfeitamente seus olhos azuis brilhantes mesmo no escuro...
Nos encaramos com muita intensidade. Ele é lindo de mais, até no escuro...
- os melhores dias da minha vida se passaram aqui, nesse quarto...- disse ele quebrando o silêncio.
- é lindo... Eles te amam muito Ian, sabe disso. Não sabe?
Ele suspirou e fitou o teto.
- quando eu vinha para cá, meu avô me levava para pescar no Rio... Passávamos o dia inteiro lá e voltávamos de mãos vazias... Depois minha avó me colocava na cama e lia pra eu dormir. Quando eu acordava, a primeira coisa que via pela manhã eram os sorrisos deles. Eles dormiam junto comigo por causa dos pesadelos... A presença deles me acalmava.
- que bonito Ian... -falei sorrindo no escuro. - eu nunca conheci meus avós. Por parte de mãe não temos contato. Depois que minha mãe fugiu de casa para ficar com meu pai, meus avós nunca a perdoaram. E por parte de pai já faleceram...
- sinto muito! -disse ele.
Fiquei em silêncio.
- eu amo esse lugar. Amo aqueles velhos ranzinzas. - disse Ian. - os amo mais do que ao meu próprio pai.
Senti sua voz estremecer, ele fala do pai com tanta amargura e desprezo...
- algum dia vai me contar sobre isso?-perguntei.
- provavelmente não! -disse ele.
Estava escuro e eu não podia ver muito bem, mas tenho certeza que a testa dele está franzida, naquela cara de pensativo.
- me fale sobre o mapa!-pedi mudando de assunto.
- não é nada importante.
- se não fosse importante, não estaria ali. E por que a França está marcada? Algo especial?
-você faz muitas perguntas! -constatou ele irritado.
- já me disseram isso antes... Vai me responder?
- não é tão importante. Não mais. - disse ele.
- um sonho de criança? -perguntei curiosa.
- talvez... Quando era criança, eu sonhava em conhecer a França. Mas agora eu já conheci. Fui lá tantas vezes, que sou capaz de caminhar pelas ruas de olhos fechados...
- eu gostaria de conhecer a França... - falei pensativa.
- é lindo... Principalmente no inverno. Mas nunca me empenhei em conhecer de verdade... Minhas viagens sempre são muito rápidas e objetivas...
- talvez esse seja o motivo... você nunca foi a passeio, sempre a trabalho... Isso é deprimente! - refleti.
- talvez seja isso mesmo!
Alguns minutos se passaram, e no silêncio eu percebi o quanto estava cansada, meus olhos estavam pesados.
- e aquele quadro? -perguntei lutando contra o sono.
- que quadro? -perguntou ele confuso, como se tivesse saído de um transe.
- o quadro da casa na árvore...
- ah, esse quadro...
- sim, esse quadro! -falei curiosa.- é do mesmo pintor do cavalo selvagem, não é? Assim como os outros espalhados pela mansão Seymour...
- sinto muito senhorita, mas está enganada. Esse quadro aqui foi pintado por ninguém menos que Wladimir Fragoso.
- seu avô? -perguntei incrédula.
- o próprio!
-ele não tem muito jeito de artista! -falei sem pensar.
Ian riu.
- ele tinha tempo disponível e dinheiro... resolveu arriscar!
- os quadros da sua casa também foram pintados por ele?-perguntei.
- não, aqueles quadros foram pintados por um idiota qualquer que não entende nada de arte. Minha mãe insiste em deixar aquelas porcarias lá!
- eu gosto dos quadros! -falei magoada.
- isso é porque você não entende nada de arte! -disse ele debochando.
- tudo bem... talvez tenha razão!
-o que? Você está bem?-perguntou ele preocupado.
- sim, por que não estaria? -perguntei confusa.
- sei lá... você concordou comigo!
-apenas não estou com vontade de discutir no momento... Mas é aquele ditado, "Gosto não se discute! ".
-Acho que tem razão...
Ficamos em silêncio novamente, até Ian falar:
-me conte algo sobre sua família...
- eu não tenho nada pra falar deles...- respondi confusa.
- impossível, todos têm alguma coisa pra contar sobre sua família! -disse ele.
- você quer alguma coisa boa ou ruim? -perguntei franzindo a testa.
- algo bom para variar um pouco! -disse ele rindo.
- bom... teve uma vez que... - parei.
Silêncio.
- o quê? -perguntou ele curioso.
- eu... eu não tenho nada de bom pra contar... Não me lembro de nada em especial. Só lembro de ordens e de muitas pessoas me dizendo o que fazer e como fazer!
Ian não falou nada por um tempo, eu até pensei que estava dormindo, mas ele resolveu falar novamente.
- não tem nada que te traga boas lembranças de lá?
-talvez... Blair! -falei sorrindo.
- Blair? Quem é Blair? -perguntou ele surpreso.
- ela é minha melhor amiga! Éramos vizinhas... Ela é a melhor pessoa que já conheci. Ela é muito bonita, mas também muito sincera e decidida, o que incomoda muitas pessoas e a coloca constantemente em apuros, me fazendo ter que salvar sua pele sempre... Ela é uma boa amiga, mas também muito desastrada, ela nunca consegue controlar sua sombrinha, além de sempre tropeçar em algum móvel enorme em que ela insite em dizer que apareceu do nada... Ela é uma figura! Me fez fugir de casa mais vezes do que posso me lembrar, sempre fugiamos para ir a bailes. Fiquei bêbada pela primeira vez com ela. Foi terrível.
- ela parece uma pessoa maravilhosa! -disse Ian. - Apesar de ser uma má influência.
- com certeza ela é uma má influência. Mas tem o coração enorme. Pensa sempre em como deixar os outros felizes...
- sente saudades? -perguntou ele.
- muita... Não pude nem me despedir dela... Ela provavelmente já está noiva!
Ian ficou em silêncio, e dessa vez foi eu quem falou:
-quando partimos?
-amanhã. - respondeu ele.
Suspirei.
- está com medo?-perguntou ele.
- não é medo... É só que... nem sei exatamente como explicar...
- acho que sei como se sente...
Ficamos em silêncio.
O silêncio foi tão grande, que o ruído do vento lá fora era o único som audível além de nossas respirações.
Meus olhos estavam pesados, e eu finalmente fui vencida pelo sono.
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Casamento Arranjado [Completo]
Historical FictionEla sempre sonhou em casar por amor, mas ao descobrir que foi prometida em casamento para unificar os negócios das famílias mais poderosas de Londres, fez seus sonhos ruirem e se tornarem seu pior pesadelo, fazendo com que ela acredite que o amor é...