Aquela pergunta entrou pelos meus ouvidos e ficou ecoando no meu cérebro Sem parar.
- Eu te fiz uma pergunta, Caio – ele falou depois de um tempo.
- Da onde você tirou uma idiotice dessas?
- O seu amigo Leonardo que tá espalhando isso pro Call Center inteiro.
Minhas mãos começaram a tremer. Eu fechei os dois punhos e me segurei para não começar a gritar de ódio do Leonardo.
- E você acredita nisso?
- Não sei. É por isso que eu estou te perguntando...
- É mentira. É claro que é mentira. Ele quer foder com a minha vida, aquele desgraçado!
- Por que ele quer fazer isso com você?
- Nós brigamos. Não quero falar sobre esse assunto, Rodrigo.
- É por isso que você está assim desde ontem?
- É e não é. Não quero falar mais nisso.
- Tem certeza que você não está escondendo nada de mim, Caio?
O tom de voz dele era de desaprovação. Como eu ia sair daquela situação, meu Deus?
- Absoluta, Rodrigo. A gente pode mudar de assunto, por favor?
- Por que você está tão nervoso desse jeito? Desabafa comigo, Caio. Eu sou seu amigo, cara...
- Mais do que um amigo, você virou quase um irmão...
- Então? Fala o que está acontecendo, quem sabe eu posso te ajudar?
- Não quero falar sobre isso, Rodrigo. Me entende?
Ele suspirou e cruzou os braços.
- Está bem. Não vou mais insistir nesse assunto.
- Fico muito agradecido.
- Vem, vamos entrar no metrô. Por sua causa eu não fui pra academia.
A academia... Eu havia me esquecido completamente que tínhamos marcado o nosso treino para aquele dia...
- Pô, esqueci completamente. Desculpa.
- Tudo bem. A gente vai amanhã.
- Com certeza.
Tinha algo dentro de mim que estava explodindo. Eu estava com vontade de quebrar os dentes do Leonardo...
Aquele cafajeste queria mesmo acabar com a minha vida, mas eu não ia deixar aquilo acontecer.
- Que foi? – Rodrigou perguntou. – Por que essa cara agora?
- Fiquei com raiva.
- De mim?
- Claro que não, palhaço. Do idiota do Leonardo.
- Eu disse para você abrir o olho, não disse?
- Pois é. Dei mancada...
- Mas por que ele diria isso ao seu respeito?
- E eu vou saber? – menti descaradamente.
- Você não está mentindo não, está?
- Po-por que você acha isso?
- Não sei. Tem algo muito estranho nessa parada...
Engoli toda a saliva da minha boca.
- Vamos mudar de assunto?
- Sempre querendo mudar de assunto... Aí tem coisa, mas eu vou descobrir o que é...
- Não tem nada – eu não estava conseguindo mentir muito bem. – Eu te garanto.
- Aham...
Ele ficou me olhando. No que será que meu amigo estava pensando?
Quando a nossa estação chegou, ele foi até a porta, mas eu fiquei parado aonde estava. Decidi repentinamente ir até a casa do Leonardo. Eu precisava tirar aquela história a limpo.
- Não vai descer?
- Resolvi que vou até a casa do Leonardo. Preciso tirar essa história a limpo.
- Ah, não vai não!!! – ele me puxou pelo braço e me fez descer na plataforma. – Com a cabeça quente do jeito que você está? Mas não vai mesmo!!!
- Cacete, Rodrigo... Eu preciso tirar isso a limpo!
- Amanhã você faz isso. Hoje não.
Quem ele estava pensando que era? Meu pai para mandar em mim? Fiquei ainda mais furioso depois que o Rodrigo me impediu de ir até a casa do traidor do meu ex-melhor amigo.
- Você é muito chato, sabia?
- Eu sei, já me falaram isso antes – ele sorriu.
Não achei a menor graça e contra a minha vontade, voltei para casa.
Se na noite anterior eu havia dormido muito pouco, naquela eu não dormi absolutamente nada.
Parecia que a minha cama estava coberta de espinhos, eu fiquei mexendo pra um lado e pro outro sem parar. Foi uma das piores noites da minha vida.
Como se já não bastasse a insônia, quando levantei a minha cabeça começou a doer. Será que tinha remédio naquela república?
- O que você está procurando, Caio? – o Rodrigo acordou mais cedo que o normal.
- Remédio pra dor de cabeça.
- Acho que não tem.
- Que droga...
- Você tá com a aparência péssima, filhote... O que houve?
- Não dormi essa noite.
- Ah, isso eu já sabia. Você mexeu mais que não sei o que a noite toda.
- Atrapalhei seu sono?
- Não. Eu também estava com insônia.
Nâo sei se ele estava falando a verdade.
- Tanto é que acordei mais cedo que o normal. Quer dizer, levantei, né?
Ele estava apenas de cueca. Meu amigo coçou a nuca com uma das mãos, o olho com a outra e bocejou tudo ao mesmo tempo. Ele era bonitinho...
- Que é? O que tá olhando? – ele indagou.
- Hã? Nada. Nem tô enxergando com essa dor infernal.
- Você tem enxaqueca?
- Acho que devo ter.
- Fala sério. Deve ser por causa do sono atrasado...
Continuei procurando um analgésico, mas realmente não achei em lugar nenhum.
- Será que o Vini não tem?
- Sei lá... – dei de ombros.
- Ele faz medicina, vai saber... Vai lá pedir...
- Não quero acordá-lo.
- Prefere ficar com essa dor?
Era tentador, mas eu não queria mesmo atrapalhar o sono dos meninos. Resolvi que ia entrar em uma farmácia e comprar uma caixinha da comprimidos antes de ir para a escola.
Lavei meu rosto umas cinco vezes para ver se melhorava, mas não adiantou muita coisa. Escovei meus dentes e percebi que estava na hora de trocar minha escova de dentes. A coitada estava precisando se aposentar.
Troquei de roupa, peguei a minha mochila, meu celular e saí. A claridade só aumentou a minha dor de cabeça e aquilo me deixou irritadiço.
Lembrei do desgraçado do Leonardo. Eu tinha que dar um jeito de desmentí-lo. Ou melhor, eu tinha que dar um jeito de fingir que o que ele estava falando era mentira. Mas como?
Por sorte, a farmácia estava completamente vazia. Eu agradeci em pensamento por ela estar aberta. Acho que só no Rio de Janeiro os comércios abrem às 7 horas da manhã.
Engoli o remédio à seco e fiquei boa parte da manhã com a impressão da pílula estar presa na minha garganta. Sem contar o gosto amargo que ficou na minha boca. Um porre!!!
- Você está péssimo, hein? – Rogério falou.
- Obrigado – falei, com cara de poucos amigos.
- E essas olheiras?
- É porque sou um vampiro. Toma cuidado que eu posso chupar seu sangue qualquer hora dessas.
- Só se for chupar outra coisa...
Talvez pelo fato do meu raciocínio estar mais lento, eu nem me dei conta do que ele quis dizer com aquele comentário. Só fui entender o que ele quis dizer, quando eu cheguei na empresa.
- Que idiota!!!
- Quem é idiota? – Rodrigo perguntou.
- Um colega da escola. Ele fez um comentário desnecessário mais cedo, mas eu só entendi agora.
Não sei por quanto tempo ele ficou dando risada da minha cara. Até eu ri depois de uns minutos.
- Você precisa dormir, filhote – ele deu um tapinha no meu ombro.
- Acho que hoje eu consigo. Meus olhos estão fechando sozinhos.
- Imagino.
Foi um martírio encontrar com o Bruno na hora da troca de turno. Ele me olhou com os olhos tristes e a fisionomia de derrota e quando ele abriu a boca para falar alguma coisa, eu deixei ele para trás.
Todo mundo estava olhando pra mim, mas eu não dei a menor atenção. Eu tinha que ser superior ao que ele tinha falado ao meu respeito, mas confesso que foi complicado.
- É verdade o que andam dizendo? – Mônica perguntou.
- Não – respondi na hora. – É mentira.
- Ah, que susto.
- Não estou preocupado com isso não. Falem bem ou falem mal, mas falem de mim.
E aos poucos foi com essa sensação mesmo que eu fiquei. Do meio do expediente pra frente, eu liguei o botão "FODA-SE" e segui a minha vida. Eu não tinha que dar satisfação da minha vida pra ninguém.
No final do expediente, eu coloquei uma pausa para ir ao banheiro e dei de cara com ele no corredor.
Eu senti um impito muito forte de quebrar a cara dele com um soco, mas me segurei. Gente baixa a gente tem que tratar com indiferença, portanto eu apenas lancei um olhar superior e passei para o sanitário masculino.
- Desgraçado – resmunguei quando entrei na cabine.
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Bruno
RomancePosso dizer, sem medo de errar, que minha vida começou a mudar no momento exato em que fui expulso de casa por meu pai homofóbico e preconceituoso. Com apenas dezesseis anos de idade e mergulhado em um mar de imaturidade, me vi sozinho no mundo e...