No meu décimo sétimo verão, minha família e eu viajamos para a casa de meus tios, na cidade grande, para passarmos alguns dias. Minhas irmãs estavam empolgadas com essa viagem, fazendo planos de onde iriam todos os dias, mas eu não podia estar menos desanimado. Eu queria ter sido deixado em casa com meu computador e meus livros.
Meus tios vivem em uma casa enorme em uma região nobre, então não haveria nenhum problema com espaço. Eu e minhas irmãs ficamos juntos em um quarto grande, que era utilizado como livraria, onde havia espaço suficiente para colocarmos todos nossos sacos de dormir no chão. Tentei pegar um lugar ao canto, perto da janela, para poder ver as estrelas à noite e escapar um pouco da conversa das três durante a madrugada.
No dia seguinte à nossa chegada, minhas irmãs decidem caminhar até um shopping ali por perto. Decido ir junto no momento em que meus tios anunciam que convidaram outros parentes para ver meus pais; eu não estava nem um pouco a fim de ver mais gente que sequer liga para minha existência. Sem falar que eles todos me tratam como criança, e isso me irrita. Sei que sou o mais novo, mas já tenho dezessete anos.
Deixo que minhas irmãs andem na minha frente e as sigo escutando música em meu celular. O shopping era muito mais chique do que eu esperava e eu acabo logo me sentindo deslocado com aquele ambiente. Pelo menos minhas irmãs estavam arrumadas; eu estava vestindo apenas uma calça jeans e uma camiseta velha. O desconforto é tanto que acabo decidindo ir até a praça de alimentação para esperá-las sentado e o mais invisível possível.
Por sorte sempre trago um livro comigo, então me deixo levar desse mundo enquanto ainda escuto música. Eu estava gostando muito dessa história, me identificando em diversos aspectos com os dilemas existenciais do personagem principal.
Minha leitura é repentinamente interrompida por uma mão que pousa em meu ombro. Eu dou um pulo em susto e tiro os fones de ouvido para encarar a pessoa que se aproximou sem que eu percebesse. Era um garoto, de cerca de minha idade, que me encarava com preocupação.
- Sim? - Eu pergunto, hesitante.
- Você está bem? - Ele responde com a sua própria pergunta, ainda me encarando da mesma forma.
Só então eu me dou conta que meus olhos estão cheios de lágrimas, e uma provavelmente acabou de escorrer por meu rosto. Que humilhante, chorar assim em público. Ainda mais com um livro.
- Ah, não é nada... - Eu seco os olhos e inspiro fundo. - Acho que me envolvi demais com essa história.
- Sei como é. - O garoto dá uma risadinha, tentando aliviar a tensão. - Eu te vi de trás do balcão e fiquei preocupado.
- Eu tô bem, não esquenta.
Ele ri de novo, meio sem jeito.
- Bom, já que eu tô aqui... quer um cardápio?
Olho para seu uniforme e vejo o logo do fast-food mais próximo de minha mesa.
- Agora não. - Eu balanço a cabeça negativamente. - Vou esperar minhas irmãs pra comer.
- Ah tá. Vê se come ali, ok?
Ele volta para o fast-food e passa pelo balcão para ficar atrás dos caixas. Eu só me dou conta que estava o observando quando seus olhos se encontram com os meus e eu tenho que me virar rapidamente para disfarçar. Sei que ele notou e riu, mas tudo bem. Só preciso nunca mais voltar aqui.
~*~
Eu amo ficar sozinho, e essas viagens com minha família destroem todo meu espaço. Às vezes eu preciso sair para tomar um ar, já que se torna quase sufocante em alguns momentos.
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ALTER
Short StoryApós conhecer Derik, durante suas férias na cidade grande, Adam começa a receber uma visita bastante peculiar: seu alter ego.