Estamos no ano da graça de Deus de 1320, pleno século XIV, dia 8 de abril, um dia não muito belo: está nublado, de vez em quando uns chuviscos tendem em marcar presença, e o frio é de penetrar até aos ossos. Tudo isto pode prejudicar o mendigo ou o lavrador, mas nós estamos no Paço Real da Alcáçova, em Coimbra, neste que é um dia tão especial: D. Beatriz está prestes a trazer ao Mundo mais um príncipe ou princesa. Aquele que um dia se poderá tornar rei... se não for menina.
O infante D. Afonso espera de forma nervosa do lado de fora dos aposentos da esposa, pelo seu fruto. Já era mais do que hora de dar um varão à luz. O chão de pedra tornava-se mais gasto com os seus passos, do que com todo o desgaste do tempo. Um dos guardas do palácio, ocupado com a tarefa de proteger o longo e frio corredor de pedra, decorado apenas com algumas tapeçarias, observa o príncipe de forma ansiosa, tal como todo o reino.
- É casado? Tem filhos?- Perguntou D. Afonso ao silencioso guarda.
Não era seu costume tomar conversa com qualquer um, contudo precisava de se distrair ou tinha um esgotamento ali mesmo. Os gritos das contrações da esposa estavam a infernizar-lhe a cabeça; embora cavaleiro e assassino de vários, estava habituado a ouvir gritos e angustias finais do inimigo no seu leito de morte; tal sofrimento vindo de uma dama, era inquietante de se ouvir, especialmente da mulher que está prestes a trazer o seu filho ao Mundo.
- Não tenho filhos, alteza, mas sou casado.- O guarda respondeu, mantendo a sua melhor postura.
- Pois então boa sorte.- O infante respondeu-lhe com as mãos cruzadas atrás das costas, andando de um lado para o outro do corredor.- É dos infernos! Nunca mais se despacham, ninguém diz nada!
Ao que o pobre soldado respondeu de ânimo leve:
- Não é a primeira vez que passa por isto, alteza. Vai tudo correr bem, Deus abençoá-lo-á com um filho saudável.
- Esperemos.- O rei atirou para o homem de espada à cintura e lança na mão, apoiada no chão.- Não rezei pouco!
Alguns momentos depois os gritos cessaram, e ao meio do silêncio, o choro de um bebé foi ouvido. O sinal que D. Afonso esperava para se aproximar de novo dos aposentos de D. Beatriz.
Uma das aias abriu a porta timidamente e o infante entrou sem hesitações, encontrando a esposa deitada, apoiada em almofadas, extremamente cansada e envolta em suores do esforço tão conhecido pelas mães.
- É um rapaz?- Questionou D. Afonso impaciente e expectante.
- Parabéns alteza, é um menino saudável.- A senhora sorria radiante com a dádiva nos braços, enquanto a passava ao príncipe, que sorria de forma terna para o filho tão pequeno e frágil.
- Chamar-te-ás Pedro.- O infante declarou observando a criança, que tinha ainda o pequeno rosto húmido das lágrimas e se ocupava em apenas dormitar um pouco diante do homem imenso que o segurava.
- Alteza, a princesa precisa de descansar agora.- A parteira informou ao meio do rebuliço de toalhas, alguidares de água quente, lençóis e parteiras.
- Sim, claro.- Afonso acordou do seu transe e entregou o filho nos braços da esposa cansada, mas orgulhosa, por ter gerado criatura tão bela. A esposa, que lhe apertou a mão de sorriso no rosto, porém em silêncio, orgulhosa. Portugal tinha enfim um varão, e Pedro, como o favorito de Jesus Cristo, veio para ficar.
Afonso beijou a testa da esposa e seguiu para o salão principal, onde orgulhoso de si, comunicou a todos o nascimento de um varão. D. Dinis parecia já saber da boa-nova, porém mostrou-se satisfeito ao pedir um brinde em honra do novo neto, o novo herdeiro do trono de Portugal. A rainha sua mãe, orgulhosa e alegre por receber mais um neto, beijou-lhe as duas faces.
A energia e felicidade dos fidalgos e clérigos foi enorme, houve salvas ao infante e ao recém-nascido. Depressa a noticia se espalhou pelo povo, onde por toda a Coimbra e Portugal se fizeram missas, realizaram cortejos e romarias em honra do pequeno Pedro. Todo o reino caiu numa profunda felicidade com o tão esperado nascimento, por isso, o rei declarou 3 dias de festejos em honra do neto.
O nascimento do pequeno príncipe, fez os dias bem mais bonitos para todos, e enquanto festejavam, a rainha e o pequeno bebé descansavam em paz, no leito reguardado.
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Ora, pela mesma altura, entre 1320 e 1325, ocorreu outro importante nascimento para esta história: O nascimento de Inês. Não se sabe ao certo, o dia, o mês ou até o ano. Sabe-se apenas que era filha ilegítima do mordomo-mor do rei Afonso XI, rei de Castela. Sim, bastarda, mas esse é um termo tão atroz para ser usado com uma criatura tão bela como aquela. Os seus olhos, dizem os poetas, são azuis e os cabelos loiros, só pela aparência imaginamos o retrato de um anjo. A mãe era sim portuguesa, de seu nome Aldonça Lourenço de Valadares, cujo pai fora conselheiro de D. Afonso III, e do filho que reinava agora, D. Dinis.
Inês foi criada no castelo de Albuquerque, em Espanha, pela senhora da propriedade, onde lhe foram ensinados os dons da mulher da época. Foi-lhe introduzida a costura e os bordados, a boa educação do decoro social, a leitura, a dança e as restantes tarefas de uma fada do lar.
Mais tarde, por volta dos seus 16 anos, tornou-se aia de D. Constança Manuel e depressa se tornaram boas e intimas amigas. Confiavam os segredos uma à outra e complementavam-se: Constança era mais recatada, calma e tímida, Inês era divertida e gostava de ver todos à sua volta a sorrir.
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Pedro e Inês: O amor que se fez lenda
Ficción histórica«A mísera e mesquinha que, depois de morta, foi rainha». Há amores intemporais, tão fortes que reverberam no tempo pela eternidade e transformam-se em lendas! O amor de D. Pedro e Inês de Castro foi real, ao invés de outros compostos por dramaturgos...