Capítulo 1

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  Nem o barulho dos trens de São Paulo conseguiam abafar minha respiração ofegante. Comecei a observar as pessoas entrando e saindo ,enquanto tentava recordar penosamente algo da noite anterior. Minha vista, embaçada , dificultava ainda mais as coisas e quando recuperei a consciência de minhas ações ,mal conseguia me levantar.
O mundo girava ao meu redor e minha cabeça doía , como se tivesse sido pisoteada por uma manada de elefantes. Esbarrei em algumas pessoas e cambaleei até a saída do trem, levei as mãos até o bolso, em busca de documentos ,dinheiro, celular ou qualquer outro meio de sair dali, mas tudo que me restava era uma garrafa vazia de whisky e alguns centavos furados.
Olhei ao redor, tentando descobrir minha localização, pessoas que nunca mais veria, vivendo suas vidas insignificantes, pelo menos pra mim. Interrompido por um terrível enjoo, comecei a pensar que beber de barriga vazia, talvez tenha sido uma das ideias mais estupidas que já tive. A única coisa que passei a tentar descobrir dali em diante era onde ficava o banheiro. Aquele lugar cheirava a peixe podre, o que só aumentou minhas náuseas, enquanto vomitava ouvi vozes sussurrando, eu não sou do tipo que costuma ouvir conversas alheias, mas minha situação não era uma das mais favoráveis.
"Vou encontra-la em Mogi das Cruzes, já faz mais de um mês que não a vejo, tá na hora de afogar o ganso"
Não pude ver o rosto do tal sujeito, mas pelo que entendi, ele estava indo encontrar com a namorada e precisava urgentemente de uma transa. Por algum motivo, a conversa sessou e eu voltei ao que estava fazendo. Ao sair do banheiro me veio a vaga lembrança de que minha irmã, estava morando em Mogi das Cruzes, onde cursava a faculdade de medicina. Rever a felicidade dos meus pais quando descobriram que ela havia conseguido vaga na UMC quase me causava ânsia mais uma vez. Minha irmã era o tipo de pessoa que eu pensaria mil vezes antes de pedir um favor mas minhas opções eram muito limitadas, limite, essa é sem duvidas uma das palavras que eu mais detesto.
Ao andar pela estação notei que algumas pessoas me olhavam meio torto, já outras, com seus rostos cheios de pressa, apenas davam de ombros. Avistei um grande orelhão, acho que era esse o nome, é aquele tipo de coisa velha que ninguém mais se lembra que existe, mas é útil em algum momento.Não fazia ideia de como se usava aquilo, e para o meu azar, não tinha nenhum tipo de manual de instruções, fiquei horas procurando onde liga-lo, algumas pessoas, riam ao olhar pra mim, o que me incomodava um pouco, até que finalmente encontrei o lugar pra colocar as moedas. Forcei- me a lembrar o numero e quando a ligação começou a chamar, minhas pernas ficaram bambas:
—Alo, quem fala? – Uma voz ecoou do telefone. Por pouco não a reconheci:
—Sou eu, irmãzinha.
—Ah, Gesiel! O que você quer? Não podemos conversar mais tarde? Estou atrasada pro trabalho. – Perguntou ,com desdém.
—Se importaria em se atrasar mais um pouco?
—Sim, eu me importaria – Respondeu, secamente. Hesitei por alguns minutos, mas a ligação podia cair a qualquer momento, respirei fundo e criei coragem pra dizer a verdade:
— Estou, bem...encrencado.
— Fala logo! – Exclamou, já sem paciência.
— Poderia vir me buscar aqui na... – Tentei ler o nome do lugar em uma das placas. — Estação Braz Cubas – completei temendo a resposta.
— O que esta fazendo ai!? O papai sabe disso? Vou ligar pra ele!
— Não! Eu te explico quando chegar aqui, por favor ... Kananda ?! – O telefone ficou mudo e eu já podia ouvir o interminável sermão de meus pais.  

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