Era

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- Você era uma criança linda, olha aqui... As imagens vieram tão rapidamente que Chris até se atrapalhou ao tentar observá-las com calma. Respirou fundo e procurou relembrá-las. Memórias do passado de seu tio agora se confundiam com as suas. É claro que ela não poderia se lembrar de ter se visto naquele ângulo, e esso era o único fato que permitia ela acreditar não serem as suas próprias memórias.

O dia já seguia alto e ela não deveria estar interagindo em casa como se não tivesse trabalhando. Naquele momento precisava decidir se participaria pessoalmente da reunião. A telepresença era ainda tida como uma falta junto aos colegas, mas na posição em que se encontrava não existia muito com o que se preocupar. Estava garantida e não necessitava impressionar mais ninguém. Acreditava que sua capacidade criativa a manteria tranquilamente onde estava.

Imaginou-se apresentando a nova ideia para o software quando se deu conta que não havia cortado o contato com Rick e com raiva de si mesma pediu segredo até a manhã seguinte, enquanto ele fascinado já questionava os detalhes.

-Isso só durante a apresentação pensou. Rick que gostava de se considerar especial não se intimidou em esconder a sua frustração, e ela fingiu não ter entendido. - Ok, ora de cortar esse vínculo, pensou e imediatamente a conexão se desfez.

Naquele momento deveria se concentrar nos detalhes das intrincadas rotinas que deveria desenhar para o sistema e voltou a se sentar confortavelmente em seu sofá enquanto iniciava a conexão lógica. Vieram à sua mente os esquemas das interfaces de conexão enquanto ela dirigia seus pensamentos para Artur e nos detalhes das iterações necessárias.

Com uma ponta de orgulho lembrava que esse era um campo que poucas mulheres ainda se destacavam e deixou escapar um cutucão de pensamento para Rick.

Artur, a inteligência artificial destinada a escrever os bastidores do código era uma presença que desafiava a sua mente a produzir mais e melhor. Interagiam como velhos amigos, e ele a conhecia profundamente, bem como ao seu trabalho, e sabia extrair o máximo de seu potencial. O tempo passava sem perceber. Ele estava dentro de sua cabeça, ou melhor, em comunicação com seus sentidos, como toda a comunicação que ocorria, escrevendo e lendo em seus sistemas humanos através da excitação correta dos centros nervosos por meio de ondas eletromagnéticas geradas através de seu brinco, um poderoso computador que todos os seres humanos, ou quase todos pelo menos, possuíam.

A interface que interagia com o sistema nervoso humano tinha definitivamente sido uma das maiores invenções do passado recente e junto com a extrema capacidade de memória e processamento que a miniaturização permitia colocar em algo tão diminuto como um brinco haviam estendido a capacidade humana para algo que até um pouco mais de um século teria parecido mágica.

Redes de células empacotavam todo o pensamento de cada usuário, e a distância já não importava tanto assim. O simples ato de se imaginar conversando com uma pessoa, onde quer que ela estivesse, a colocaria em contato e a troca de diálogos e até de imagens, por meio de avatares altamente sofisticados, que pareciam o indivíduo real dentro da cabeça, travando um diálogo em qualquer ambiente que se escolhesse imaginar.

A comunicação com computadores e outros sistemas, agora regidos por inteligência artificial havia eliminado teclados, monitores e todos os dispositivos físicos. Conversava-se com um sistema da mesma forma que com outro indivíduo qualquer. Sempre por pensamentos. Sem a necessidade de verbalizações. A palavra falada estava se tornando objeto de desuso.


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⏰ Last updated: Nov 19, 2017 ⏰

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O Fator EraWhere stories live. Discover now