O dia de 168 horas

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Eu gostava de ficar de cueca e blusa. Ficar nu era ainda melhor. Mas, por algum motivo, eu não me sentia bem daquela forma perto de Alex. Não era vergonha, era algo...diferente. E ruim. Muito ruim.

Naquele momento, eu estava só de cueca. Não tinha calça para vestir, já que uma eu sujei enquanto brincava e a outra, estava no corpo da Lydia. Antes eu usava uma blusa, mas Alex tinha arrumado um jeito de rasgar a peça e jogar no chão.

Não queria que ele tivesse rasgado. Eu tinha poucas blusas.

O quarto de Alex era bem diferente do meu. Ele tinha uma cama grande. Muito grande. O colchão era macio e tinha vários travesseiros. E lençóis. Era tudo confortável, bom.

Tinha um armário grande. Uma cômoda cheia de gavetas. Luminária. Uma estante cheia de cds. Eu já quis ouvir, queria ouvir as músicas que Alex ouvia. Porém, ele não deixava.

— Eu posso ir embora? — Pedi fraco, com medo da resposta. — Quero ver meu pedaço do céu.

Apesar do quarto de Alex ser melhor do que o meu, eu odiava ficar ali. Preferia ficar trancado na minha parte do mundo do que ficar com Alex. Principalmente quando eu tinha que brincar com ele.

— Lydia está bem, Stiles! E eu tenho certeza que ela não quer ver você. — Desviei o olhar, envergonhado. Sabia que o Paraíso não gostava mais de mim. Mas eu queria vê-la. — Sem contar que você prometeu que ia passar o dia todo fazendo o que eu quisesse.

Concordei com a cabeça, desanimado. Soltei um suspiro longo e me movi na cama para encarar Alex. Ele não estava usando nenhuma roupa. Parecia tranquilo, relaxado. Deitado na cama com os braços atrás da cabeça. Invejei a satisfação que ele sentia.

— Ainda não passou um dia? — Perguntei confuso, desorientado.

Eu era proibido de ter relógios ou saber como o tempo funcionava. Ouvia Alex falar sobre horas, meses, anos e dias. No entanto, não entendia o que isso significava. Ninguém nunca me explicou. Nunca.

Então...quando falava um dia, ou dois, tinha que confiar em Alex. Pois eu não tinha ideia de quando um dia passava. Ele me chamava de burro. E bem, acho que ele tem razão.

— Você só está aqui há.... — Alex ergueu um braço, onde tinha um relógio de pulso. Olhou para lá e sorriu. — Setenta e duas horas.

— Isso é pouco tempo? Não passou um dia? — Voltei a perguntar, confuso. Queria entender as horas. Queria entender os dias.

— Você ainda vai passar muito tempo aqui. — Foi a única resposta de Alex. Suspirei com derrota. Estava cansado, muito cansado. — Olha, Stiles! Meu fazedor de xixi já está em pé, pode voltar ao trabalho.

Olhei incrédulo para o fazedor de xixi de Alex. De fato, ele estava em pé. Daquele jeito engraçado que o meu também ficava. Mas eu não entendia como o dele ficava por tantas vezes seguidas.

— Mas eu estou com fome! Faz quanto tempo que eu comi? — Reclamei baixo, em surto de coragem. Não conseguia não reclamar, mesmo sabendo que podia apanhar.

— Só faz doze horas, Stiles. Aguente mais, sabe que eu não gosto de desperdiçar a comida do mundo com você!

— Mas e-eu...minha barriga está doendo muito! — Apontei no lugar onde sentia a dor no estômago.

Alex bufou e agarrou meu cabelo. Puxou com força, obrigando que meu corpo se erguesse e foi me puxando para sua direção. Fez com que eu ficasse por cima dele, com o rosto perto de seu fazedor de xixi.

— Se você calar a boca, a dor melhora.

— Eu estou com saudades do céu. — Lamentei sentindo as lágrimas surgindo em meus olhos. — E minha boca está formigando, não aguento fazer de novo!

— Claro que aguenta, basta parar de falar!

Ele forçou minha cabeça contra seu fazedor de xixi.

**

Cento e sessenta e oito horas. Foi a quantidade de tempo que passou. Eu não lembrava que um único dia demorava tanto para acabar. Estava desesperado para sair dali.

Não pude ver o céu. Não pude entrar no meu pedaço do mundo. Tive que ficar seguindo Alex o tempo todo. Fazendo a brincadeira nele, sempre que me pedia. Mesmo sem eu querer. Eu nunca queria.

Até no banho eu tinha que o seguir! Eu não entendia porque Alex queria tomar banho comigo. Não era bom ficar com ele. Ele era malvado, falava coisas ruins para mim.

Eu precisava saber se o Paraíso estava bem.

— Alex....

— Pare de chorar, Stiles! — Ele brigou com voz a dura, as mãos fechadas em punho. Tive medo de apanhar.

— Por favor, me deixa voltar para o céu!

— Foi você que fez essa promessa, Stiles! Você não disse que ficaria comigo para eu não machucar a Lydia?!

— Eu sei. — Lamentei sentindo as lágrimas despencando com fúria. — E-eu não quero que você a machuque, mas eu não sabia que um dia demorava tanto!

— Porque você é estúpido, Stiles!

Encolhi o corpo com a ofensa, abracei meu tronco. Queria controlar o choro, porém, não conseguia. Eu queria voltar para o céu! Queria vê-la e poder conversar. Odiava Alex e tinha medo que Lydia sumisse.

— D-desculpe, e-eu só...

— Levante agora! — Tremi com o grito, olhei horrorizado para Alex. — Eu disse para você levantar!

Com as pernas tremendo, fiquei de pé. Continuei me abraçando. Tive medo que Alex pedisse para eu fazer a brincadeira de novo. Eu odiava fazer. A brincadeira só era boa quando eu fazia em mim, sozinho. E odiava ter que usar a boca. Mas Alex sempre pedia. Sempre.

— E-eu não....

Alex agarrou meu braço com grosseira. Grunhi de dor e fui arrastado com grosseira para fora do quarto dele. Passamos pela sala e então, chegamos em frente a porta do meu quarto.

O vi pegar uma enorme chave do bolso e abrir a grande fechadura que trancava a porta. Nem acreditei quando vi a porta do meu pedaço do mundo se abrindo.

— Obrigado! — Quase gritei, eufórico.

Alex não parecia compartilhar da minha satisfação. Ele soltou meu braço e logo em seguida, empurrou meu ombro com força. Eu caí no chão duro, gemendo baixo de dor.

Abracei as pernas e vi o momento em que ele fechou a porta, me trancando de novo.

— Stiles?

A voz do céu foi o suficiente para eu parar de chorar e me esforçar ao máximo para sorrir. Ainda caído no chão, virei com dificuldades para o Paraíso. Vi seu rosto lindo e me surpreendi.

Ela continuava linda. Como sempre. Mas estava diferente. Tinha olheiras roxas abaixo dos olhos muito vermelhos. O nariz estava inchado, a boca machucada como se ela tivesse mordido muitas vezes. As mãos tinham manchas vermelhas e....ela estava mais magra.

— Você está bem? — Perguntei com receio, pois sabia que ela não gostava de mim.

Lydia negou com a cabeça. Ela negou! Seus olhos começaram a derramar lágrimas repentinas e eu senti meu coração se despedaçar aos poucos. Sentei no chão duro, sem saber o que fazer.

— Não, Stiles. Eu não estou bem.

Não sabia como, mas eu ia arrumar uma forma de alegrar meu céu.

O Pequeno pedaço do céuOnde histórias criam vida. Descubra agora