A vida nunca foi perfeita e era triste ter que encara-lá sozinha. Especialmente do jeito que ela precisava viver. Tantos sacrifícios e perdas. Sobreviver sem sua família em um mundo totalmente diferente pode ser um fardo pesado demais para carregar. Ela não esperava uma vida fácil, de qualquer maneira. Mas uma vida isenta de perdas e dores... Não a moldaria como é hoje. Não a faria a super heroína que tanto ama ser.
Ela gostaria de pelo menos ter tido tempo para se despedir. Esse era o grande arrependimento de sua vida. Tudo parecia tão bem encaminhado que ela ao menos acreditou quando tantos dos seu amigos de escola disseram sobre a calamidade que poderia acontecer. Ela tinha sua melhor amiga, sua família, estava perto de terminar os ensinos básicos e logo estaria com idade o suficiente para o cruzamento de dados. Ela cresceria, teria um filho ou filha com seu marido pré selecionado mecanicamente, e seria feliz vendo os avanços tecnológicos de seu mundo. Mas era tudo tão dolorosamente distante agora.
Ela sentia tanta falta dos pais. De toda a sua antiga vida, mas a dor mais lasciva em seu peito era a falta do calor dois. Não que eles fossem muito afetuosos, não era da cultura krytoniana as pessoas se tocarem constantemente. Mas ela sentia falta da aura de conhecimento do seu pai, da calma com que sua mãe falava. Sentia falta daquele calor no peito quando estava sob as asas deles. Doía não poder compartilhar com a mãe cada oratória que faria na escola, e pesava de maneira inimaginável não poder sentir o olhar orgulhoso de seu pai quando terminasse de catalogar todos os seres vivos do pântano do planeta.
A perda de seu planeta já fora uma ferida escancarada que agora não passava de uma cicatriz feia que não tinha tanta importância. Era, de fato, muito dificultoso falar sobre tudo que não foi lhe permitido passar em seu planeta natal. Sobre todas as tradições que ela não poderia ver pessoalmente (ressalvo os hologramas que Kelex satisfatoriamente a mostrava), sobre todas as paisagens que não pôde salvar em sua memória, sobre todas as pessoas que não pôde conhecer. Mas era passado. Seu mundo havia sido destruído em uma catástrofe sem precedentes e ela deveria lidar sabiamente com isso. As dores do passado podem e devem ser transformadas em aprendizado no presente, e era assim que Kara encarava esse pedaço do seu futuro que lhe fora arrancado cedo demais.
Ao contrapasso de toda essa tristeza, existia sua nova família. Alex era a pessoa mais importante de sua vida, sua confidente e maior heroína. Tudo que ela havia se tornado, devia e muito à irmã. De certo que ela foi uma criança muito introvertida, uma adolescente antissocial e estava sendo uma adulta muito difícil de lidar. Mas Alex, ela estava do seu lado todos os segundos de sua vida nesse planeta. A irmã havia abdicado tanto por ela, chegava a sentir-se mal se pensasse por muito tempo. Sua infância foi ofuscada por uma alienígena invasora em sua própria casa, mas ela lidou bem com isso. Sua adolescência foi sobrecarregada em tentativas, por vezes falhas, de esconder que havia algo de errado com sua recém adotada irmã. A fase adulta não estava sendo muito diferente. Kara era uma solitária e retraída jovem de 23 anos, por vezes sendo extremamente difícil de tirar da carcaça. Alex tentava insistentemente fazer com que a irmã se sentisse em casa mesmo após todos esse anos. Mesmo após todas as tentativas darem errado. Mesmo após perceber que a loira não pertencia á esse mundo.
Por vezes, e elas eram muitas, Kara colocava-se a voar para fora do planeta apenas para refletir. Ela observava com sincera afeição e admiração a vista privilegiada da Terra, e em todas as vezes se sentia aliviada. O silêncio era reconfortante após anos ouvindo tudo e todos ao mesmo tempo. Ela sentia-se livre, finalmente podendo agir e ser de acordo com sua natureza krytoniana. Eram nesses momentos que ela não sentia as amarras ou o bloqueio mental que era obrigada a ter todos os dias. Ela podia ficar sem respirar se quisesse, podia sentir a raiva fluindo por todo o seu ser sem precisar se retesar por medo de todo o mundo frágil ao seu redor. Kara podia ser ela mesma nesses raros momentos.
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Tell Me You Love Me
FanfictionComo Lena e Kara reagiram á um amor que não tinha espaço na vida das duas.