Minha mãe não parava de reclamar sobre eu ter voltado para a casa dela depois que fui despedida do hospital. Foi uma medida necessária, não iria mais aguentar pagar o aluguel do apartamento sem o emprego, por isso em menos de uma semana já dei um telefonema para a minha família avisando que passaria uns dias lá.
Começou a ser um problema quando esses dias se passaram e se tornaram meses, o que deixava todo o restante da casa um pouco desconfortável. Não por que eu era folgada ou desorganizada, mas sim por que eu sentia a necessidade de sempre conversar, então em todos os momentos estava atrás de alguém puxando assunto até me expulsarem cômodo.
— Julieta, vai trabalhar! — Diziam todos.
Enviei currículos para vários hospitais e até criei uma página no LinkIn, mas não recebi nenhuma resposta das dezenas de lugar que postei.
Foi em uma tranquila e quente manhã, onde eu estava sentada com as pernas para o ar no sofá, lendo os classificados do jornal local que eu me deparei com um anúncio mais do que interessante. "Necessitamos de uma cuidadora de idoso", dizia com letras miúdas. Durante os quatro anos que trabalhei depois de terminar a faculdade sempre estive dentro de hospitais, agora seria um bom momento para pôr em pratica um talento focado em apenas uma só pessoa.
Segurei com firmeza o telefone fixo na parede enquanto discava os números que constavam no papel do jornal. Um toque e ninguém me atendeu. Dois toques e ninguém me atendeu. No terceiro toque, quando eu roía as unhas de nervosismo, uma voz feminina gentil atendeu do outro lado.
Gaguejei bastante, mas a ligação correu bem, com a outra mulher, Luiza Oliveira, sempre conduzindo a conversa de forma que enchia os olhos estar falando com uma pessoa portadora de tanta eloquência. A moça se apresentou como filha de uma senhora para lá dos sessenta anos, com várias doenças crônicas que exigiam demasiado cuidado.
No final da ligação, Luiza perguntou se eu realmente me achava apta para atuar na área. A maneira como ela perguntou me fez questionar inconscientemente se eu era a pessoa certa para ocupar a posição. Estufei o peito e com todo o orgulho que restava disse que sim, a mulher assentiu positivamente e marcamos a entrevista para o mesmo dia, na parte da tarde.
No momento seguinte devolvi o telefone ao gancho e corri em direção ao meu quarto, abri o guarda roupa com tanto entusiasmo que quase quebrei a porta. Escolhi os meus melhores sapatos — que, por sinal, era o branco que eu usava para trabalhar — e puxei do fundo da gaveta um vestido azul meio escuro que comprei a alguns anos e usei uma única vez. Me vesti, olhei para o espelho e vi que meu cabelo estava levemente aceitável para uma entrevista de emprego, apenas um retoque de um lado ou outro e estaria perfeito.
Laura, minha irmã de dezesseis anos, passou pela porta do meu quarto, indo em direção a cozinha, mas voltou com o olho arregalado quando percebeu o que estava fazendo.
— Vai sair em um encontro? — Ela perguntou, parecendo animada com a possibilidade de eu ter encontrado um pretendente.
— Não, melhor. - Abri um largo sorriso. — Acho que finalmente vou arrumar um emprego!
Ela me olhou por três segundos, analisando se eu teria acabado de contar uma piada ou não. Quando Laura vê que minha empolgação é grande demais para ser fingida, ela abre os braços, me abraça e deseja boa sorte.
Em alguns minutos terminei de me arrumar. Me despedi da minha irmã, a única que estava em casa no momento, e sai pela porta da frente, passando com cuidado pelo pequeno jardim da minha mãe. O sol batia com força na cabeça, dando ideia de que a sensação térmica não devia ser menos de trinta graus célsius. Cheguei no ponto e esperei pouco até o tempo de o ônibus passar.
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Azevinho
Short StoryJulieta era só mais uma entre todas as pessoas que procuram emprego nesses dias difíceis de crise, porém quando finalmente consegue um emprego de cuidadora de idosos, ela recebe a insuportável tarefa de cuidar de uma mulher completamente desprezível...