Carlos Eduardo - Você está bem, Brunérrima?

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─ Você está bem, Brunérrima? – Perguntei quando finalmente me senti à vontade. Ela, maquiada, batom vermelho, cabelo sedoso e bem tratado caindo pelos ombros, era uma imagem de coragem e determinação forte demais para mim. Eu não esperava tanta força. Aquilo me intimidava.

─ Estou ótima. – Sorriu. – Lá no fundo, Kadu, eu sabia que o dia de perder minha avó estava chegando. Chegou. Pronto. Chorei, lamentei, sofri, sacudi a poeira e estamos aqui para mais uma.

─ Nossa, Bruna! Quanta frieza! – Eu nem a reconhecia. Era tão intensa de sentimentos, principalmente com relação à avó. Ela gargalhou com meu comentário.

─ Anota aí, filhinho de papai. Mais uma diferença entre pobre e rico: rico sofre quentinho em casa, debaixo das cobertas, mas o pobre, meu filho, se não for para luta, sofre de barriga vazia. E isso dói mais ainda. Posso garantir.

Nem me dei ao trabalho de continuar a eterna luta de classes que existe na cabeça de Bruna. Marxista demais para o meu gosto. Ela respeitou meu silêncio, mas quando estacionou na emissora, um pouco mais ela mesma, desligou o carro, virou para mim e disse:

─ Minha avó também não gostaria que eu ficasse sentada em casa sofrendo, não é mesmo? – Conseguiu me arrancar um sorriso com essa.

Estávamos com o horário apertado, por isso apressamos o passo sem mais conversas. Esse ensaio era gravado, a equipe estava a nossa espera. Apesar da pretensa informalidade dos vídeos antes da nossa exibição ao vivo aos domingos, era tudo devidamente planejado, programado e editado. Enfim, televisão.

─ Bruníssima, eu lamento tanto! – Mal entramos no setor de figurino, uma das costureiras veio logo abraçá-la.

Eu nem imaginava que Bruna era tão querida, a morte da avó nem virara notícia. Não havia reportagem nem no velório, nem no enterro, pelo menos. Não vi sequer uma notinha de jornal. E ainda assim a costureira da emissora vinha prestar condolências. Achei esquisito, mas nem me dei ao trabalho de pensar em outra coisa.

Foi o silêncio e o burburinho dos vestiários que me alertaram que algo estava para vir. Nada parecido com as vezes anteriores, a mulherada falando e falando e falando em alto e bom som. Pelo contrário, cochichos e fofoquinhas. Risadinhas e mudança de assunto.

Quando minha roupa estava finalmente ajustada. Uma calça preta, camisa branca e um colete risca de giz de listras grossas, dou de cara com Bruna, igualmente vestida com um vestido preto curto de melindrosa. E ela estava branca. Lívida.

─ Ele não tinha o direito de fazer isso com você, minha querida! – Dizia uma das moças que a assessoravam.

Alguém segurava um celular com fotos de Altair numa ilha da costa da Espanha, ele aos beijos com uma garota de topless.

Por Onde AndeiOnde histórias criam vida. Descubra agora