Seguia, rua larga, vila nova onde residia, tendo como companhia única: o toc-toc do salto grosso, baixo e quadrado dos sapatos escuros.
Noite iluminada, clara e gentil. Lua redonda, a brilhar no céu lhe fazia companhia.
Apressadamente, caminhava. Por vezes, leves sustos quando alguns animais domésticos lhe cortavam o caminho.
Ao final da vila nova, a pequena estrada íngreme, difícil de subir e estreita. Tão estreita e inclinada que era imprópria para carros. Feita de paralelepípedos, ladeadas de casas velhas, marcando o fim da vila nova.
A partir deste ponto, nenhum veículo conseguia entrar na vila velha, somente carroças e charretes turísticas.
Após, a cansativa subida, ao alto, pois a Vila Velha ficava bem abaixo numa clareira, vislumbrou-a que, agora de forma inexplicável estava coberta pela névoa densa.
Tudo apagado.
Tudo aparentemente sem vida.
Até a lua tão cheia e linda veio com ela até ali. Pareceu não iluminar aquela clareira antiga.
Estranhou a formação da extensa neblina a ocultar até a estrada de ferro que cortava todo o vale, escondida diante da força da natureza. A neblina igual a uma grande espuma, um grande algodão doce, cobria a estrada, as casas, a vila.
Imaginou que, de tão grossa, poderia ser cortada por uma faca.
Lado direito, velha igreja e do lado desta, o cemitério: único da cidade.
Vento forte, típico das montanhas, açoitava as quaresmeiras do pátio da igreja e do cemitério. Bem como outras árvores ali próximas. Mexia folhas e galhos, os mais finos, no escuro, ficavam distorcidos e balançavam tanto, feito grandes tentáculos, que invadiam toda a extensão da rua estreita como filetes enegrecidos.
As vastas copas tremeluziam a luz vaga da rua e as rajadas de vento mudavam a direção dos galhos destas, emitindo sons como a sussurrar blasfêmias.
Lá embaixo, vila velha, nome dado em virtude de ter sido a primeira vila a ser construída com a chegada dos ingleses, ainda mantinha as velhas construções do século XIX.
Porém, a neblina a amedrontava. Estranha visita que tudo escondia.
Respirou de forma profunda. Agarrou-se ao colarinho do casaco, olhou ao redor e começou a descida rumo à ponte que servia de passarela para a estrada de ferro, o divisor de águas entre o novo e o velho. Entre a vila nova onde residia e a vila secular do Castelinho onde residia o médico.
Absorta em sua jornada, não reparou no som da porta de uma velha cripta, fechada com vários cadeados grossos, se abrindo. Bem como, não ouviu o ranger do velho portão do cemitério.
Nem reparou na estranha forma, feito roupa velha esfarrapada, escura, alta, sinistra que se movia, como amparada por fios invisíveis, ao lado de outras formas estranhas, cujas narinas eram flamejantes, olhos, dois pontos brancos, a piscar feito vaga-lumes que passaram a lhe seguir silenciosos, calados, mudos, apoiados pela neblina que os deixavam invisíveis.
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O Mistério da Neblina
Mystery / ThrillerCidade pacata, tranquila, interior de São Paulo, onde o novo e o velho conviviam. Vila Nova e Vila Velha separadas pela ponte que servia de passarela para a estação de trem. Na Vila Velha, o velho relógio estilo Big-Ben, construções seculares, v...