Singularidade

A sala estava lotada, com câmeras transmitindo para vários canais de televisão ao redor do mundo, além de streamings para vários sites e canais online. Talvez por ser novidade, mas o mundo todo nunca esteve tão ligado a um anúncio científico como o de agora, nem quando foi anunciado o sucesso do retorno da primeira missão tripulada a Marte. Alguns jornalistas presentes estavam especulando justamente sobre isso, que talvez o fato de isso estar acontecendo aqui na terra e conseguir, potencialmente, afetar a vida de toda e qualquer pessoa, esse anúncio tenha ganhado mais notoriedade do que sobre viagens interplanetárias.

Mas também, muita gente era contra e aparentemente havia mais pessoas do lado de fora do prédio protestando o anúncio do que pessoas dentro aguardando, ansiosos. A maioria dizia que isso era sinal do fim dos tempos, que era arma de Satanás para nos afastar do plano de Deus ou então que o Pecado Original havia estipulado a morte para toda a humanidade e que a ciência estava profanando a criação, cometendo sacrilégio. Além dos religiosos, haviam protestantes políticos, com placas dizendo como isso ser anti-natural, ou até mesmo imoral. Havia até uma placa com a frase de Heidegger, "Do momento que nascemos já estamos prontos para morrer". Como era de se esperar, a ciência não conseguiria agradar a todos.

Dentro da sala onde ocorreria o anúncio todos estavam ansiosos. Estava tudo dentro do cronograma, e não estavam esperando atrasos. Enquanto esperavam, os telões do auditório com capacidade para mais de duas mil pessoas estava passando algumas imagens das pesquisas do GennLabs, como produção hidro e aeropônicas de alimentos em fazendas verticais, desenvolvimento e produção de vacinas, criação de florestas tropicais urbanas, tratamento para vários tipos de câncer considerados incuráveis por muito tempo, regeneração neurológica, interface cibernética e aplicação de próteses e órteses controladas pelo cérebro, entre várias outras pesquisas voltadas para biotecnologia e saúde.

Ao se aproximar do horário marcado, as luzes do auditório começaram a diminuir e um vídeo começou a passar. Com música impactante ao fundo, o vídeo mostrava cenas da infância de uma menina ruiva, crescendo saudável. Sobre essas imagens, ouvia-se a narração: "Genevive Arthurs nasceu há 38 anos e foi a jóia da família Arthurs que aguardara ansiosamente a concepção e nascimento de sua primeira e única filha. Sua mãe havia passado por um tratamento complicado de câncer no útero que dificultou todo o processo e colocou em risco a vida da pequena Genny. Seus pais fizeram de tudo para dar a sua filha a melhor vida possível e conseguiram. Mas o destino aguardava algo pouco agradável."

Neste momento as cenas mudaram para imagens da menina na adolescência e iniciando a vida adulta. A música também fica um pouco mais triste e solene. A narração prossegue: "Aos quinze anos ela recebe o fatídico diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica, doença rara que iria aos poucos degenerar seus músculos, deixando-a presa a uma cadeira de rodas e respirando e se alimentando por aparelhos. Apesar do pesado destino, a jovem Genny não quis desistir de tornar-se a melhor pessoa que poderia e hornar a herança de seus pais. Seus sintomas começaram a aparecer aos vinte e dois anos de idade, mas isso não atrapalhou seus planos. Ela tornou-se a melhor aluna da turma, conseguiu uma bolsa integral para estudar medicina em Harvard e ao formar-se dedicou sua vida para a pesquisa biológica para curar esse terrível mal.

As imagens mudam novamente, com recortes de jornais, revistas e blogs, mostrando suas pesquisas e o progresso de sua doença. A narração continua: "Aos vinte e seis tornou-se sócia de Emmanuel Maxxim e uma das principais pesquisadoras do MaxximLabs. Aos trinta, já usufruindo do resultado de suas pesquisas com órteses biônicas, ela herda o laboratório de seu professor e sócio após sua morte e renomeia-o GennLabs. Ela continua produzindo, mas, por conta do progresso da ELA, Genny tornou-se cada vez mais reclusa. Depois de quatro anos longe dos holofotes e sem ter parado de trabalhar um segundo, temos o prazer de apresentar a doutora e líder do GennLabs, Genevive Arthurs!"