3:00 da manhã

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Havia alguém sentada no corredor.

Quando Camila fez a curva, teve que parar e ficar encarando. A garota sentada no chão e encostada na parede usava uma meia arrastão rasgada, suas pernas quase totalmente visíveis por causa da saia curta demais, e o cabelo era longo e negro. Ela parecia bêbada, e também parecia uma jovem delinquente.

Camila não era do tipo que julgava sem conhecer, mas com a violência esses dias não se podia arriscar. Quer dizer, com excessão de sua vizinha, que Camila julgava completamente mesmo nunca tendo botado os olhos nela. A tal mulher que se mudou uma semana atrás e se achava uma cantora profissional.

A voz dela era até bonita, o problema era os horários que ela resolvia soltar a voz para ensaiar: sempre das 2:00 às 4:00 da manhã.

Enfim, Camila teria que passar pela jovem delinquente para chegar ao seu apartamento. Ela começou a andar de novo, quase correndo e ao mesmo tempo tentando não fazer barulho. Na hora de tirar a chave da bolsa, no entanto, Camila acabou derrubando o chaveiro.

A jovem sentada na porta ao lado abriu os olhos. Eram verdes como uma jóia, contrastavam com o cabelo preto e pele clara. Ela sorriu para Camila. Nossa, ela era muito linda.

- Parece que você viu um fantasma. - Disse a estranha. - Algum assassino passou por aqui enquanto eu cochilava?

- N-não. Desculpa, não quis te acordar. - Camila abaixou para pegar a chave, mas a estranha já tinha pegado e oferecido para ela. - Obrigada.

- Na verdade, fico feliz por ter me acordado. Eu moro aqui, meu nome é Lauren. - Lauren se levantou, sorrindo. - Esqueci as chaves no bar que eu trabalho e fiquei trancada para fora.

Ah, não. Lauren era a vizinha barulhenta.

Camila estreitou os olhos na mesma hora, segurando-se pra não falar umas verdades na cara da moça. Não é porque ela era bonita que ia se livrar do sermão de uma estudante/estagiária que ficava fora o dia inteiro e só tinha a noite para descansar.

- Eles deixam os funcionários beberem nesse tal bar que você trabalha? - Retrucou Camila, ríspida, visto que de perto tinha certeza que Lauren estava mesmo meio bêbada.

- Hoje deixaram. É Halloween. - Lauren continuou sorrindo sem se afetar. - Estava pensando, você poderia deixar eu ficar no seu apartamento?

- Por que? Se você quiser eu empresto o telefone para você chamar um chaveiro ou...

- São 3 da manhã. Não tem nenhum chaveiro funcionando agora. Prometo que vou me comportar.

Camila quase riu da própria estupidez. Ela esqueceu do relógio, porque raramente ficava fora tão tarde. Como Lauren disse, era Halloween, e a festa do estágio durou mais que o esperado.

- Tá bom. - Cedeu, destrancando a porta e deixando Lauren passar.

Podia estar brava, mas não era cruel de deixar alguém dormir no chão, especialmente no frio.

- Você pode ficar com meu sofá. - Ofereceu, enquanto Lauren observava ao redor. - Não repare na bagunça. Não tenho dormido muito.

As pilhas de DVDs, livros e copos de chá na mesa de centro eram prova disso.

Lauren já estava tirando os sapatos para deitar. A gata de estimação de Camila, Nala, começou a brincar com a meia arrastão da outra, o que era estranho porque Nala não gostava de estranhos.

- É minha culpa, não é? Desculpa. Eu canto em dois lugares durante o dia e o único horário que tenho para ensaiar é de madrugada.

- Só queria que você arrumasse um isolamento acústico, sei lá, ou ensaiasse mais baixo. - Camila trouxe um cobertor reserva do quarto, colocando-o na ponta do sofá onde Lauren sentava. - Eu moro nesse prédio há bastante tempo, e acho importante estabelecer limites.

Lauren assentiu, mas parecia esconder um sorriso.

- E que tipo de limite se refere aos animais domésticos invadindo apartamentos alheios? Você sabia que a sua gata pula para a minha sacada todas as manhãs e come o meu cereal?

Camila arregalou os olhos.

- Nala entrou na sua casa? Então é por isso que ela vem desaparecendo ultimamente?

Lauren assentiu.

- Eu não fazia ideia. Desculpa. - Camila atirou um olhar mortal para Nala, que ronronou nos braços de Lauren.

- Não tem problema, eu não me importo. - A garota dos olhos verdes levantou, ficando muito perto de Camila. - Talvez possamos discutir sobre... limites... mais tarde. - A voz dela era meio sugestiva, o que assustou Camila.

Lauren se aproximou ainda mais e Camila pensou que fosse beijá-la. Pensou em se afastar se fosse o caso, mas Lauren só mexeu no cabelo de Camila, tirando algo que parecia um dos doces de Halloween da festa que acabou grudado lá.

Lauren jogou o doce na boca e deitou no sofá, suas últimas palavras sendo:

- Obrigada por me deixar ficar aqui.

Camila começou a sair da sala numa espécie de transe, mas voltou para buscar Nala e trancá-la no quarto para que não fugisse na manhã seguinte. Mas era tarde, Nala estava dormindo encolhida ao redor de Lauren, que também respirava profundamente.

Vizinha Inesperada - CamrenWhere stories live. Discover now