•57• Panqueca

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Sinto algo macio e molhado brincar com o meu pescoço e abro os olhos. Ao perceber que havia acordado, Jimin passou a me encarar e apertou meu nariz, me abraçando em seguida.

Bom dia, flor do dia — selou meus lábios — Dormiu bem?

Hmmmmmmm... — cocei os olhos e me sentei na cama — Você é cheiroso até dormindo, sabia?

Ele sorriu bobo, com os olhinhos fechados.

Eu gastei todo o frasco de perfume de bebê pra dormir com você. Eu sei que você ama cheirinho de neném.

Baguncei os seus cabelos e ele pegou a minha mão, me puxando pra fora da cama, animado. Gemi baixinho, ainda estava morrendo de sono e odiava levantar com essa rapidez toda, mas pela primeira vez, acordei com um certo ânimo pra viver. Deixe-me ser guiada até fora do quarto e a lembrança do meu sonho volta a tomar conta da minha mente, minha garganta seca e minha barriga gela. Odeio ficar nervosa com meus próprios pensamentos.

Qual é a necessidade disso? — paro bruscamente e digo em tom um pouco rude.

Jimin passa a me encarar com uma feição confusa.

Tudo bem que eu sei algumas coisas sobre você, mas bipolaridade é uma característica nova — depositou a mão no queixo e pareceu pensar por alguns momentos — Mas não tem problema nenhum, gosto de você do seu jeitinho mesmo — voltou a me puxar pelos longos corredores.

Isso me deixou tão triste. Não a gentileza dele, mas sim o fato de tê-lo tratado mal e ele ter reagido tão calmamente, me faz imaginar que já deve ser acostumado a ser tratado dessa forma. Resolvo escancarar um sorriso ao avistar dona Belinda terminando de arrumar a mesa de café da manhã.

Bom dia, minha coroa! — o garoto a abraçou.

A senhora sorriu de orelha a orelha.

Panquecas? — pergunto cabisbaixa.

E a atenção é voltada para mim.

O que houve? Minhas panquecas não te agradam, senhorita? — olhou-me um tanto quanto assustada.

Belinda sabe fazer panquecas como ninguém mais faz, você vai gostar — comentou.

Oh! Não, não é isso! — sorri amarelo — Eu amo panquecas e essas parecem estar deliciosas!

Era mentira, eu odiava. Panquecas me fazem lembrar de mamãe, e mamãe não está mais aqui para degusta-las comigo. Todas as manhãs eu acordava com um cheirinho diferente passeando pela casa, todos os dias era um recheio novo inventado por ela entrando por minha goela abaixo. Na semana em que ela faleceu, todo lugar tinha aroma das panquecas dela, não importa onde fosse, o maldito cheiro estava. Desde que ela se foi, nunca mais as comi, só o cheiro já me enjoava, mas de uma coisa eu tenho certeza: não posso recusar, não hoje. Não posso fazer pouco caso, não hoje. Justamente hoje.

Então tenham um bom apetite, crianças — disse e se retirou do recinto.

Paraliso em frente à mesa, encarando as tais panquecas. Não pareciam ruins, mas eram minhas atuais inimigas mortais e minha missão era comê-las sem fazer cara feia, afim de agradar meu namorado. Desperto do transe com um mísero pulinho ao sentir algo envolver minha cintura. Jimin distribuiu beijinhos ao longo do meu pescoço e, como em um passe de mágica, eu já me encontrava sentada em uma das cadeiras.

Qual delas você prefere, morango ou chocolate? — perguntou, com uma faca na mão, cortando um pedaço para si mesmo.

"Nenhuma", pensei.

Hum... a de morango.

A de chocolate é mais gostosa.

É mesmo?

Sim, e você sabe muito bem que "gostosa" combina com você — olhou para baixo e mordeu os lábios.

Não importava o sabor, eu iria engolir sem mastigar mesmo.

Então eu quero a de chocolate — dei de ombros.

Não demorou muito para que meu namorado me entregasse. Visualizei o prato cheio — quando digo cheio, é cheio mesmo, Jimin deve pensar que sou morta de fome — e tentei esconder a feição de enjoo. Peguei o garfo e cortei a panqueca com uma faca que também estava ali. Enfiei na boca sem aviso prévio e ao tentar mastigar, uma gastura né consumiu.

Que prato bonito. Onde seu pai comprou? — naquele momento qualquer assunto era válido.

Não foi ele, foram os empregados.

Legal — acenei com a cabeça — E quantos sofás tem essa casa? — mais uma garfada camuflada.

Olhei de relance para o prato de Jimin e o mesmo estava quase vazio, o que só fez aumentar o meu desespero. Senti o gosto azedo fruto da fusão do chocolate com a bile e tampei minha boca.

Eu não tenho... — me apressei até o banheiro — ideia — finalizou, confuso.

Abri a porta do cômodo com certa dificuldade e despejei todo o conteúdo no vaso sanitário. Um alívio percorreu a minha barriga quando ele já estava todo pra fora.

Você está bem? — uma voz rouca surgiu atrás de mim.

Levantei o olhar, sem me virar.

Ótima.

Ouço um suspiro e duas mãos me põem em pé, virada para si. Ele me encarava com uma cara de desacreditado, como se aguardasse uma explicação.

Eu estou bem, de verdade — sorrio de canto — Vamos voltar a comer? — digo e o puxo de volta para a mesa, mas ele se nega.

Era só dizer que não gosta de panquecas — cruzou os braços — Ninguém vai morrer e nem se chatear por um gosto seu. Também acho que não deve fingir que gosta de algo só para me agradar.

Olhei no fundo dos seus olhos e suspirei.

Eu só queria que... — Jimin deposita o indicador nos meus lábios.

Me prometa que nunca vai fazer algo que não se agrade por minha causa, Kayla.

Acenei freneticamente com a cabeça e ele me envolveu em seus braços.

E de qualquer forma, se você demonstrasse que gostou, ela faria sempre a mesma coisa. Eu não ficaria feliz em te ver vomitando todas as manhãs que passasse aqui em casa, tudo bem? — me encarou ainda me envolvendo em seus braços, com um olhar protetor.

Você é um anjo — selei sua boca.

Eu sei — deu de ombros — Agora vamos, te deixarei em casa — agarrou minha mão direita e me guiou até a garagem.

[•••]

Saio do elevador e destranco a porta do apartamento, girando a maçaneta em seguida. Até que essa manhã foi a melhor dos últimos anos, apesar do mal estar. Arranco os sapatos dos meus pés e piso no tapete felpudo, sentindo algo gelado na sola do esquerdo. Agacho-me e pego o pequeno bilhete, que possuía a seguinte frase:

"Bem vinda de volta, darling"

Tremo na base com a possibilidade de ter alguém invadindo minha residência e saio investigando todos os cômodos. Não havia ninguém em nenhum. Suspiro aliviada e vou quase rastejando de cansaço até meu quarto. Empurro a porta e quase caio pra trás com o que vejo.

Olá, anjinho do papai.

The Mission • BTSOnde histórias criam vida. Descubra agora