─ Você só pode estar fora de si para me fazer uma proposta dessas, Carlos Eduardo!
─ Mãe, não é uma proposta. É um pedido. – Minha mãe estava tão agitada com aquela conversa que andava de um lado para o outro da sala. Meu pai a observava sentado à mesa da sala de jantar. Ele não queria se meter, mas eu sabia que me apoiava. Ele sempre me apoiava.
─ E que pedido, não é mesmo? – Ela me encarava num misto de zanga e amor maternal que lhe era muito típico. – Você sabe que não costumo trabalhar com isso.
─ Mãe, você faz exatamente a mesma coisa para as nossas casas há anos. E você é a melhor que eu conheço. – Achei que cabia aqui um elogio à competência de Dona Débora. Um elogio sincero. – Não será difícil agenciar também uma atriz. Quanto mais uma garota como Bruna, já conhecida do público.
─ Conhecida mais pelos seus biquínis do que pelo seu talento, você quer dizer...
─ Essa é a realidade que eu gostaria que você mudasse, mãe. – Inteligente e perspicaz. Minha mãe pegava rapidamente o fio da meada. Eu precisava pensar rápido se quisesse convencê-la. – Bruna é uma garota talentosa. Nem a senhora pode negar isso.
─ Você sabe que eu não gosto nem um pouquinho dela, Kadu. – Eu marquei um ponto. Ela não quis discutir o talento de Bruna, mudou de assunto. – Ela é arrogante. Impetuosa. Notadamente teimosa. Não me parece nem um pouco receptiva a sugestões. Como posso trabalhar assim? Passei anos para lhe ensinar o valor da disciplina e bastou a influência dela por alguns dias para você largar o escritório numa sexta à tarde e...
─ Não precisa exagerar, Débora. – Meu pai interrompeu a chantagem emocional de mamãe. Eu já sabia que ela não ia deixar barato minha folga. – Kadu merece demais uma tarde livre com a namorada.
─ Que seja! – Reconheceu o argumento, mas fechou a cara. Não gostava de ser pega no flagra da chantagem.
─ Posso lhe garantir, mãe, que Bruna é ainda mais determinada do que eu em alguns aspectos. Ela a obedeceria sem piscar nem vacilar...
─ Jura? – Pelo tom de voz, eu sabia que ela me pegaria pela mentira. – Ela sabe que você está aqui me pedindo para que eu seja a agente dela?
─ Ainda não... – Vacilei. Seus olhos me diziam que ela estava pronta para me dar um bote. Meu pai veio ao meu socorro novamente.
─ Débora, vai por mim, se ele convenceu a menina a te aceitar como sogra, você acha que ele não consegue fazê-la te aceitar como agente...
Não consegui conter um sorriso. O bom-humor do papai era contagiante. Mas a piadinha, apesar de ter sido um argumento definitivo, atiçou a fera.
─ Por que você está fazendo isso, meu filho? Por que está intercedendo por ela dessa forma, mesmo sabendo que não será fácil para nenhuma das duas? – Perguntou.
─ Porque eu gosto dela. Porque me preocupo com seu futuro. Porque sei que foi uma história difícil de escrever. Porque ela merece mais. – Comecei a enumerar meus motivos. Sabia que era a hora de ser sincero. Minha mãe tinha de ver como eu me sentia com relação a esse assunto, não era uma proposta, era um pedido. Dona Débora, no auge de sua carreira, não ganharia nada além de problemas agenciando Bruna, mas eu gostaria que ela o fizesse, nem que fosse por mim. – E esse mais é você, mãe.
─ Eu preciso pensar, Carlos Eduardo. – Ela deve ter percebido a sinceridade na minha fala. Baixou o tom de voz. – Antes que eu supostamente venha a aceitar, preciso saber de uma coisa. – Falou com tanta seriedade que me arrepiei. – Dá para ver claramente que você está apaixonado por essa garota. Nunca te vi assim. Você nunca foi dado a partilhar seus problemas conosco, mas por ela... Por ela, você nos enfrenta. Por ela, você nos desafia. Por ela, você reivindica favores que jamais pediu para si. Seu comportamento me intriga, meu filho.
─ A mim também. – Papai disse da sua cadeira. – E não há aqui nenhum julgamento de valor, Kadu. Você está simplesmente diferente. Na minha opinião, se quer saber, melhor.
─ Embora sinta meu coração apertado sempre que os vejo juntos, reconheço que você amadureceu bastante do lado dela. – Minha mãe continuou. – Mas a questão não é essa, meu filho. Relacionamentos são assim mesmo. Bons ou ruins, quase sempre fazem crescer. – Meu pai assentiu às palavras da esposa. – A questão é: você a ama? De verdade?
Essa pergunta me fez reviver cada momento ao lado de Bruna até aquele instante. As risadas, as provocações, a intimidade da convivência, o desejo que nasceu disso, a determinação em vencer cada etapa do concurso, a frivolidade dos relacionamentos dela, a dor e a solidão que me davam vontade de guardá-la bem juntinho de mim, o medo que eu tinha de perder o controle. Dei a única resposta que minha razão permitia.
─ Não sei, mãe. Estou tentando descobrir.
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Por Onde Andei
Ficção AdolescenteNo quarto volume da série Nando, pela primeira vez, temos a visão simultânea dos dois protagonistas: Bruna e Carlos Eduardo. Ela, atriz desde menina, não está acostumada a confiar nas pessoas. Resolve os seus problemas a sua maneira, nem sempre acer...