Era um dia chuvoso, a névoa estava bastante espessa por entre o crepúsculo da pequena cidade, enxergar alguns palmos diante de seus rostos era uma tarefa difícil para os moradores. As duas garotas não se conheciam, sequer tinham se visto alguma vez, embora morassem na mesma rua. Elas andavam tranquilamente, cada uma imersa em seu próprio mundo, quando se depararam, ao mesmo tempo, uma com a outra e as duas com ele.
Ele, que era conhecido por toda a cidade. O problemático filho da apresentadora do programa mais famoso naquela região. A bela mulher tinha dois filhos; um adolescente adorável, e um adulto nem tão adorável assim. Lá estava ele, estirado no chão, coberto por diversos hematomas, tentando falhamente se levantar.
Elas é claro, não o deixaram para trás, e mesmo contra a sua vontade, passaram a cuidar dele. Viram por detrás da casca de garoto problemático, viram que por dentro ele sentia demais, tinha coisas ruins demais acumuladas, tinha traumas grandes demais e as únicas formas que arrumou para descontar isso foram as drogas e a rebeldia.
Elas foram amolecendo seu coração. Elas eram diferentes de tudo o que ele havia conhecido, e isso o despertava coisas que nem o próprio sabia explicar.
O garoto estava em seu quarto, de olhos fechados e cigarro nos lábios.
Elas odiavam quando ele fumava, e ele sabia disso, mas não podia evitar.Pensava com um leve sorriso, tudo de bom que havia vivido com elas. Desde noites de conversa e reflexão, com muitas lágrimas e decepções jogadas a tona, até manhãs leves, andando pelas ruas da cidade dentro de carrinhos de supermercado roubados - roubados não, pegados emprestado sem autorização -
Banhos de chuva, tardes dentro de um ateliê de pintura, com duas loucas querendo reproduzi-lo em um quadro.Mas a melhor parte, é claro, foram as passadas a dois. Uma das garotas era o vermelho. Era o calor, a alegria, a excitação, era a fantasia, era como um raio de sol que alimenta uma planta. Beija - la tinha gosto de esperança, de "vamos ser felizes para sempre".
A outra, era o azul. Era o frio, a melancolia, a impassibilidade, o choque súbito com o mundo real, a água gelada que alimenta a planta. Beija - la tinha gosto de incerteza, de "talvez dê certo".
Elas eram completamente diferentes. E isso o encantava. Eram o mais perfeito equilíbrio, e ele, em sua mente jovem e tola, achava o máximo que as duas pudessem ser suas. Mas ele não contava que os dois lados do equilíbrio perfeito tendem a ficar juntos.
A garota vermelha assistia à televisão, sem realmente prestar atenção no que passava. Pensava sobre ele. Sobre em como ele sofria. Sofria com o fato de não ter tido um pai presente, sofria com a depressão de sua mãe, sofria pelo irmão ser tão infeliz, tendo que assumir responsabilidades muitas vezes suas. E sofria com o seu vício.
Ele estava completamente quebrado. Seu corpo reagia as quantidades de droga, sua mente era uma prisão em que ele mesmo se colocara, mas não conseguia sair. Ele não era de se abrir. Mesmo depois de a amizade se tornar mais íntima. Apenas quando a situação estava crítica, ele se permitia transbordar, e descarregar dos ombros toda a sua dor.
Mesmo que ele estivesse completamente quebrado, ainda era uma obra-prima, por dentro e por fora. Ainda tinha a beleza que arrancava tantos suspiros. Ainda tinha um coração de ouro, que batia mais do que forte para quem sabia escutar.
E foi por isso, pela capacidade de ser tão humano, tão perfeito e tão imperfeito nas circunstâncias em que se encontrava, que a garota vermelha se apaixonou por ele.A garota azul estava deitada em sua cama, com alguns livros universitários, nos quais não conseguia se concentrar ao lado. Assim como a outra garota, pensava sobre ele. Pensava em até quando ele poderia estar em suas vidas. Ele era triste. Triste e decadente como o cinza que tingia os seus cabelos e saia de seus lábios em forma de fumaça, o cinza que apagava seus sonhos e esperanças. Até que ele as conheceu. Elas deram nuances de vermelho e azul ao seu cinza apagado, e lhe trouxeram a ilusão de uma vida longa e sem conflitos. Mas a garota sabia que aquilo estava longe de ser verdade.
Nenhum deles estava surpreso. Todos imensamente tristes, é claro, mas nenhum surpreso. Estava claro há muito tempo que isso um dia aconteceria. Sua mãe e seu irmão estavam abraçados em frente ao caixão. A mulher tinha apenas dois motivos para continuar viva: seus filhos. E agora um deles se foi. O garoto chorava, pensando em como sempre tratou o irmão mal, brigando com ele, o provocando, e o dizendo o quanto agia como um moleque, apesar de ter quase trinta anos. Ele o amava tanto, e nunca dissera isso. Nem nunca ia dizer.
A garota vermelha chorava calada num canto. Sabia que isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde, mas se recusava a acreditar. A garota azul havia acabado de chegar. Não tinha lágrimas nos olhos, mas, conhecendo-a como todos ali conheciam, sabiam que ela queria chorar até não restar uma gota de água em seu corpo. As duas garotas se olharam. Haviam brigado feio, cada qual acusando a outra de algo que apenas ele tinha culpa, descontando inseguranças e inimizades que sequer deveriam existir. Haviam ficado muito magoadas, e prometeram a si mesmas não se falarem mais. Mas tudo morreu ali. Naquele olhar. Nos pedidos silenciosos de desculpas. A recém chegada abriu os braços, e a outra jogou-se neles.
Elas voltavam para casa depois do enterro, caladas, pois não tinham o que falar, imersas em sua dor. Era um dia chuvoso, a névoa estava bastante espessa por entre o crepúsculo, enxergar alguns palmos diante de seus rostos era uma tarefa difícil. Exatamente como quando se conheceram. A chuva caía, e elas estavam sem guarda-chuva, mas isso não importava. Era bom. A água congelando seus corpos servia para lembra-las que ele havia morrido, elas não.
Elas eram o azul e o vermelho. Ele as juntou, e as fundiu em um céu lilás. O que ele não contava é que não era o único a trocar beijos por entre os becos do quarteirão. Sendo assim, seu erro foi achar que fazia parte desse céu.
Elas demoraram a superar. Fecharam o ateliê, pararam de ir ao supermercado, e passaram a odiar a chuva. Mas nenhuma tempestade é para sempre. Quando elas perceberam que não tinham culpa, que não adiantava ficar sofrendo, e que era mais produtivo guardar as lembranças boas que ele lhes proporcionou, o arco-íris apareceu.
Elas voltaram a passear pela cidade dentro de carrinhos de supermercado, voltaram a tomar banho de chuva feito crianças, e acabaram o quadro daquele que foi tão importante para si.
Ele havia ido embora.
Isso era triste.
Mas ele fez delas pessoas melhores.
E elas estavam juntas.
E era isso o que importava.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Colors《CSJ+AL》
FanfictionElas eram o azul e o vermelho. Ele as juntou, e as fundiu em um céu lilás. Seu erro foi achar que fazia parte desse céu. . . . . . . . . 《Crystal SooJung + Amber Liu》 Plágio é crime seu animal.