Pois não? Ah, finalmente uma visita! Aguarde um momento, não estava preparado para receber alguém assim tão cedo. Mentira! Brincadeira! Entre, entre.
O quê? Como assim, não vai entrar? Veio parar aqui sem saber? Não, não, não… Isso só pode ser uma brincadeira.
Solidão!
Espere um momento, aventureiro… estranho. Já vou dizer o que quer tanto saber.
Ô, Solidão! Desce aqui. Tem algo que você vai gostar de ver.
Ora, que estranho. O que será que ela está fazendo?
Sem querer ser rude ao insistir... Não gostaria mesmo de entrar? Se você não conhece essas bandas, não é seguro ficar aí fora. Nunca se sabe o que se pode encontrar aqui, no Desconhecimento.
Ah, fico feliz em ouvir isso. Vamos, vamos. Seja bem vindo. Siga-me.
Esta é a sala de visitas. Queira sentar-se por favor.
Solidão! Venha já aqui, temos visitas!
O que será que essa danada está fazendo?
Com sua licensa, ahm… se me permite… como devo chamar você? Ah, tudo bem, sem proximidades ainda. Entendi.
Deixe-me subir e procurar Solidão. Nenhum passado amargo se compara ao que ela prepara.
Cá estou. Minha querida filha estava ocupada demais justamente remoendo grãos de passado e acabou não me escutando anteriormente. Enfim, apresento-lhe a Solidão.
Solidão, você está encabulada? Não creio. Já não disse que isso não combina com você? Depois preciso ter uma conversinha com Vergonha. Por que ela influencia tantos os outros? Venha cá, venha cá, Soli. Não se acanhe.
Pois bem. Solidão, conheça nosso hósped… digo, nosso acidental visitante. Ele caiu em pleno Vau do Desconhecimento sem ter a menor idéia de como isso aconteceu, estou certo? Gostaria muito que você nos preparasse aquele passado amargo tão delicioso que só você sabe fazer.
Ah, se puder, já faça em boa quantidade para que Depressão possa tomar mais tarde, quando voltar de seu passeio com Fracasso.
Então, quer saber sobre este lugar. Não são muitas as pessoas vivas que caem aqui, queira saber. Em verdade, há muito não contemplamos uma outra face humana que não a minha.
Quer voltar? Ho ho ho! Ops, desculpe-me! Onde estão meus modos.
Quando cheguei aqui, também queria. Sim, era meu mais profundo desejo. E ainda é, diga-se de passagem.
Todavia, sinto em desapontar-lhe. Nesses incontáveis anos que tenho vivido aqui, nunca consegui chegar sequer a Lugar Nenhum.
Não entendeu? Bem, nem eu entenderia, se não fossem aquelas placas que podemos encontrar por toda extensão do Desconhecimento. “Lugar Nenhum, siga em frente”.
Há uma delas para cada direção possível.
De qualquer forma, depois de tantas vezes ter seguido em frente por tempo sem fim em tantas direções diferentes e nunca ter conseguido sair do Vau, estou começando a acreditar que seja impossível sair daqui à pé.
“Há uma forma de sair, papai.”
Oh. Esperança, há quanto tempo estás aí? Não seja mal educada, querida.
“O senhor nunca me vê, papai.”
Querida, não devia falar essas coisas na frente de visitas…
“É um humano perdido, né? Você.”
Esperança, vá brincar com outros, vá. Não perturbe nosso…
“Há uma forma de sair. Mas é quase impossível. É preciso desistir de sair, deixar de desejar sair daqui…”
Esperança, saia daqui você, agora! Não deixarei que o iluda assim como fez comigo!
Acha melhor ir embora... Bem, não o culpo. De fato, não é da natureza de fantasmas ser bons anfitriões. Por mais que tentemos, acabamos ficando muito ansiosos em presenciar as sensações que a vida é capaz de proporcionar.
Sim, eu disse que era humano. E, sim, ainda estou vivo. Acontece que, depois de tanto tempo, não faz diferença estar vivo ou morto dentro do Vau do Desconhecimento. Aqui, os aspectos de coisa viva, bem como suas sensações mais valiosas, perdem-se. Em breve você entenderá.
Deixe-me acompanhá-lo até a porta.
Percebe melhor a paisagem que vê agora? Acima de nossas cabeças, lá em cima, é sempre cinza. De vez em quando chove. A neblina não nos permite ver muito longe, mas se nos esforçarmos conseguimos até ver as placas para Lugar Nenhum. Consegue agora?
O frio? Eu não chamaria isso de frio. Talvez antes, mas não mais… Essa é a temperatura normal daqui.
Sobre os perigos de se estar aqui fora? Bem, é natural que haja fantasmas bons e ruins, entende? Os ruins são chamados assim porque gostam de atormentar aqueles que ainda podem sentir coisas boas. Como você.
Mudou de idéia? Quer voltar para dentro? Espere um pouco. Você teme?
Receio que não seja um boa idéia. Siga. Veja com seus próprios olhos o mundo monocromático com o qual será forçado a conviver pelo resto de seus dias. E aprenda a ser mais educado quando estiver na casa de alguém por aqui. Até mais ver.
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Na Escuridão do Desconhecimento: Fantasmas
FantasyHistórias precisam de sinopse. Contudo, uma visita à casa de um duvidoso anfitrião como eu não se faz necessária, certamente. Sinta-se à vontade para bater à minha porta quando quiser. Dos fantasmas que habitam o Vau do Desconhecimento, acredito que...