*Capitulo um*

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Um pensamento passa pela cabeça de Alexandre Barnes enquanto se encolhia na escuridão bolorenta e repleta de ruídos estranhos, o terror sufocava seu coração acelerado e a dor nas pernas latejavam em pausas monótonas. Ele tentava cobrir seus próprios ouvidos e afastar o som das cabeças humanas sendo partidas e estraçalhadas. Então veio o silêncio, interrompido apenas por pisadas grudentas de botas sobre o chão de cerâmica ensanguentado e uma enxurada de sussurros raivosos no vestíbulo. Alexandre tosse de novo. Ele não conseguia evitar. Ele luta contra essa maldita infecção pulmonar há dias, suas juntas doíam incessantemente.
A umidade da Geórgia fazia isso com ele, penetrava os ossos, consumia sua energia e dificultava a respiração, e para piorar os calafrios se faziam presentes.

Curvando-se com mais um rajada de tosses ritmadas típicas das pessoas que sofriam com asmas, ele mantia as mãos na boca para o som não sair tão estridente, porém ele sabia que o barulho incessante  chamava todos os tipos de ''mortos-vivos'' presentes ali para perto do cômodo onde ele se escondia.

O lugar era uma casa simples, onde habitava uma família que agora não passavam de devoradores de carne humana sem nenhum tipo de consciência. Alexandre estava acompanhado de três homens que encontrou no início do caos apocalíptico, Bobby, John e Morgan. Eles concordaram em deixar o rapaz do entorno de seus trinta anos fora da respectiva "limpa" do local. Ou seja, fora da matança de pessoas "meio vivas e meio mortas". O que fez Barnes agradecer por sua costumeira "doença".
Ele odiava matar, mesmo sabendo que eram "eles ou ele", a presa e o predador.

Filho de mãe solteira, e divorciado ele agora enfrentava o pior pesadelo de sua vida: O fim da raça humana. Alexandre sempre pensara que morreria de velhice ou cirrose. A bebida fazia parte de seus dias rotineiros, Whisky, Cerveja, Cachaça... bebidas das mais bravas.
Mas não, sua vida acabaria da forma mais inexplicável e até "irônica". Seus órgãos, peles, tripas, e músculos seriam devorados por seus próprios amigos e vizinhos. Por sua própria raça.

Os Jornais que agora não existiam mais, no início de tudo alertaram que esse pesadelo foi acometido por um vírus transmitido pelo ar. Um vírus que ataca o sistema nervoso, levando grande parte do cérebro a óbito, porem uma pequena parte da movimentação não eram atingidas, o que explica o porquê dos mortos poderem continuar caminhando pela terra.

Alexandre respirou fundo e espiou por uma fresta do armário onde se escondia, e viu alguns vultos passando e sendo atingidos por um Bobby raivoso e irritado.

—- Ei Mariquinha já pode sair do Armário! Está tudo limpo - com um pouco de dificuldade por estar a horas sem movimentar as pernas ele pisou cambaleante no chão e saiu no móvel com cheiro de mofo.

Eles seguiram um caminho sangrento e cheio de tripas por todos os lados. O chão estava escorregadio e grudento. Alexandre pode sentir uma pequena leva de líquido amargo subir por sua garganta mas ele por muito pouco conseguiu segurar o vômito.

—- Foram muitos? - perguntou entre tossidas ríspidas e rápidas.

—- Aproximadamente uns oito filhos da mãe! - Morgan respondeu enquanto olhava sua faca karambit prata - Desgraçados sujaram toda a minha faca!

—- Para de ser chorão! - exclamou Bobby se sentando no sofá empoeirado. - Como está se sentindo Mariquinha?

—- Do mesmo jeito... preciso de remédios... antibióticos e xaropes - outra tosse veio com força - Vou ver se encontro alguns medicamentos aqui pela casa.

Alexandre caminhou até o primeiro cômodo do corredor. Era um quarto de criança, haviam muitos brinquedos, livros infantis, uma cama confortável e um relógio engraçado na cômoda ao lado da cama. Ele ficou olhando o ambiente e começou a se lembrar de seu filho, que não sabia se havia conseguido sobreviver. Lágrimas brotaram de seus olhos castanhos escuros, e escorregaram até o piso sujo.
O homem fechou a porta com cuidado e foi até o próximo cômodo que era um banheiro pequeno. Abriu as gavetas, e encontrou um tubinho com comprimidos. Era algum remédio para descongestionamento pulmonar, o que serviria muito. Enfiando o objeto no bolso do moletom continuou a olhar mais algumas gavetas porém não encontrou nada que fosse servir.

O ambiente em seguida era um quarto de casal, haviam porta- retratos em todos os lugares. Pessoas sorrindo para a câmera e algumas fotos tiradas de surpresa. A cama estava bagunçada e o guarda roupa permanecia aberto. Alexandre se agachou com cuidado e muita dificuldade e olhou em baixo da cama onde havia uma caixa grande e preta. Ele a puxou até chegar na frente da móvel e se sentou ao chão abrindo a mesma. Dentro continha mais algumas fotografias, umas anotações em papéis, contas pagas, e embaixo de tudo encontrou uma Colt prata. A mesma estava carregada e intacta. O homem passou a mão pela bela armação da arma e se levantou segurando-a.

Na sala John, Bobby e Morgan deitavam tomando algumas bebidas alcoólicas que encontraram na cozinha do local. Alexandre se sentiu ainda pior por estar doente e não poder misturar a bebida com o remédio que deveria tomar.

—- Tem mais bebidas no estoque se quiser! - John anunciou erguendo sua garrafa com uma das mãos e piscando com um dos olhos enquanto se esticava no sofá.

—- Infelizmente não posso beber... eu encontrei um medicamento e vou começar a tocar pra ver se melhoro.

Os três deram de ombros e continuaram a ingerir suas doses merecidas de álcool.

Engolindo o medicamento com a água que ainda descia pelas torneiras ele decidiu se juntar aos colegas de sobrevivência na sala.
Eles contavam histórias de suas infâncias e se gabavam pelas mulheres que conseguir ter relações sexuais. Também contavam sobre suas famílias que não sabiam aonde estavam, ou que alguns perderam durante o caminho até ali.

—- Minha mãe fazia uma torta maravilhosa no Natal - começou Morgan - todos se sentavam na enorme mesa da sala e começavam a criar assuntos monótonos do dia-a-dia... aí como eu amava aquela mulher... todas as noites antes de dormir ela me contava uma história e cantava uma canção para me acalmar... quando ela morreu... a família todas se separou... e aí eu fui viver com meu pai que bebia descontroladamente e me batia o tempo todo... foi um inferno!

—- Eu não tive um pai muito presente... cresci com a minha mãe... e com meu Irmão que já faleceu a alguns anos... sorte a dele!

Eles continuaram a contar suas histórias felizes e tristes até que a noite começou a surgir.
Cansados os quatro colocaram uma cadeira para segurar a maçaneta da porta e então adormeceram em um sono pesado e preocupado. A dias eles não dormiam e agora podiam descansar por um pequeno período de horas que passariam rapidamente por cada um. Porém pesadelos atormentaram a noite de Alexandre. E sua febre trouxe calafrios que percorriam o corpo todo do homem, ele se encolheu como uma criança indefesa e com medo.

Assustado o homem se levantou em um pulo enquanto gotas de suor percorriam seu rosto pálido como mármore. Unhas raspavam na porta emperrada pela cadeira na maçaneta, o ronco pesado de Bobby deve ter chamado a atenção dos mortos- vivos para o local onde estavam alojados. Ele se levantou com os olhos um pouco embaçados, e foi até a cozinha tomar um pouco de água da torneira levemente engordurada. Bebendo mais um comprimido do descongestionante pulmonar que também servia de antitérmico e analgésico ele decidiu tentar dormir novamente. Porém o pesadelo anterior continuava a rondar sua mente perturbada, no sonho ruim Alexandre era devorado lentamente pelos "mortos- vivos" mas ele não morria de jeito nenhum. Ele podia sentir seu corpo ser rasgado, ele via aqueles "ex-seres-vivos" o comendo e mastigando. Pelos cantos dos olhos apavorados ele enxergava vultos de sua família o olhando com reprovação.

O sono o engoliu novamente mas dessa vez o pesadelo que parecia mais um delírio febril, não o atormentou durante as horas que ainda restavam de descanso. Ele pode fechar os olhos e simplesmente dormir.

A aniquilação da sociedade - O começo do fim - Livro I Onde histórias criam vida. Descubra agora