Lily não sabia muito sobre a morte. Ouvia falar dela desde pequena, mas por ser muito nova, não compreendia bem o que aquilo significava. Não assimilava verdadeiramente o que era morrer. Não entendia as feições angustiadas e muito menos o clima pesado o qual provocava-lhe tenebrosos arrepios e sentia pairando no ar, como uma nuvem cinzenta que antecede uma tempestade.
Os anos passaram-se, mas a morte continuava a rodear a tudo e a todos, ceifando a vida de um ou outro e deixando os que permaneciam no mundo terreno desolados. Os anos passaram-se, mas Lily continuou a não compreender por completo o que era morrer.
Próximo aos onze anos de idade, ela descobriu-se bruxa e compreendeu o porquê de realizar algumas ações involuntárias e incomuns. Próximo aos onze anos, Lily ainda tinha a morte rodeando-a, mas ela ainda não a compreendia.
Quando retornava para casa durante as férias de verão, a Evans ouvia sua irmã mais velha proferir para ela palavras desagradáveis e que a feriam dolorosa e profundamente, mas a mais pungente de todas havia sido durante o recesso de verão de 1974, quando Petunia disse-lhe, enquanto balançava a cabeça levemente e mirava-a com uma expressão que mesclava-se entre nojo e decepção, “Você não é minha irmã. Você morreu pra mim”.
Então isso é morrer, Lily chegou a pensar horas depois em meio às lágrimas que pareciam brasa quente tocando sua pele e aos soluços que escapavam de seus lábios de maneira involuntária com o rosto mergulhado entre os travesseiros. Ela podia escutar seus pais brigaram sonoramente com sua irmã mais velha pelo o que a mesma havia lhe dito mesmo do primeiro andar, onde se encontrava seu quarto. Ela podia sentir dias depois o clima pesado que tinha se instaurada depois das palavras ferinas da irmã. O ar melancólico e doloroso quase palpável era o mesmo que a Evans mais nova sentia quando alguém deixava o mundo terreno.
Então, eu realmente morri para minha irmã, Lily presumiu ao dar as costas à família para embarcar no trem que a levaria de volta a Hogwarts e ao não ouvir as despedidas de Petunia. Aquilo doía, e doía de tal forma, que não houve um mísero instante em que ela não sentiu seu coração apertar-se cada vez mais que distanciava-se da estação de trem e seus olhos arderem como se estivessem em chamas.
A dor da perda era sufocante — não importando o quão longe da multidão estivesse ou o quão fundo respirasse, ela era sempre insuportável. Seus pulmões se contraíam e sua respiração tornava-se difícil, tornando tudo apenas questão tempo para a Evans deixar suas emoções fluírem livremente e a mesma sentir-se capaz de explodir.
No ano seguinte, quando Lily ainda buscava superar as palavras duras, quase desumanas, da irmã, ela recebeu outra facada pelas costas. Seu antigo amigo Snape, alguém no qual ela confiou cegamente por algum tempo — tempo demais, talvez — chamou-a de um dos nomes mais intratáveis para quem era um muggle-born como ela — mudblood.
Naquela ocasião marcante, porém, Evans não morreu para seu amigo. Ele morreu para ela. O fato dela excluir alguém de sua vida não tornou tudo menos doloroso, no entanto. Era revoltante, era inesquecível. Não havia um único dia desde aquela tarde fatídica próxima ao lago, em que ela não se recordasse de tal vocábulo proferido com tamanho nojo e repulsão por seu antigo amigo.
Os meses após o ocorrido se passaram, mas a dor persistia incrustada em seu peito e a morte continuava a rondá-la, cada vez mais perto.
Em 1977, quando a tensão da guerra era quase palpável e o ar pesado pairava sobre todos, ameaçando sufocar a maioria, uma coruja parda cortou o céu noturno e atravessou a janela do Communal Hall da Gryffindor, pousando próxima a Lily, em seguida, e fazendo os sentidos da garota imediatamente entraram em estado de alerta.
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Through The Veil
FanfictionLily Evans não compreendia completamente a morte e o que sua chegada significava. Bom, não compreendia até deparar-se com ela. [one-shot] • [lily evans!focus]