Capítulo único

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Aquela podia ser uma outra manhã como outra qualquer. Se ao menos pudesse ser definida como manhã de fato, tendo em vista que no espaço, tudo parecia ser uma eterna noite, a não ser quando passavam ao lado de uma estrela, cuja luz intensa e radiação compensavam mil manhãs. Mas aquela era sim, o início de um novo dia para a tripulação de Nautilius, contudo, para Edgan Montenegro, não era um dia qualquer. O único humano da nave cantarolava alegre, enquanto se ocupava de fazer seu café da manhã, tão perdido em seu mundo que ignorou quando uma das portas para o recinto se abriu automaticamente e uma grande figura adentrou.

— O que está fazendo? — Inqueriu Proteus, ele mal cabia nas cadeiras da mesa circular no centro do refeitório. Seu rosto era uma perfeita mescla de traços felinos e humanoides. A maior parte do seu corpo era recoberto por pelos, uma vez Edgan o havia comparado ao tigre-de-bengala, ao que parece ser uma espécie de felino já extinto na Terra. O seu rabo laranja listrado balançava para os lados, suas orelhas com pontas enegrecidas estavam levantadas e atentas aos sons que o humano fazia. Para Proteus, Edgan sempre foi um mistério, aquela pequena e aparente frágil raça tinha, aos poucos, conquistado o seu direito na União Intergaláctica, logo, muitos humanos agora começaram a ocupar cargos em diversos postos do universo. Nautilius era uma nave de mineração e transporte, supostamente necessitava de trabalhadores fortes para o trabalho pesado, mesmo que grande parte do real trabalho seja feita por robôs, mas a maquinaria em si exigia força nos músculos para ser manejada. E ali estava o senhor Montenegro, um humano esguio, cujos macacões de couro da empresa lhe eram tão folgados que o fazia parecer uma criança vestindo as roupas do pai. Sua função ali? Engenheiro de sistemas. O trabalho mais duro que Edgan já tinha feito fora carregar chips e placas-mãe de um lado para o outro. Em resumo, o humano não parecia se integrar bem a tripulação robusta e bruta de Nautilius.

— Oh? Proteus? Nem vi que estava aí! — Disse o garoto sorridente. As orelhas felinas de Proteus caíram para trás, em sinal de desconforto, sorrir para o seu povo era sinal de ameaça, se mostrava suas presas para o outro para iniciar uma briga. Contudo, tinha uma leve impressão que Edgan não tinha intenção de confrontá-lo, na verdade, o humano parecia repetir muito aquele gesto de mostrar seus dentes desprovidos de presas, principalmente quando estava alegre.

— Ops! — Montenegro cobriu a boca ainda risonha — Esqueço que não gosta quando sorrio.

— Não é como se eu não gostasse... — O homem-tigre coçou o queixo o qual apresentava um cavanhaque branco, gesto que fazia sempre que estava confuso ou embaraçado — Enfim, eu te perguntei o que estava fazendo...

— Cantando, vai me dizer que os Tigherianos não sabem o que é cantar?

Proteus emitiu um baixo rosnado.

— Lógico que sabemos o que é cantar. Só não entendo por que está cantando hoje!

Edgan sorriu novamente, na verdade não deixou de sorrir desde que iniciara aquela conversa.

— Porque hoje, no calendário terráqueo, seria 24 de dezembro! —Disse isso com um entusiasmo como se falasse a coisa mais óbvia do mundo, algo que, entretanto, resultou ainda mais confuso para Proteus.

— E esse dia seria especial?

O sorriso do humano minguou, começou a massagear o seu pescoço, seus cabelos encaracolados caíam sobre sua fronte ocultando parcialmente o seu rosto.

— Às vezes esqueço que vocês não sabem muito sobre a cultura da Terra... —Murmurou.

— Lógico que sabemos sobre a sua cultura! — Outro ser entrou na conversa, Proteus sentiu seus pelos eriçarem, nem tinha notado a presença de Shyller, mas era compreensível, tendo em vista que aquela raça alienígena reptiliana era conhecida por ser sorrateira. O novo membro se sentou ao lado homem-tigre. Suas escamas ocupavam, principalmente, ao redor dos seus olhos de íris púrpura, o resto de sua pele era uma membrana cartilaginosa que lhe dava uma aparência meio que úmida e escorregadia. Seus cabelos avermelhados eram amarrados em firme rabo de cavalo.

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