5 - Caminhos Verdejantes

10 2 0
                                    

- Você percebeu, não é? - Jane continuava andando à frente com seus passos largos, sem olhar para trás enquanto falava.

- Eu acho que, de alguma forma, sempre soube, mas não queria enxergar - Um respondeu, um pouco assustado mas também extremamente chateado.

O brilho azul dos cabelos de Jane se tornou ofuscado na escuridão que os cercavam e crescia cada vez mais. Seus olhos, continuavam voltados ao chão, variando de tempos em tempos para os arredores, atentos ao local, esperando o lugar perfeito para se esconderem, ou qualquer sinal de perigo inesperado.

- Será que você poderia me contar? - Um perguntou, envergonhado

- O que? - Disse Jane, olhando para a frente, assustada

- Ah, você sabe, como isso aconteceu ou...

- Não é isso! Olhe! - Jane interrompeu

À frente deles, uma forte luz de cor verde emanava, dando forma à criatura, parada em meio ao caminho, fitando-os silenciosamente. Era um leão. Fez um aceno para trás com sua cabeça e sua juba cintilou no ar, se desmanchando como labaredas.

- Acho que ele quer que o sigamos - Jane teorizou

Então, depressa, a criatura virou-se. A forma imponente de um leão deu lugar à forma de um veloz cervo, que começou a percorrer o caminho da estrada de terra.

Ao mesmo tempo, do outro lado da pista e do lado de fora da floresta, Agnis e Mary chegaram ao posto de combustível, atrás dele, o mini-mercado. A mulher aproveitou a oportunidade para abastecer seu carro, depois, percebeu que a porta da loja estava semi-aberta. Andou cautelosamente pela porta, empurrando-a vagarosamente.

"Eles devem ser muito ricos, pra ter um mini-mercado inteiro ao invés de uma loja de conveniência" pensou.
- Não se preocupe, Mary, vai dar tudo certo - disse em voz alta para a garota em seu colo.

Deu mais alguns passos até o balcão, olhou para os lados à procura de algum funcionário e teve certeza do que estava imaginando: o lugar estava completamente vazio.

Em cima do balcão, encontrou um jornal do dia anterior, aberto na segunda página. Sua ponta inferior estava molhada de um líquido vermelho, mas não foi isto que chamou a atenção da mulher, pelo menos não de imediato. Na página, uma foto de seu próprio rosto estava estampada. No topo, a manchete: "Mulher sequestra sobreviventes de incêndio". Surpresa, continuou a ler, a notícia estava recheada de meias-verdades, além de uma descrição de seu rosto e uma promessa de recompensa para quem a encontrasse.

"Como isso é possível? Eles estão agindo muito rápido! Uma recompensa pela minha cabeça? Sério? Parece até que estou no velho oeste..." Fechando o jornal, viu em sua capa, outra manchete, acompanhada da foto borrada de uma criança em frente a uma casa incendiada:

"Anti-cristo encontrado em cidade pacata? Pais incinerados junto de sua casa"

Agnis levou uma de suas mãos à testa, assustada demais com a notícia, que dizia:

"Na noite passada, por volta das oito horas, um acontecimento grave chamou atenção de toda a cidade de Lucis, interior de Nova Escarlate. A casa de uma família entrou em combustão, por motivos até então inexplicáveis. Os bombeiros invadiram o local para fazer o resgate e constataram que os proprietários Alicia, de 31 anos e Peter, de 33, não haviam resistido, porém ambas as crianças, filhas do casal, cujos nomes não serão divulgados, saíram intactas e sem qualquer ajuda dos oficiais que estavam no local. Dado este fato incomum, alguns fanáticos religiosos começaram a chamar a criança mais velha de "anti-cristo", culpando-a pelos acontecimentos, baseando-se em semelhanças com lendas locais, que dizem que "aquele trará o fim, renasce das chamas". O paradeiro de ambas as crianças agora é desconhecido"

Agnis se preocupou ao imaginar tudo que poderia ter sido dito no jornal do dia, se nesse já haviam tantos detalhes do acontecimento.

- Bom, pelo menos nosso paradeiro ainda é desconhecido - Disse Agnis, logo depois, notou finalmente a mancha vermelha no jornal - Sangue?

- Você pode ficar um pouco mais tranquila, por enquanto, minha querida.

Uma voz doce e suave saiu de trás da porta, aberta para dentro. Dedos finos a empurraram para revelar a imagem de uma velha senhora. Seus olhos eram tão cerrados que quase pareciam fechados. Seus cabelos brancos estavam enrolados, presos no topo de sua cabeça. Usava um vestido verde escuro e uma bengala de madeira na mão direita. Em todo seu corpo, várias borboletas, de diferentes cores, pousavam gentilmente, abrindo e fechando suas asas. Ao lado direito de sua cintura, a mesma mancha vermelha do jornal se fazia presente.

- Quem é você? É a dona deste local? Vai tentar me machucar? Estava aí o tempo todo? - a jovem mulher questionou, assustada.

- Os que querem machucá-las já passaram por aqui e seguiram pelo caminho da pista, não vão encontrá-los, pelo menos não tão em breve. Como disse que não vi ninguém como vocês vindo para cá, eles tentaram me matar, mesmo eu tendo dito a verdade. Você devia ter ido com eles, os suprimentos vão aparecer naturalmente se você tiver fé. - Disse a senhora, andando em direção a Agnis.

- Quem é você?

- Ah, querida... não percebe que você é uma das pessoas de coração puro que dizem ser capaz de me ver?

- Você é a Natureza?

- Ihihihi - riu a senhora, batendo sua bengala no chão - quase, querida. Sou a mãe dela!

Na floresta, Um e Jane continuavam perseguindo a criatura verdejante, que agora em forma de águia, voava desviando dos galhos de árvore e guiando-os por um caminho.

- Será que ainda falta muito? - Questionou Um, ofegante.

- Como é que vamos saber? - Jane respondeu, logo depois dando de cara com outra luz, dessa vez natural: era o luar.

Jane e Um levaram suas mãos ao joelho, parando de correr para respirar um pouco naquela clareira que encontraram.

- Não acha isso suspeito? - Jane começou a olhar ao redor

- O que poderia haver?

- Não sei, seguimos uma criatura verde até um lugar calmo e pacífico assim, daí ela some. Sei que as coisas têm sido convenientes demais, mas não acho que a sorte agiria tanto assim ao nosso lado, e...

- Shhhhh! - Um colocou o indicador direito em frente à sua boca e com o outro, apontou um arbusto que estava se mexendo.

Uma criança mascarada se escondia ali, mesmo tremendo, apontava uma flecha em sua direção.

- Essa não! - Jane deixou escapar

A criança disparou, mas ao mesmo tempo, a criatura verde retornou imediatamente de cima das crianças, se chocando contra elas, desintegrando-se e fazendo sua luz emanar por toda a clareira. A flecha, que vinha à toda velocidade, simplesmente mudou sua rota, cravando-se no chão. O garoto mascarado retirou sua máscara e ajoelhou-se. De todos os lados da clareira, várias crianças mascaradas apareceram e seguiram os passos do primeiro, começando a prostar-se para Um e Jane.

- O que diabos aconteceu? - Jane questionou.

Um - A EscolhaOnde histórias criam vida. Descubra agora