Capítulo 127

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William

Ao olhar o desfribilador ao lado eu sabia que não aceitava .
Ao menos não sem tentar uma última vez que seu coração batesse .
Tomei eu mesmo o aparelho em minhas mãos e o friccionei uns segundos .
Juro que foram os segundos mais difíceis que eu já vivi em toda medicina .
Nem o primeiro parto , nem a primeira cirurgia , o pior momento que eu vivi foi a olhando fixamente sem vida numa maca enquanto tentava ao menos uma vez .
- Já tentamos outras vezes - Escutei as minhas costas .
Mas ninguém tentou como eu tentei .
Ninguém pediu como eu pedi .
Ninguém amava tanto como eu amei .
Em toda terra .
Em qualquer lugar do planeta ninguém amou alguém com tanta força como eu a amava ainda mais agora então eu não mais pedia .
Eu suplicava pela  vida que era completamente dependente da sua .
Naqueles segundos entendi que a que senti foi sua dor e que ela lá sem fazer bater o coração era o prelúdio do meu e nem era só por meu filho que não nasceu .
- Nosso bebê Bela . Eu rogo ... Se existe alguém que me vê agora , que vê a mim e a essa mulher não permita - Não permita que eu não o pegue nos braços , que eu não veja ele chorar e tenha que ninar em meus braços , que eu não veja seus primeiros passos e que me chame de pai .
Se existe um único que seja , o responsável por escrever cada traço desse destino meu , não permita que perca de novo um amor .
O amor da minha vida ...
A mulher que eu atropelei mas que me atropelou inteiro e revirou todo meu ser .
Não é justo que ela entre na minha vida , me faça dela e vá assim .
Não é ! Alguém me entenda ,
- Por favor - E então com uma última súplica eu toquei o desfribilador no seu corpo .
E ela reagiu .
Pouco mas se moveu e vi o ar saindo por entre a máscara que havia recolocado depois de beija - la .
- Um estetoscópio ! Agora - Gritei . Não podia ser ilusão . Eu tinha que saber . Um médico a minhas costas me entregou um e coloquei sobre seu peito .
Batia muito fraco mas batia ainda .
Chorei mais forte numa felicidade que não cabia em mim .
- Bom dia meu amor - Não era dia mas era o primeiro que gostaria quando Bela tinha voltado para mim ...

***

- Ela ainda não está fora de perigo - Disse minha mãe assim que saí dos corredores e encontrei todos os convidados do casamento , exceto Nacho que possivelmente estava com Malu , na sala de espera .
- Eu sei que não . Mas eu presenciei ela voltar e não preciso mais chorar mãe . Ela voltou e vai ficar - Falei limpando os olhos aos poucos vendo por onde ela entrou .
- E tenho que estar novamente para isso - E contrariando o correto que deveria seria ficar e esperar por profissionais salvarem ela e meu bebê eu decidi que eu teria de faze - lo .
Eu e somente eu faria tudo por essa mulher .
Fui me higienizar e me preparei todo para o procedimento , entrando  depois de preparado na sala sem ser convidado .
- Você não pode - Me disse um dos meus empregados .
Eu sei que não deveria mas não poderia me conter ,
- É a vida do meu filho e da minha mulher e se minha família é o que eu tenho de mais precioso eu simplesmente não vou esperar . Quando ninguém acreditou que ela voltaria eu acreditei . Eu roguei. Se necessário eu o farei de novo e só eu o farei com todo fervor porque ver a vida ir de seu corpo é ver ir do meu também . Ela não é minha metade doutor . É meu eu mais inteiro e queira você ou não eu lutarei por mim ...

Maite

- Morri ? - Não era tola e sabia que sim mas de qualquer maneira não ficava fácil aceitar .
- Sim mas o equívoco não se repetirá . Esse homem já sofreu tanto e não vai voltar a sofrer . Aquela porta Maite nunca foi as portas do descanso eterno . Se fosse para você estar aqui para sempre não era à mim que viria . Você vai voltar por ele - Me disse e antes que eu melhor entendesse a porta que ela segurou uma vez se abriu e a sala escura voltou a clarear de uma vez com maior luz sobre o anjo loiro ao qual eu deferia lágrimas de felicidade .
Eu ia voltar para ele .
Eu morri como ela mas tive a oportunidade que ela não teve , de voltar ao meu amor e entendo o porque disso .
Entendo que foi para ama - lo ainda mais .
- Diga que eu também o amei demais e não queria ir de verdade mas que sou feliz aqui com meu filho - Disse acariciando o bebê rosado enquanto desaparecia num foco de luz branco mas não vi quando desapareceu completamente porque eu entrei na outra porta e tudo voltou a estar escuro .
Temi que tivesse sido enganada mas então senti uma estranha sensação de algo se chocando contra meu corpo e respirei .
Descobri mesmo sem ser capaz de acordar que estaria aqui e não deixaria de estar jamais .
Mais de uma vez mesmo na dita inconsciência escutei , ou achei que escutei , diálogos e barulhos não conseguia distinguir nada .
Talvez duas ou três palavras naquele escuro .
Mas ao ouvir a voz mais incomfundivel de tudo entender .
- Eu vou salvar vocês ...

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Explicando :

EQM ou Experiência de quase morte é uma forma de consciência transcendental ou um estado alternativo de consciência que acomete o indivíduo que se encontra em um estado fisiológico extremo. O coração pode parar, e a respiração também, mas, mesmo assim, do ponto de vista desse indivíduo, ele entra num estado muito profundo de consciência transcendental.

O que revela quem voltou desse estado ?

Elas deixam o corpo físico, passam por um túnel e entram em uma dimensão sobre a qual todas — não importa quão articuladas e educadas sejam — dizem que simplesmente não existem palavras para descrever a sensação [do que sucede nela], pois isso está além do que pode ser expresso pela linguagem. Entram em uma dimensão que é muito mais real que a física, na qual estamos agora; percebem uma luz que traz muito conforto, alegria e amor; e encontram parentes ou amigos que morreram e que parecem estar lá para recebê-las, saudá-las e ajudá-las durante a transição. [Ao retornarem,] Contam que, em um instante, veem tudo que fizeram em um tipo de holograma e recapitulam cada ato de sua vida, não do ponto de vista que tinham quando aquela ação ocorreu. Em vez disso, elas se identificam empaticamente com quem interagiram naquele momento. Assim, caso se vejam realizando algo maldoso a alguém, sentem tristeza. Quando é algo gentil, vivenciam os bons sentimentos do que fizeram. Então, voltam dizendo que não têm mais medo da morte, porque a experiência que tiveram as convenceu de que o que chamamos de morte é uma transição para outra realidade, e que o importante nesta vida é aprender a amar .

Fonte : Revista BOA VONTADE, número 242, edição de dezembro de 2016.

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