Isabela conhecia um ditado popular que dizia, Nada é tão ruim que não possa piorar. Ela odiava este ditado. Pois, devido a sua vasta experiência sabia que ele, em muitos momentos, poderia ser verdadeiro, como aquele.
Alguma brega tocava na rádio e ressoava pela cabine do motorista passando pelo vidro traseiro e chegando até a traseira, aonde ela estava sentada sob alguns pneus velhos. Argh, ela odiava pneus atualmente.
-É como uma grande aventura. - Tiago falou lhe entregando a garrafa com água, Isabela aceitou apenas para descobrir que não era água, mas sim o chá ridículo de sua irmã.
-Pelo amor de Jesus, muda essa música, já estou ficando de saco cheio desse cantor! - grunhiu, fazendo sua mãe, que estava na cabine com Henrique no carro, lhe lança-seu um olhar irritado.
O motorista/mecânico, seu Chagas, cordialmente mudou a rádio, ele não falava muito, mas era prestativo e atencioso. Era ele que iria concertar o carro para eles, mas só faria isso no dia seguinte, então sua mãe decidiu que seria mais fácil pegar um ônibus para Vila Boa e depois ligar para alguém pedindo uma carona até a casa dos pais dela.
Não era exatamente um plano complicado, bem, não seria se não fosse pelo gosto musical ridículo de Seu Chagas.
-Sei que preferia estar em casa uma hora dessas, princesa, mas veja bem, sua mãe está um tanto ansiosa por isso. - Tiago falou puxando isabela para o seu colo, ela deitou a cabeça no ombro do pai. - Vem aqui Fernanda. - ele pediu estendendo a mão para a mais velha. - Talvez no próximo ano vocês não queriam mais passar o natal com seus velhos aqui. Então tenho que aproveitar o agora.
Fernanda riu.
-Papai, por favor. Vamos estar aqui no ano que vem e o ano depois deste também.
-Não se preocupe velho, estaremos aqui pelo resto de sua vida. Não tenho pretensão de sair de casa tão cedo. - Isabela assegurou, com um sorriso no rosto. Tiago abraçou as duas filhas. O momento pai e filhas foi interrompido pelo barulho de dedos contra o vidro, Paula os encarava com os olhos brilhantes de felicidade.
-O que é Maria? - Tiago indagou, Isabela sabia que embora o nome de sua mãe não tivesse Maria, seu pai usava aquele apelido de forma carinhosa.
-Está tocando a nossa música. - ela disse e Isabela ficou em silêncio para ouvir a música que tocava na rádio.
Não me falta tapete
Só falta o seu pé descalço pra pisar
-Arnaldo Antunes. - Tiago murmurou antes de cantar em alto e bom som junto Paula. - Não me falta cama. Só falta você deitar.
Isabela riu junto com Fernanda, aquela música havia marcado a vida de seus pais, fora a primeira música que eles dançaram em seu casamento, a primeira de muitas. Ela havia crescido ouvindo as estórias fantasiosas sobre o falho primeiro casamento de seus pais, sobre todos os problemas que surgiram ao longo do único dia que marcou a vida deles para sempre.
-A casa é sua. Por que não chega agora? - todos cantaram juntos e Isabela nunca se sentiu tão feliz quanto naquele momento, na traseira de uma caminhonete velha cantando em meio a gritos com sua família junta e um desconhecido. - Nem o prego aguenta mais. O peso desse relógio.
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100 batimentos por minuto
Short Story"Vamo lá, e seja o que eu quiser E o futuro só pertence a mim"