Capítulo 28 - Isabel

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Logo que ouço o som do motor do carro de Marcelo eu saio da banheira, me visto e vou até o cômodo de ferramentas, pego uma cavadeira e uma pá, depois vou até o jardim perto da piscina e faço a cova. Corro até o carro e pego o corpo daquela que eu pensei ser uma bastarda e jogo lá dentro. "O que está feito, está feito", penso. Depois volto no carro de novo e pego as duas mudas de rosa que comprei e planto sobre Emily. Em breve a menina florescerá em amarelo e vermelho. Não foi difícil cavar, a chuva colaborou bem com meu trabalho. Volto correndo para dentro de casa e entro debaixo do chuveiro. Quando a água bate em minhas feridas eu sinto arder, mas é uma dor suportável. Insuportável será a dor de Iolanda e de Marcelo quando descobrirem o cadáver de Emily. Se é que algum dia ele será descoberto.

Você pode até achar que eu fui longe demais, mas se estivesse no meu lugar tenho certeza que faria o mesmo. O único problema agora é manter este segredo, pois se Marcelo descobrir o que eu fiz com certeza vai me deixar. Não vai entender que fiz por amor a ele.

Saio da banheira, passo remédio onde me arranhei e me visto depois. Estou em apuros e não tenho a quem recorrer. Logo a polícia vai bater na minha porta. Aquela gorda ou aquela menina sardenta vai me identificar e aí estarei perdida. Acabarei longe de Marcelo e atrás das grades. Puta merda! Isso não pode acontecer!

Eu tenho que ter um bom álibi. Eu tenho que ser bem convincente com Marcelo. Eu não posso ter feito tudo isso e terminar perdendo-o. Isso será inadmissível. Eu só sacrifiquei aquela criança por amor a Marcelo. Não é justo que ele me abandone depois disso. Eu arrisquei minha liberdade por amor a ele. Será que ele não vai perceber isso se um dia descobrir? Será que não vai entender como sou louca por ele? Se não entender será um tremendo gesto de ingratidão.

Desço e fico apreensiva esperando alguém ligar. Marcelo. A polícia. Sei lá. Sei que o celular vai tocar daqui a pouco. Vai tocar. Vai tocar. Mas eu não sei se vou atender.

As horas passam tão devagar que fico nervosa. Quero Marcelo de volta. Quero tê-lo dentro de mim de novo. Estou tão louca de amor por ele que vou me atirar em seus braços assim que ele entrar por aquela porta. Vou fazê-lo feliz, vou realizar todas as fantasias que ele quiser.

Vou para a varanda da frente, mas não há sinal de Marcelo. O celular continua silencioso. Isso está me irritando. Ninguém me coloca a par do que está acontecendo.

Como vou saber se já não descobriram que fui eu? Será que Marcelo terá coragem de se vingar? Ele será capaz de matar o grande amor de sua vida? Ele nem convivia tanto com ela... Será que tenho menos valor do que ela pra ele? Afinal eu sou a esposa dele, ela era apenas uma sobrinha, nunca fez nada por ele. Só lhe deu trabalho, com certeza... Eu não. Eu dei tudo o que ele tem. É claro que ele tem que levar isso em conta. Se não fosse por mim, ele não seria o que é hoje.

Marcelo é um homem grato. Sei que é. Mesmo que ele descubra alguma coisa, ele não me fará mal algum porque é grato pela vida boa que eu lhe dei. Estou me preocupando à toa.

Volto para dentro e depois vou até o atelier. Pego uma tela e começo a pintar. Quero aliviar a tensão que estou sentindo. Mergulho o pincel na tinta preta e começo a pintura. Depois misturo amarelo com vermelho; azul com vermelho, começo a gostar do que vai surgindo na tela. Posso ver nitidamente minha alma nela, uma confusão de cores, mas eu coloco bem no meio da tela uma faixa com tinta branca. É o caminho da purificação. Vou passar por ele e ser feliz com Marcelo para sempre.

A chuva volta a cair mais tarde, já beirando meia noite. Relâmpagos clareiam a Ibituruna. Eu me encolho no sofá e fico esperando meu amor chegar.

Mar de rosas e de espinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora