Capítulo 29 - Marcelo

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A minha mãe conta que tinha 17 anos quando se envolveu com o filho da patroa da mãe dela. O rapaz era um jovem inconsequente e sedutor.

Quando descobriram sobre a gravidez, mandaram minha avó embora, e praticamente a expulsaram da casinha onde morava, a qual pertencia à família de meu pai.

Então ela saiu daqui e foi morar em Ipatinga com uma tia. Logo que ela arrumou emprego, arrumou um barraco para ela, minha mãe e o filho mais novo, de 14 anos.

Logo que eu nasci, a minha mãe viu a notícia na TV sobre um acidente de avião. Meu pai estava nele. Não houve sobreviventes. Então eu nunca o conheci. Só por fotos que eu mesmo procurei depois por pura curiosidade. A família dele nunca procurou minha mãe e nunca quis saber do neto. Minha avó era muito boa pra mim. Enquanto viveu cuidou de mim, mas infelizmente quando eu completei 06 anos ela teve um aneurisma e faleceu. Lembro-me de ver minha mãe chorando muito. A barriga dela estava enorme e vez ou outra ela olhava para o ventre e falava alguma coisa. Ela estava grávida de Iolanda que nasceu semanas depois.

Eu não entendia muita coisa, mas sabia que as coisas não estavam fáceis para nós. De vez em quando eu via alguém chegar com alguma vasilha nas mãos e logo depois minha mãe me chamava para comer.

Eu dormi várias noites com fome e frio. Ouvia minha mãe chorar durante à noite. E Iolanda chorava demais. Acho que ficou desnutrida. Então o pessoal da Pastoral da Criança nos descobriu e foi a nossa salvação. De repente a minha irmã ficou saudável e eu também. Eles acompanharam a nossa família e ajudou minha mãe a sobreviver. Uma das mulheres da pastoral ajudou minha mãe a ganhar dinheiro lavando roupa dos outros. Primeiro ela pagou minha mãe para lavar as suas roupas, depois divulgou o seu trabalho no bairro onde morava. Então de repente minha mãe estava cheia de clientes.

Quando eu tinha uns sete ou oito anos minha mãe conheceu o Geraldo. Ele era dono de uma pequena mercearia. Era muito trabalhador, mas nunca tinha casado. Era uns dez ou quinze anos mais velho que ela, mas era um homem muito querido no bairro onde morávamos, pois fazia muita caridade. Nós mesmos recebemos muita ajuda dele sem ao menos nos conhecer direito.

Ele se apaixona por minha mãe e não demora muito para se casar com ela. Era como se tivéssemos ganhado na loteria. A nova casa tinha televisão, geladeira nova, ventilador, colchões macios. Tudo o que não tínhamos. Sem falar nas comidas diferentes. Ele fazia de tudo para mim e Iolanda e passou a nos tratar como filhos. Passamos a andar bem vestidos e eu comecei a frequentar uma escola melhor.

Ele se tornou realmente meu pai. Eu o amei desde o dia em que me colocou para dormir e contou histórias pra mim. Ele ia nas reuniões da minha escola, me incentivava a alcançar boas notas e me ensinava os deveres de casa. Ele era muito mais presente do que minha mãe. Jogava bola comigo sempre que chegava da mercearia.

Eu pensava que éramos uma família feliz até ouvir certa noite uma discussão feia dele e minha mãe. Mas no outro dia eu os vi conversando numa boa então achei que tudo estava bem.

Um dia eu estava indo para escola e escutei um garoto dizer para o outro que minha mãe era uma puta. Eu adiantei o passo e segui em frente. Geraldo sempre me falou para evitar confusão. Ele detestava brigas e conversa fiada; dizia para eu ficar bem longe disso. Acho que tenho muita coisa dele. Mais até do que de minha mãe.

Eu o admirava muito e desejava ser igual a ele, cercado de amigos quando eu crescesse. Mas eu admirava principalmente a amizade dele com o Dr. Isaque. O doutor era mais novo que o Geraldo e andava sempre de carro novo. Era noivo de uma mulher muito bonita, mas que morava em outra cidade, não me lembro o nome.

Mar de rosas e de espinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora