Capítulo 36 - Isabel

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Marcelo é tão previsível. E isso ajuda muito o nosso relacionamento. Eu sempre sei como ele vai agir nas situações de conflito. Sempre sei até as palavras que vai usar para se desculpar.

Eu paro o carro em frente ao cemitério e vou até o túmulo do meu pai (Eu sei que Sr. Antônio não é meu pai de verdade, mas nunca vou deixar de chamá-lo de pai). Olho a foto dele na lápide e digo:

― Que confusão você causou na minha vida hein! Você não podia ter me deixado sozinha com dona Júlia. Eu me sinto desprotegida e isto me dá medo, não gosto de me sentir ameaçada, você sabe como fico... Ah! Estou meio desorientada pai, com muito medo de perder Marcelo para sempre. E você sabe como eu o amo. Sabe como não gosto de perder. Ele não pode me deixar por nada. Eu faço tudo por amor a ele.

Eu enxugo as lágrimas que descem atrevidas pelo meu rosto e aproximo um pouco mais da foto dele. Parece que ele está me olhando com tanta ternura e tenho a sensação de ser abraçada por ele.

― A minha vida toda eu me senti muito amada por você e quando eu o perdi foi como se eu tivesse perdido meu ar, meu escudo, pois tudo agora me acerta o peito e me fere. Estou tentando do meu jeito ajeitar as coisas pra viver pra sempre do lado de Marcelo, mas ele nem sempre entende meus atos. Tudo o que faço é por nós dois.

Sinto o vento soprar meus cabelos. Fecho os olhos e trago a imagem do meu pai no meu pensamento. Lembro dos abraços que ele me dava quando eu era criança, lembro do dia do meu casamento, ele entrando todo sorridente comigo na igreja. Ele me amou tanto e eu nem era filha dele. Será que devo contar isso pra ele? Acho que sim.

― Preciso te contar uma coisa. Eu não sou filha sua. Houve um grande engano. O enfermeiro que você pagou não trocou os bebês conforme havia combinado. Na verdade pai, você nunca foi pai mesmo. Nem da filha do seu vaqueiro. Mas para mim você sempre será. Não importa se não tenho seu sangue.

Tenho a sensação de ver a foto se mexer. Mas isso é coisa da minha cabeça.

― Pois é, pai, a minha mãe me criou como se eu fosse uma bastarda. Agora que sabe a verdade está se remoendo de dor, mas não tenho pena, acho que ela merece.

Eu fico um tempo calada só observando o túmulo e a foto dele. Sei que um dia estarei escondida na terra também, mas espero que seja num futuro bem distante, pois quero viver muitos anos ainda ao lado do homem da minha vida.

― Agora preciso ir. Tenho que despistar o Marcelo e eliminar o corpo da minha cunhada querida.

Vou até uma sepultura um pouco mais à frente e pego um buquê de rosas vermelhas que está sobre ela e trago para o túmulo do meu pai.

― São pra você. Roubadas, mas com amor. Da sua filha querida.

Entro no carro e vejo pelo retrovisor quando Marcelo se dirige até o carro dele. Está com um boné preto e óculos escuros. Como se conseguisse se esconder atrás deste disfarce tão medíocre. Mas finjo que não vejo e acelero calmamente.

Eu não faço questão de me livrar dele e vou seguindo sem rumo pelas ruas até me decidir o que fazer.

Depois decido ir em direção à casa de Iolanda, mas logo em seguida desisto e sigo rumo ao meu cabeleireiro. Paro em um estacionamento próximo e sigo andando a pé. Ao virar a esquina eu paro atrás de um poste e fico esperando Marcelo aparecer, mas ele não aparece. Volto desconfiada e fico olhando atenta para todos os lados. Uma mulher de cabelos loiros esbarra em mim e resmunga um palavrão. Eu continuo andando atenta e não vejo Marcelo.

Mar de rosas e de espinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora