Prólogo

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New Haven, Estados Unidos

Agosto de 2008

Um grito de agonia me despertou, diversão à vista, emergi em uma casa, haviam duas pessoas presentes, mas se contasse com o morto seriam três. O grito que me despertou era da mulher deitada no chão, eu podia sentir o seu fio de vida se esvaindo, ela teria no máximo mais cinco minutos, tinha sido esfaqueada, estuprada e estava agonizando, ela era loira, parecia uma surfista famosa que tinha morrido com a cabeça espatifada em uma pedra semana passada, ela era bonita –dentro do possível para uma humana-, não sei se minha opinião seria a mesma sem o sangue.

Os seus olhos negros pararam em mim. Como ela podia me ver? Bom, o nome dela é Bianca Blainey, tem 28 anos, e é esposa de um conhecido meu, ela pode me ver porque sentiu a minha presença. Os seus olhos carregavam uma mensagem clara, "vá embora daqui", apesar de estar à beira da morte, ainda era durona.

Mas apesar de isso ser tudo muito interessante, o sangue, o corpo, e tal, a parte mais curiosa é que a segunda pessoa viva no local era uma garota de 10 anos, filha de Bianca, -essa é azarenta- ela era alta pra idade que tinha, e bem forte também, tinha os olhos negros da mãe e o cabelo da mesma cor, que veio do seu infame pai, e tinha certamente matado o cara que estava atirado no canto da sala, uma garota de 10 anos, tinha matado um bandido, a facadas, bom só tinha uma conclusão a chegar, ela tinha puxado à mãe.

Seria surpreendente uma garotinha matando gente, mas durante os milênios que vivi, aprendi que garotinhas até com menos idade são capazes de coisas piores.

Eu sentia o cheiro do desespero que emanava de cada poro do corpo da menina, eu considerei ficar parado olhando enquanto a mulher morria e a filha entrava em desespero, normalmente é o que eu faço, é divertido, a dor, a agonia, e o desespero me trazem uma sensação boa.

Mas essa garota era interessante, então resolvi ser generoso.

Me materializei, a fumaça negra saia do meu terno, cara, essa fumaça é muito foda. A garota me olhou, não horrorizada como o as pessoas costumam fazer, mas com certo desprezo, tipo "o que esse cara que jorra fumacinha preta ta fazendo aqui?".

-Quem é você? – agora a garota me analisava, com certa curiosidade, mas o seu desespero aumentava a cada segundo.

-Sou Sifiel. – a garota levantou a sobrancelha para mim

- O que diabos isso quer dizer?

Dei uma gargalhada, divertida.

- Qual o seu nome? - perguntei me aproximando

- Não te interessa – ela cruzou os braços

Desafiadora.

- Se não me interessasse eu não estaria perguntando – silencio, reservada. – sua mãe está morrendo.

- Eu sei – ela me olhou com uma cara que dizia "você acha que eu sou idiota?"

Ela olhou para a Mãe estirada no chão, seu desespero aumentou, e outro sentimento surgiu, medo, eu achei que esse seria o momento em que começaria a choradeira, mas, ao analisá-la novamente, percebi, ela não choraria. Forte.

- Que garotinha insensível você. – eu a provoquei, sabia que viria uma discussão interessante a seguir – Sua mãe está morrendo e você nem chora.

- Minhas lágrimas não vão salva-la, de que me adianta chorar? E eu não sou uma garotinha.

- Não vão mesmo, mas, eu posso salvar sua mãe – a estudei, racional. – e, só uma garotinha diria uma coisa assim.

- Quem é você para poder salva-la? – agora Bianca deve ter no máximo 3 minutos de vida, eu já podia sentir a presença da Morte.

- Já disse, sou Sifiel.

- E eu já lhe perguntei que diabos isso quer dizer, o que você quer?

- O que eu quero? – eu tinha entendido exatamente o que ela queria dizer, ela queria saber o que eu queria em troca da vida da mãe dela, a garota sabia que eu queria alguma coisa. Inteligente.

- Não se faça de idiota, o que você quer em troca? – eu sorri, um sorriso malicioso, cruel, típico.

- Eu posso ser muito exigente.

- Qualquer coisa, não importa.

Corajosa. Idiota.

Se eu fosse decente, eu argumentaria, explicaria para aquela garotinha inocente no que estava se metendo, mas eu não era decente. Fui em direção à Bianca, me abaixei ao seu lado, vi o sofrimento em seus olhos, o sofrimento, por sua filha estar dando mais do que deveria, e nem saber disso, assim como o seu marido fez. Sorri para ela.

- Parece que esse é o seu carma – sussurrei ao seu ouvido.

Toquei seu peito com o dedo indicador, ela sentiu dor, não posso dizer que não foi de propósito, chamas negras emergiram do local em que eu toquei e cobriram cada corte do seu corpo, os cortes sumiram e deram lugar a linhas pretas, as chamas então, foram direto para a canela direita da garota, e ali deixaram tatuada uma grande cobra negra, a marca do pacto que ela fez.

Levantei, e olhei para a garota, que olhava, agora espantada, para a sua canela, esperei ela me olhar, quando ela o fez, eu falei.

- Sua mãe está a salvo – ela assentiu – agora quer saber qual o preço disso, Christie?

- Como você sabe o meu nome?

- Eu sei de muitas coisas garota. – me posicionei na sua frente, e me abaixei para olhar em seus olhos.

- Qual foi o preço? – ela perguntou

- Christie Blainey, o seu corpo, agora é meu corpo. Coniuncta pro unuscorpore.

Ela ia perguntar o que isso queria dizer, mas não teve tempo, sombras a envolveram, e eu induzi minha consciência para dentro do seu corpo.

Então eu vi a sala pelos olhos da garota.

Chama NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora