Ouvimos um grito angustiante que vinha de algum lugar perto dali.
Não sabiamos nem se era humano.
Meu instinto foi segurar na mão de Lorrany, como seu protetor, mesmo sabendo que ela odiava aquilo do príncipe cuidar de sua donzela. "Não estamos em um país dos Normais, eu não preciso que homem algum cuide de mim" ela costumava dizer. Mas estranhamente ela até chegou mais perto aceitando muito bem o gesto.
- Que droga...
Catherine não conseguiu terminar a frase porque o grito sumira de repente e pequenos estalos vinham em seu lugar.
- CORRAM LOGO! - Zedhek foi o primeiro a correr em auxilio do que quer que estivesse sendo atacado.
Confesso que não sou do tipo que espera os outros tomarem as rédeas da situação antes de fazer algo, mas o estranho afeto de Lorrany me paralisara por alguns instantes.
Ela tinha um amor um tanto mais feroz e independente, ela estava comigo porque queria e não porque precisava de mim, e isso era sempre muito claro em suas ações.
Puxei-a pela mão e corremos com os outros, adentrando a mata que era o Bosque dos Caçadores. Estavamos longe do centro ou de qualquer casa, em uma trilha que levava quase aos limites permitidos do reino.
Poderia ser algum animal selvagem a principio, afinal o nome do bosque era bem sugestível que ali habitavam muitos seres. Mas os estalos que não cessavam davam a estranha sensação de...
As minhas especulações foram esclarecidas quando avistamos a cena de tortura.
Um homem alto, trajando um capuz que um dia fora branco, mas já estava terrivelmente sujo e desgastado. Tinha uma aparencia jovem, deveria ter uns 20 anos ou mais, e nos encarou ao chegarmos.
Ele tinha um braço esticado e acima de nossas cabeças havia um garoto cujo rosto estava repleto de marcas de queimadura. Seu corpo todo tremia e lágrimas caiam de seus olhos vermelhos de terror, mas era um choro silencioso. Era incapaz de emitir mais sons.
- Solte o rapaz! - Zedhek gritou ao mesmo tempo que Bernard já havia se transformado em um falcão e voava sobre o mago, enquanto Catherine colocou as mãos no chão ja preparada para o ataque.
- Procuro informação. Esse não me é mais útil - ele falou com a voz calma, e atirou o garoto na direção oposta a nós apenas com um leve movimento com o braço - mas vocês podem ser.
- Só pode estar de brinc...
O mago fez um gesto com suas mãos e Bernard se transformara novamente em humano, flutuando como o garoto há instantes atrás.
O estranho fechou as mãos e seus olhos ficaram inteiramente dourados. E da mesma cor as estranhas marcas que surgira no rosto e pescoço de Bernard.
Quando ele gritou de dor era a nossa deixa.
Catherine fazia crescer galhos pontiagudos do chão que tentavam atacar o feiticieiro. Ele por sua vez sentou no chão com as pernas cruzadas, levitando um pouco do solo, mas ainda em estado de transe.
No entando havia uma barreira invisivel que o protegia. Os galhos se partiam no ar.
Coloquei minhas mãos no chão e canalisei minhas forças para debaixo de onde ele estava.
Nesse instante ele flutuou até acima da copa das árvores com Bernard ainda gritando. Consegui desprender uma grande porção do solo e a fiz voar em sua direção. Terra se chocou na parede invisivel que rodeava Bernard e ele. Ainda sem sucesso.
Mas que porra, eu e Catherine não poderiamos fazer muito com nossos poderes.
Rafael atirou alguns raios contra a redoma mas sem sucesso algum.
Embora nosso primeiras investidas tenham sido um fracasso, Zedhek evocou dos céus um raio estrondoso que finalmente quebrou a proteção.
Bernard caia dos ares quando Rafael o parou a pouco do chão. Ele tinha o rosto marcado como o outro menino e estava inconsciente.
O mago voltou com seus olhos verdes normais e sorria debochado.
- Conhecimento. A base de tudo. Creio que mais nenhum de vocês me acrescentará muito mais - ele disse voltando de novo ao chão e caminhando em direção aos limites do reino.
- Onde você pensa que vai? - Evelyn fez seus pés congelarem ao chão. Ele virou ainda sorrindo e fez o gelo virar água.
- Talvez eu prefira brincar com vocês um pouquinho, já que insistem tanto.
Com um estalar de dedos os panos que ele tinha acima da virilha sumiram, revelando seu tronco desnudo. Tinha a cabeça raspada, a pele morena avermelhada e ombros largos. Tinha um físico forte, mas sendo um feiticeiro não era esperado ele ir para o ataque direto.
Evelyn transformou suas mãos em cristais de gelo compridos e pontiagudos e correu para cima do oponente.
Lorrany e Zedhek tentavam acordar Bernard, enquanto Catherine correra no auxilio do menino desconhecido. Daniel respirava ofegante com as braços apertando a barriga, agaixado ao lado de uma árvore, Rafael tentava acalmá-lo.
Senti na responsabilidade de ajudar Evelyn então.
Ela tentava acerta-lo com seus cristais mas ele era ágil e debochado. Finalmente ela acertou-o, fazendo com que gotas de sangue surgisse no canto de sua boca. Ele, como anteriormente, apenas sorria.
Evelyn tinha aulas de luta desde cedo, típico das famílias mais abastadas, então deu seu mortal pra trás com um forte chute contra a cabeça do oponente. Ele riu alto e estralou o pescoço na posição normal.
Foi nesse instante de descuido que revidei um poderoso soco em sua cara. Era essa minha maior habilidade.
Ele cambaleou alguns passos e passava a mão no rosto, mas ainda com o sorriso no rosto.
- Pelo visto temos um fortão aqui. Mas sabe, eu acho que a garota me entediou muito, você me entende né?
Ele mordeu o lábio inferior e fechou as duas maos. Parecia que meu peito tinha feito o mesmo. Cai de joelhos com impacto e pude ver que Evelyn se encontrava na mesma situação.
Tudo dentro de mim tinha parado e eu gritei o máximo tentando aliviar alguma coisa.
Cai com a cara na grama e o mundo girava sobre minha cabeça inaudível.
Pude vislumbrar o estranho caminhando até meus amigos e os atirando para longe de Bernard.
Agarrou-o pela pescoço e levou-o até uma árvore, fazendo com que seu corpo se entrelaçar ao tronco do carvalho.
Quando ele andou para de nós, foi aí que tudo ficou escuro.
...
