Epílogo - Carlos Eduardo

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No meu aniversário de vinte e dois anos, Bruna estava gravando umas cenas de novela em Bariloche. Tirei uns dias de folga, aproveitei um recesso da faculdade e fui também. Muito vinho, uma piscina aquecida de frente para a neve, várias histórias para contar e um tratamento para uma crise de garganta a base de antibiótico e anti-inflamatório. Três semanas de indisposição depois, ela faz xixi num palitinho e me vem com essa.

─ Meu Deus! Estou grávida. – Saiu pulando de alegria pela casa.

Não sei se fiquei mais assustado ou feliz com a notícia. Eu ia ser pai. Já deveria ter me acostumado que a minha vida com Bruna era assim, um atropelo de cada vez. A gente era simplesmente soterrado de imprevistos. E de felicidade. Foi assim quando começamos a namorar. Foi assim quando decidimos morar juntos. Foi assim quando nos mudamos para um apartamento maior caindo aos pedaços, porque era mais perto do trabalho.

Passou tão rápido que a minha impressão é que dois dias depois daquilo, as calças jeans dela já não fechavam. E os seios, para minha felicidade, dobraram de tamanho da noite para o dia. Eu tinha muito medo que ela entrasse na vibe de não engordar. Mas Bruna virou uma mamãe na mesma hora do teste positivo.

Foi ao médico. Começou a ler livros sobre maternidade. Parto normal. Educação infantil. Seguiu uma alimentação balanceada e fez exercícios com regularidade. Ela me confessou que sentia necessidade de aprender a ser mãe. Tinha medo de ser como Dona Aparecida.

Eu sabia que ela não corria esse risco. Bruna era toda feita de amor. Mesmo assim, ela chorava muito. Por medo. Por causa dos hormônios. E por causa da sua personagem na novela. Não estava previsto no contrato uma gravidez.

Logo, porém, essa aflição acabou. O autor, conhecido de longa data, deu um jeito de engravidar a personagem também. Sem maiores empecilhos para atrapalhar, aí é que a barriga cresceu rápido mesmo. Bruna terminou de gravar empinando um barrigão de sete meses e meio. Sua personagem fez um sucesso estrondoso. Um exemplo de mãe solteira batalhando para criar os filhos.

Parte do sucesso, para além do fato do talento inquestionável da minha mulher, deveu-se ao fato de Bruna estar resplandecente. A gravidez lhe caiu muito bem. Suas curvas eram ao mesmo tempo femininas e maternais. Ela foi garota-propaganda de diversas marcas. Assim como de campanhas de aleitamento materno e acompanhamento pré-natal.

Minha mãe escolheu cada uma delas com carinho. A esta altura, estava tão apaixonada por Bruna quanto eu. Afinal, ela ia lhe dar um neto. Nem ligou para o fato de ter sido sem o menor planejamento. Mas, a verdade era que para minha mãe, assim como para papai e Caê, Bruna já era mais que minha mulher muito tempo antes disso tudo acontecer. Acho que quando ela foi lá e contou para o delegado que suspeitava da mãe como mandante do meu sequestro, abriu mão da sua própria família para entrar na nossa.

Agora estávamos muito perto de aumentar a trupe. Eu acompanhei o crescimento daquela barriga sentindo meu coração aumentar na mesma proporção. Sentir a criança mexer sempre me fazia chorar de emoção. Eu não tinha ideia de como queria ser pai até ouvir o coraçãozinho do meu filho batendo forte. Bruna tinha esse poder, ela me oferecia o melhor de mim. Ela era capaz de me dar coisas que nem eu sabia que precisava.

A vida, porém, virava uma bagunça. Nós estávamos no meio de um reforma no apartamento. Não chegamos a terminar, começamos o quarto do bebê. Caixas de enxoval espalhadas pela casa. Lançamento da segunda Atmosfera sob minha responsabilidade para o fim do ano. A ponte-aérea da gravação da novela. As provas na faculdade. E um curso de pais de primeira viagem. Tudo ao mesmo tempo.

Por isso, nem acreditei quando ela me chamou de madrugada avisando que a bolsa estourara. Levantei de uma vez, totalmente assoberbado. Ela estava mais do que tranquila, fazia uma caretinha de dor por causa de uma contração, mas continuava a comer uma tigela de salada de frutas preparada exclusivamente para quando a fome batia de noite.

─ Pode se acalmar, meu amor. – Usava apenas calcinha e sutiã. Pude ver sua silhueta contra a lua, a barriga de quarenta e uma semanas não diminuiu a atração que eu sentia por ela. Eu a amava mais ainda. – Vai demorar. Estou somente avisando. Opa! – Respirou fundo. E se curvou de dor. – Talvez nem tanto assim. Lá vem outra.

Eu me aproximei depressa para ajudar, fiz massagem no quadril. Quando passou, eu a beijei. Nossos beijos nunca deixaram de ser intensos.

─ Faz parte? – Eu perguntei.

─ Faz parte. – Respondeu sorrindo.

Tomamos um banho de banheira juntos, isso ajudou a relaxar. Depois, desci com todas as malas e a parafernália de bebê que precisaríamos. Enquanto isso, ela se vestia. Deixara de ser uma tarefa simples no sétimo mês. Calcei seus sapatos. Liguei para os meus pais. E saímos para o hospital.

Foram quase dezesseis horas de piadinhas para afastar o pensamento da dor, apertos fortes de mão, beijos carinhosos e alguns insultos da parte dela. Somente quando a levaram para a sala de parto é que me dei conta que nossa vida ia mudar drasticamente dali a instantes.

Rezei para que tudo desse certo. Pareceu uma eternidade o tempo que demorou para uma enfermeira vir me chamar para assistir ao parto. Eu vesti a roupa sem acreditar que ia ser pai antes dos vinte três anos. Antes do dia terminar, provavelmente. Uma lágrima rolou. Felicidade.

Entrei na sala de parto, Bruna já fazia força. Ela sorriu quando me viu. Que mulher guerreira! Que sorte a minha de encontrá-la! Eu a beijei no alto da cabeça entre uma tomada de fôlego e uma empurrada.

Então, o médico me chamou para ver, o bebê estava saindo. Maior emoção não existe. Meu coração acelerou de tal forma que pensei que iria parar. Um choro colocou tudo no seu lugar novamente. Eu chorei junto. Bruna chorou junto. Éramos pais.

A aventura estava apenas começando. Eu a beijei. Não tinha palavras para agradecer àquele presente. A convite do médico, cortei o cordão umbilical, enquanto Bruna segurava nosso menino no colo pela primeira vez.

José Carlos nasceu às duas e meia da tarde. José em homenagem ao avô de Bruna, Carlos, em homenagem ao meu. Tinha quatro dos onze quilos ganhos por Bruna. Era um tourinho de forte. Foi logo procurando o peito para a primeira mamada ainda na sala de parto. Não apresentou dificuldade na tarefa.

Depois, Bruna foi levada ao quarto para descansar. E eu fiquei com aquela trouxinha de gente nos braços, emocionado até os ossos. Examinei com mais calma antes de levá-lo para conhecer o resto da família que esperava ansiosa no final do corredor. Um precioso presente de Deus. Agradeci em pensamento a possibilidade de ser pai.

Definitivamente, parecia-se com Bruna. Teria a mesma pele dourada de sol e o cabelo volumoso da mãe, mas, então, de relance, ele abriu os olhos ainda inchados de recém-nascido e eles estavam lá, os olhos azuis de mamãe. Os meus olhos azuis.

─ Seja muito bem-vindo, Zeca! – Disse com a voz falha de choro e alegria transbordando de mim para o mundo.

***

Por Onde AndeiOnde histórias criam vida. Descubra agora