Em Algum Lugar

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Em algum lugar na cidade além da pradaria, vivia uma pequena criança chamada Arthur. Um garoto inteligente que adorava construir suas próprias coisas. Todas as manhãs, ele se arrumava pra ir à escola, mas antes de sair amarrava uma toalha vermelha em seu pescoço e ia com sua bicicleta para escola. Sentia o vento bater em seu rosto e imaginava-se voando pelos céus como seu super-herói preferido.

Ao chegar à hora de voltar para casa, Arthur mudava seu trajeto e ia até as colinas em sua vizinhança. Lá pedalava velozmente, subindo e descendo. Sendo que no topo do mais alto monte uma forte macieira sempre o acolhia. Na sombra da árvore encontrava descanso e alimento. Seus frutos eram doces, a brisa suave e a visão agradável. De lá podia ver todo o bairro do alto, e os pássaros pareciam festejar sua presença.

Ao crepúsculo ele voltava para casa. Sua mãe sempre sorridente o abraçava e beijava, perguntava se estava na macieira, ele sempre respondia que sim. Seu pai um escritor não de sucesso, mas não menos sorridente que sua mãe, pegava Arthur e o girava no ar, ambos se sentiam felizes.

Ao anoitecer se reuniam em volta da lareira, pois não tinham dinheiro para pagar a luz. Seu pai então pegava sua antiga sanfona e tocava canções enquanto sua mãe contava algumas histórias para ele. Aquilo tudo era tão mágico, mas Arthur logo pegava no sono e sua mãe o levava para a cama.

Em outro lugar, não tão distante da casa de Arthur, vivia Ana, uma garota triste, mas sonhadora. Todas as manhãs seu mordomo a acordava para ir à escola, colocava os lacinhos em seus cabelos dourados, assim como seu preferido vestidinho branco e seus sapatinhos pretos; preparava seu lanche e a levava para escola em seu luxuoso carro.

Sua aula preferida era literatura, a professora sempre lia contos infantis, onde as histórias eram felizes, sem emoções pesadas, como sonhos relaxantes. Ela se emocionava com as diferentes histórias apresentadas. Imaginava-se dentro de cada uma delas. Lugares onde poderia ser feliz, sem o perigoso sentimento de melancolia a cercando.

Quando chegava à hora de voltar para casa, o mordomo a buscava e a levava para a aula de balé, à hora mais especial do dia. Sentia-se como uma fada, flutuando pelo assoalho brilhante. Sempre que fazia algum passo mais arriscado seu fiel mordomo orgulhosamente a aplaudia.

Quando finalmente voltava pra casa, a realidade retornava. O véu de sonhos e pensamentos felizes que havia construído durante o dia era destruído com o contraste de seu pai, que levado pelos efeitos do álcool, acabava a maltratando. Em meio à noite a acordava com tapas e beliscões culpando-a pela morte de sua esposa. O mordomo sempre o afastava da garota para algo pior não acontecer e, toda vez acabara sofrendo ameaças de demissão.

Um dia na saída da escola de Ana, o mordomo se atrasou para buscar-la, e foi quando Arthur, do alto do morro conseguira ver Ana, parada ali, segurando sua bolsinha. Na mente de Arthur ela era uma fada saída diretamente das histórias que seu pai contava. Então pegou a bicicleta e desceu rapidamente o morro para ir de encontro a Ana, mas ao chegar à escola, ela já havia desaparecido.

Arthur voltou para casa, e sua mãe notara algo diferente em seu olhar e perguntou o que havia acontecido, ele respondeu com toda sua inocência ter visto uma fada, como aquelas das historias de seu papai, sua mãe abriu um sorriu acolhedor, e carinhosamente o abraçou.

No outro dia Arthur levantou mais cedo do que o de costume. Passou correndo por sua mãe dizendo que estava indo a escola, mas na verdade ele foi até a macieira, e ficou observando o colégio de Ana, sentado na beirada daquele morro. Algumas crianças estavam chegando com seus carros de luxo, até que o belo de todos os carros que já vira apareceu. Lá estava Ana descendo do carro. Arthur ficou observando-a maravilhado, o vento balançando os loiros cabelos da pequena e o lindo vestidinho alvo, ela parecia um anjo, uma criatura mágica saída diretamente dos livros. Ela ficou ali como uma escultura por alguns segundos, até entrar na escola.

Quando chegou à hora das crianças saírem, Arthur ficou na frente da escola, em pé ao lado de sua bicicleta, aguardando por sua pequena fada. Quando as crianças começaram a sair, Arthur procurava por ela em meio a todas aquelas crianças, mas não a encontrava. Então ela apareceu, caminhando sozinha na direção de Arthur, que sentiu suas pernas tremerem e seu coração palpitar. Mas assim que ela chegou perto, o pequeno menino foi ao lado dela, tentado falar algo galanteador, mas não conseguira pronunciar uma palavra sequer. Ela olhou para ele, abaixou a cabeça e entrou no carro.

A partir de então, Arthur começou a sair mais cedo da escola para ir à saída da escola de Ana. Ele fez isso durante uma semana, planejando o que dizer, treinando sozinho embaixo da macieira, até conseguir falar com ela. Mesmo assim, a primeira coisa que pronunciou foi apenas um "Oi!" quase tão baixo que nem um esquilo escutaria, mas ela abriu um sorriso tímido, mostrando que havia escutado as palavras que Arthur havia pronunciado.

Depois de alguns dias Arthur a convidou para sair, ela pediu permissão ao seu mordomo, que a deixou ir. Arthur a mandou subir na bicicleta e começou a pedalar para seu lugar secreto, a macieira no alto do morro. Ela ficou tão encantada com a visão do lugar, e pelo sabor daquelas maçãs que não queria mais sair dali. Eles passaram a se encontrar todos os dias, iam para a macieira, e se divertiam juntos.

No dia de Natal, Arthur foi até a casa de Ana para lhe entregar um presente, uma almofada de retalhos em forma de coração que sua mãe havia costurado para ele a dar de presente. Ela ficou tão lisonjeada com a surpresa, que deu um beijinho em Arthur e, tímida correu para dentro abraçada com sua almofada. O mordomo permanecera segurando a porta, olhando com um sorriso para Arthur e, o alertou que já era hora de ele ir para casa.

 O pequeno ficou tão feliz com o beijo que recebeu, com isso não sentia as pernas, tinha a sensação de estar voando. Quando voltou para casa, teve mais uma surpresa, sua casa estava enfeitada para o natal, e melhor, os pisca-piscas estavam acesos, seu pai havia conseguido vender um de seus livros e pagar as contas de luz, e pela primeira vez a geladeira estava cheia. Ao anoitecer prepararam a mesa para fazer uma ceia, quando chegou à hora sentaram-se juntos e oraram agradecendo por tudo aquilo, Arthur abriu os olhos em meio à oração e olhou para seu pai que estava chorando de alegria enquanto pronunciava as palavras da oração, em seguida olhou para sua mãe que também estava chorando. Ela abriu os olhos e olhou para Arthur, entregando-lhe um sorriso tão profundo que até o pequeno se emocionou. O pai terminara a oração, ficando em pé, tentando conter suas lágrimas, chamando a todos para um abraço grande abraço em família. Ali eles comemoraram a noite mais feliz de natal.

No dia seguinte, Arthur foi brincar na macieira com sua bicicleta, quando chegou, deparou-se com Ana em pé na beirada do morro, olhando para baixo. Arthur desceu da bicicleta e chamou-a atenção, ela olhou para Arthur que observou o rosto coberto por hematomas e inchaços, em sua camisola branca havia sangue entre as pernas. Ela chorava muito e quando viu Arthur, chorou ainda mais, correndo para seus braços.

Arthur perguntou o que tinha acontecido, mas ela não respondeu, ela simplesmente queria ir embora, para um lugar feliz. Arthur pediu para que ela o esperasse ali, pois iria pegar algumas coisas em sua casa, e logo estaria de volta. O garoto retornou para sua casa, pegando algumas tábuas, pregos, lona velha, e ferramentas, com tudo isso, voltou à macieira. Lá ele começou a fixar as tábuas em sua bicicleta enquanto Ana permanecera sentada apenas observando o que ele estava fazendo.

Algum tempo depois estava pronto, o que fazia eram asas para sua bicicleta, prontas para voar até o lugar mais distante da terra. Arthur estendeu sua mão para Ana, pedindo para que ela sentasse no banco de trás, e ao fazê-lo, envolvera seus pequenos braços fortemente em sua cintura. Arthur pegou distância, posicionou sua maquina alada e pedalou como nunca havia pedalado, Ana permaneceu abraçada com ele até que ambos caíram morro abaixo, mas como um raio de esperança, o planador abrira voo, e ambos foram para o reino das estrelas, viajando entre as nuvens.

É assim que gosto de imaginar o final dessa historia, que pela violência de um homem que culpava uma garotinha pela morte da mãe durante o parto, forçou Arthur, com toda sua inocência, ter o impeto de dar esperança para sua amada, e assim tentar viajar com ela pelos céus, em busca de um lugar melhor, onde não houvesse injustiça ou maldade. 

Em Algum LugarOnde histórias criam vida. Descubra agora