O Brinquedo

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Clickclickclick… Clickclick… Click!

Parou de dar corda em seu brinquedo e o pôs no chão. O boneco então olhou para seu criador, com olhos que lembravam os de uma criança de verdade, deixando o Sr. Clown felicíssimo. Criar bonecos era um de seus hobbies favoritos e ele era bastante perfeccionista quanto a sua qualidade. Se não pudesse confundi-lo com uma criança de verdade, então não passava de lixo.

—O que devo fazer, Sr. Clown?

Que bom que perguntou. — A face gorda e maquiada de seu deus abriu um sorriso. — Me traga uma criança para o banquete.

***

—Por aqui. — Disse Mark,  atravessando os arbusto sem folhas do bosque. Alguns galhos tentavam se agarrar aos casacos dos dois, talvez tentando impedi-los de chegarem ao seu trágico destino.

Faltavam vinte dias para que o inverno desse lugar ao calor da primavera em Rainfalls, mas o frio não parecia querer ir. Suas botas amassavam a neve, fazendo barulhos que lembravam isopor.

—Tem certeza de que viu Austin indo pra lá? — Perguntou Mark, se virando para Levy.

—Tenho. Não sei pra onde exatamente ele foi, mas foi nessa direção.

—E nessa direção, só tem uma coisa…

Os dois ficaram em silêncio, olhando na direção em que Austin, naquela manhã, decidiu ir. Atrás de arbustos nus e árvores sem cores, estava aquela mansão.

Não era a velha mansão de um senhor cruel que sequestrava criancinhas pro jantar, ou de adoradores de Satanás. Também não era a mansão amaldiçoada de uma velha bruxa, sacrificada na época da inquisição, nem de um massacre digno de um filme de terror. E talvez fosse isso que mais assustasse.

Ninguém sabia nada sobre ela.

A verdade era que ninguém nem ao menos sabia que tinha uma mansão até alguns dias atrás, como se…

—Como se ela tivesse surgido numa névoa.

—O que? — Mark olhou para Levy, enquanto este falava sozinho.

Constrangido, o garoto sorriu nervoso. O jovem loiro de doze anos, numa situação normal, faria alguma piada sobre a esquisitice do amigo de cabelo escuro, contudo estava assustado demais para tal. Já estava escurecendo e os ventos naquele lugar pareciam vozes malditas.

—Já são quase seis horas.

Quando Mark disse aquilo, olhando seu relógio, um facho de luz artificial veio atrás de si, iluminando sua touca vermelha que ganhou de presente de natal de sua tia Suzanne, de Seattle. Seus olhos, acostumados à escuridão crepuscular, foram cegados pela lanterna de Levy. O garoto pôs a mão na frente dos olhos.

—Fiquei com medo de que demorássemos muito, então trouxe duas lanternas que achei na despensa.

Levy abaixou sua lanterna prateada, iluminando o chão esbranquiçado e ofereceu a outra ao amigo. Ele à acendeu e apontou na direção da mansão. Não era necessário bússola nem mapa para se chegar lá, pois o ápice da construção parecia estar à mais de vinte metros do chão.

O jovem Levy só conseguia pensar no quão estranho foi aquela manhã. Seu irmãozinho de setes anos havia olhado na direção da misteriosa mansão e quando Levy se aproximou, Austin apenas disse:

“Vou dar uma volta e já volto” e não voltou mais.

O que mais o incomodava, no entanto, foi a forma como o pequeno olhou para ele. Seus olhos castanhos cheios de brilho afetuoso pareciam secos e opacos naquela hora, como os de um defunto.

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