A Meralha do Medo

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Num mundo, por esse espaço infinito, existiu um reino muito evoluído em que há muito tempo eliminaram todas as doenças; desta forma, seus cidadãos tinham uma vida muito longa e prazerosa, que proporcionava-lhes um grande acúmulo de conhecimento. Seu rei tinha uma paixão imensa por descobertas, e além do interesse pelo conhecimento, tinha também uma curiosidade formigante... Por isso,  mantinha vários pelotões especializados em exploração. Eles eram formados por exploradores terrestres, marítimos e aéreos, compostos por especialistas de todas as áreas do conhecimento. Tudo para aproveitar a exploração e fazer o máximo de descobertas. Todo o reino era cercado por uma muralha imensa, linda e assustadora. Essa muralha existia há milênios e não se conhecia história alguma de período em que não existisse esse grande paredão protetor. Tudo o que se sabia, era que do outro lado, existiam monstros terríveis, magias inimagináveis, perigos tenebrosos e tentações que corrompiam a alma apenas num olhar.  Por isso, não existiam portões, janelas ou mirantes e ninguém jamais olhava pro outro lado de forma alguma.

Nesse reino existia um bobo da corte, que além de ser bobo do rei, cuja função era entretê-lo, era também o seu melhor amigo, confidente e conselheiro. O Bobo conhecia o rei melhor que qualquer outra pessoa. Nos últimos tempos observara que seu soberano amigo andava meio triste por estarem chegando poucas informações de novas descobertas. O fato é que eles já tinham explorado todos os cantos possíveis do reino e estavam espalhados por várias partes do universo, colonizando e explorando outros planetas; não eram descartados nem mesmo os não habitáveis, onde expedições chegavam com suas estações espaciais e por lá ficavam estacionados por décadas até descobrirem tudo o possível.

Incomodado com o visível abatimento do soberano, o Bobo resolveu lançar um desafio ao amigo, com a intenção de  animá-lo:

- Majestade! Já exploramos todos os cantos do reino, acima e abaixo de nossas terras, dentro dos rios e oceanos. Conhecemos todos os tipos de pedras, catalogamos todas as espécies de plantas, insetos, animais, peixes e aves que por aqui existem e nos planetas mais longínquos em que já chegamos. E mesmo com todos os nossos avanços e nossa capacidade, nunca exploramos atrás de nossa imponente muralha...
- O que você esta querendo com essa conversa? – interrompeu o rei – Sabe que nunca fizemos isso porque existem forças mortais do outro lado.
- Sim! – concordou o Bobo – Eu conheço as histórias que chegaram até nossos tempos, mas não tenho certeza se tudo é verdade. Já exploramos tantos outros planetas e o senhor não estranha que nada do que encontramos chege aos pés do perigo que existe no outro lado de nosso gigantesco murro de pedras?
- Ouvindo você falar, realmente não temos certeza se as histórias são verdadeiras, afinal são de tempos primitivos e com todo o conhecimento, armas e tecnologia que possuímos, creio que podemos superar qualquer dificuldade em busca de mais conhecimento. Chame todo um pelotão de exploradores disponível. É hoje que todas essas histórias serão postas a prova.

O Bobo voltou depois de algum tempo e chamou o rei pra conversar com os exploradores que o esperavam no salão de conquistas, cujo espaço era o mais amplo do castelo, onde normalmente eram realizadas as reuniões com os exploradores.

O rei e o obo chegaram ao salão onde todos falavam alegremente enquanto comiam e bebiam. O rei acomodou-se na tribuna real e cumprimentou a todos, fazendo com que silenciassem pra escutar suas palavras:

- Amigos! Hoje estamos aqui pra um novo passo em nossa jornada... Muito conquistamos para orgulho de nosso reino e há ainda muito pra conhecermos e conquistarmos nessa vastidão espacial. Mas, nenhuma conquista pode se comparar ao que venho aqui para lhes incumbir de realizar. – Ouve-se um pequeno murmúrio. – Hoje é um dia que entrará pra história, é o dia em que iniciaremos a exploração da área... do outro lado de nossa gigantesca muralha.

O silêncio imperou por um tempo ao ponto de se poder ouvir a respiração ofegante de algumas crianças, que brincavam de pega-pega do lado de fora do castelo. A voz do líder dos exploradores soou como uma espada afiada, cortando o silêncio:

- Majestade! Nós ouvimos direito? O senhor quer que exploremos a região aonde existem perigos que jamais enfrentamos ou se quer imaginamos?
- Sim, meu amigo. – Respondeu o rei – é para isso que aqui estamos hoje, para nos lançarmos à conquista dum espaço novo, a conquista que colocará nossos nomes na história.

Ouviu-se vozes acaloradas e temerosas. A voz do líder do pelotão se fez ouvir novamente:

- Perdão majestade, ninguém aqui quer que pense que não respeitamos sua sabedoria e suas ordens, todavia,  atravessar a muralha é uma sentença de morte. Não posso concordar em enviar meus homens para a morte.

O Bobo interrompeu o diálogo e questionou:

- Com licença! Mas quantas pessoas você conhece ou que conhece alguém que passou pro outro lado, ou alguém que tenha ouvido falar de alguém ter ultrapassado as muralhas e não ter voltado?
- Ninguém! É uma loucura que ninguém jamais se atreveu em fazer. – Respondeu o líder.
- Então você está me dizendo que ninguém jamais foi pro outro lado?
- Sim!
- E como alguém pode garantir que realmente existe algum perigo do outro lado?

Todos se olharam confusos sabendo que o bobo tinha razão. O rei então falou:

- Meus nobres amigos pode ser que realmente existam os perigos dos quais ouvimos falar, mas o mais provável é que tudo seja uma peça pregada pelo tempo e a distorção de estórias.

Todos se mantiveram quietos. O rei retirou do bolso um discurso que havia rascunhado e leu demoradamente, detalhando todas as histórias que conheciam sobre o outro lado para precavê-los, e dava opções criativas para os exploradores superarem os possíveis obstáculos de forma a motivá-los e os encorajar. E assim terminou o discurso:

- ...Não caiam meus amigos, não se deixem abater e voltem para serem glorificados por nosso povo e amados e admirados ainda mais por seus familiares e amigos, voltem para contar a todos o que existe no outro lado de nossa imponente muralha. Vão meus exploradores, não tropecem pelo caminho, não caiam nas tentações, por favor, não caiam!!!

E o líder respondeu:

- Não cairei meu rei! Não cairei!

Frase que foi repetida por todos os outros exploradores. Então eles saíram para prepararem-se para jornada de suas vidas e partiram.

Dias se passaram e o rei começou a ficar impaciente. Ao completar três semanas o rei mandou chamar as dez melhores e mais bem preparadas equipes de exploradores das regiões mais próximas ao reino. Reuniu todos no salão de conquistas, que desta vez ficou lotado, e seguiu-se o mesmo debate da outra vez. Ao final, sem relatar o fato de já ter enviado outra equipe antes deles, os enviou para o outro lado do muro relendo o discurso que havia preparado para o envio da primeira equipe. Assim esses também partiram.

O tempo passou e sem ter notícia dos exploradores, o rei mandou chamar todas as equipes possíveis. Desta vez,  se aglomeraram na imensa praça que existia em frente ao castelo. O Bobo o aconselhou a parar, pois como os outros não retornaram, seria possível que os relatos antigos realmente fossem verdadeiros. Mas o rei obsecado com a ideia de novas descobertas não deu ouvidos e relendo o discurso, enviou seus exploradores para o lado desconhecido e cada vez mais assustador. Ao final do discurso, instigados pelo rei, todos saíram repetindo em coro:

-Não cairei meu rei, Não cairei! Não cairei meu rei, não cairei! Não cairei meu rei, não cairei!

E conforme eles se afastavam o rei os observava temeroso em saber que era sua última possibilidade de descobrir a verdade sobre o outro lado. O bobo, ao seu lado, também estava temeroso, mas aos pouco e conforme os exploradores se distanciavam começou a entender o que estava acontecendo. O medo vencia qualquer necessidade. O medo é a maior força que existe, força que movimenta um homem ou o paralisa. O medo é o que os impulsionara para novas descobertas, pois assim estariam sempre antecipados e preparados para qualquer acontecimento ou perigo. Foi esse mesmo medo que os fez fugir de sombras movidas pelo tempo e pela imaginação. Esse medo ficava estampado nas vozes dos exploradores. Conforme iam se afastando e repetindo a frase, ela ia ficando menos entendível e foi justamente por isso que o bobo entendeu o que estava acontecendo. Os  exploradores estavam declarando o que fariam, o medo era tanto que dentro de cada um a frase se transformava e o bobo ouvia a verdadeira intenção daqueles homens conforme eles se distanciavam:

-Não cairei meu rei, não cairei! Não cairei meu rei, nunca irei! Nunca irei meu rei, nunca irei! Nunca irei meu rei, nunca...

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⏰ Última atualização: Mar 14, 2018 ⏰

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