Não está sendo fácil.
Ver você partir me quebrou em mil pedaços, mesmo sabendo que era necessário. Hoje fazem 6 anos que você se foi e levou a minha alma, boa parte dela. Você me usava e eu gostava disso, você adorava me comparar com suas amigas, principalmente aquela que você via nua todos os dias em sua casa, no seu quarto.
Você se lembra do seu quarto? Eu me lembro. Como esquecer? Foi lá onde tivemos nossa primeira noite de amor, pelo menos eu achei que era amor, na verdade era só mais uma foda pra você, um passatempo, afinal, a temporada de caças estava aberta, certo? Errado.
Errado, Claire, eu não era um animal irracional, pelo menos não até você chegar, eu tinha uma vida, amigos, eu tinha sanidade mental, sanidade essa que você destruiu no primeiro instante em que se aproximou de mim, você foi a minha bomba atômica, partindo-me em mil pedaços.
Lembro de quando você ia em minha casa, o jeito que minha mãe a tratava, você era como uma filha pra ela, era inclusa em todos os planos desde os mais simples até os mais estrondosos, ah se ela soubesse as coisas que você fazia para filha dela...Sabe, Claire, nós tivemos momentos bons, me lembro de cada um deles como se fosse ontem, as maratonas de once e pizzas na sua casa, os trabalhos em dupla no seu quarto, até as idas ao cinema, pena que pra eles serem bons para você, tinham que terminar em sexo, caso contrário ficava emburrada e me expulsava de sua casa.
Sabe, eu sempre desconfiei daquela sua amiga que você dizia não ter nada, mas que sempre quando dormiam juntas havia marcas de chupões e arranhões pela sua pele albina, aquela que te ligava no meio do nosso sexo e você saía para encontrá-la me deixando sozinha no seu quarto, na sua cama em meio aos lençóis brancos que a cobriam. Trouxa. Trouxa em pensar que um dia seria nossa casa, nossa cama, nosso quarto, trouxa em pensar que se eu fizesse o que você queria e transasse com você alguma coisa iria mudar. E mudou. Meu corpo ainda tem suas marcas, minhas pernas tem as marcas dos cortes que você fazia em mim por negar o sexo, minhas costas carregam as lembranças dos açoites que eram usados por você para me punir por sair com minhas amigas.
Eu, sua, você, delas.
Eu queria que tivesse sido diferente, queria não ter perdido a sanidade, queria poder dizer que não me culpo pelo que aconteceu, mas me culpo. Eu levanto de manhã e o meu primeiro pensamento do dia é "onde está Claire com suas torradas para eu roubar?", foda.
Foda lembrar que um dia eu a amei e deixei você me usar acreditando que o amor era assim, e mesmo sabendo que não era, mesmo sabendo que eu precisava de ajuda, eu continuava ali, porque precisava te ajudar, você mais do que ninguém precisava de ajuda e eu estava ali, sempre.
Nós vivemos nesse relacionamento por longos cinco anos, você era minha vida, meu porto seguro, você cuidava de mim, me protegia, mesmo com todas as falhas e erros.
Na primeira semana que você se foi eu escrevia cartas e as guardava na caixa do sapato que você me deu de presente quando completei a maior idade. Um mês depois que você se foi eu contei à mamãe as coisas que você fazia e mostrei a marca das consequências. Um ano depois que você se foi, eu saí a primeira vez com uns colegas da faculdade, fomos à um bar na esquina da rua onde nós demos o primeiro beijo. Dois anos depois que você se foi eu entrei em um relacionamento sério com Trixie, uma de nossas ex colegas do ensino médio, ela não se assustou quando viu as marcas que você deixara em meu corpo e em meu coração, ela cuidou delas. Três anos depois que você se foi eu fiz a primeira tatuagem, Trixie estava comigo assim como mamãe, nós três tatuamos três andorinhas para representar o nosso amor e saber que onde quer que fossemos, mesmo longe, sempre estaríamos presentes. Quatro anos depois que você se foi eu fui pedida em casamento por Trixie, mamãe ajudou-a a preparar tudo. Cinco anos depois eu me casei e hoje, Claire, nos seis anos de sua partida, eu estou aqui com minha esposa ao meu lado, encarando seu caixão, citando uma carta para você, a carta de sua morte.
Eu não sei a fundo no que você transformou a sua vida nesses seis anos em que partiu, mas sei que não foi em uma das melhores. Drogas, bebidas, tudo que eu tentei evitar estando cinco anos ao seu lado você trouxe presente nos seis longe de mim. Clínicas e clínicas não foram capazes de segurar você, nem eu fui, você sempre foi incansável, imparável, tudo, menos indestrutível. A prova está aqui diante dos meus olhos e das pessoas que junto comigo cercam seu caixão, pessoas essas que assim como eu amavam você e você também as deixou.
Sua amiga foi primeiro que você, me lembro de te ver vagamente no enterro dela, você chorava e se culpava mesmo sem ter culpa alguma, você sabia que a quantidade de drogas e álcool que ela ingeria só a levariam à um lugar, igual a você agora.
Eu não trouxe minhas filhas, é, filhas, depois que eu e minha amada casamos, ao completarmos sete meses conseguimos a guarda de duas irmãs gemêas de 15 anos, elas são lindas, são vivas, intensas, assim como a mãe, um pouco dramáticas como eu, mas só um pouquinho.
Como eu queria não estar aqui nesse lugar frio e nublado olhando você dentro desse caixão, Claire, mas você não me deixou escolhas não é mesmo? Acho que você fez tudo em mim e por mim, menos me dar escolhas.
Sinto pela perda dos parentes próximos e aos amigos, ela poderia ter sido uma mulher forte e independente, mas não podemos escolher pelas pessoas, nós apenas podemos assistir as consequêncais de seus atos.
Com carinho, Virgine.

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One day
Teen Fiction-...estupidez de minha parte tentar amar alguém que não sabe o que é o amor.