Capítulo 5 (Final)

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Final


III


Enquanto caminhava pelo centro da cidade, eu pensava no que deveria levar para o Miguel quando o procurasse. Ele estava puto comigo, com toda a razão, mas o fato de ele não ter terminado de vez me deixava mais tranquilo.

Por causa do meu passado com o Igor, eu tinha me deixado envolver, e apesar desse envolvimento não ter sido romântico nem sexual, foi o suficiente para me deixar confuso por vários dias e me afastar da pessoa que eu amava. Mas eu precisava convencer o Miguel de que entre mim e o Igor era só isso, uma amizade, e ele não tinha com que se preocupar. Eu errei, mas não fiz nada além de me afastar, e faria o que fosse necessário para nos aproximar novamente.

Como havia deixado o carro numa rua menos movimentada, eu tinha uma variedade de lugares e coisas para ver, mas nada parecia adequado para o momento. Na floricultura me dei conta de que um buquê de flores prestes a morrer não seria ideal, eu já o imaginava jogando no chão e pisando em cima. A loja de chocolates caros também, apesar ser de tentador, eu sabia que ele me acusaria de estar sendo irônico, comparando a sua paixão por doces com o cardápio fitness do Igor. Roupas e perfumes também não tinham aquele clima de pedido de desculpas. Pensei em coisas fofas como as pelúcias, mas elas eram toscas demais, pegavam poeira e ocupavam espaço.

Suando por causa do calor, cansado e desanimado, eu já ia parar para descansar na loja de uma amiga quando vi colado num poste algo que me chamou a atenção: um anúncio de filhotes para doação. Na hora eu só pensei em como a fofura de um daqueles pequenos vira-latas viria a calhar. Fui até o local indicado e encontrei quatro cachorrinhos fofos, filhos de uma cadela grande e magrela, mas inteligente, e não tive dúvidas: se aquilo não amolecesse o coração do Miguel, aí sim eu deveria desistir. Escolhi o mais esperto e levei ao pet-shop mais próximo onde ele foi banhado, arrumado e colocado numa cesta para presente. Ali também comprei o pacote de ração adequada. O Miguel não tinha muito tempo disponível, mas a casa dele tinha quintal e ele já tinha tido cachorro antes.

Quando cheguei à casa dele, dei a sorte de encontrar o portão aberto e não tive que chamar lá da rua, a porta estava fechada, mas eu sabia que ele estava em casa, ele costumava estar estudando naquele horário. Bati e esperei, segurando a cesta com cuidado para que o pequeno não tentasse fugir. Em poucos segundos ouvi passos do lado de dentro e o Miguel abriu a porta, mas fechou imediatamente quando viu quem era. Eu já ia bater de novo quando a porta se abriu, e sem dizer nada ele me tomou a cesta onde estava o filhote e pá, bateu a porta na minha cara novamente. Conforme eu imaginava, ele gostou do presente, só não me deu tempo suficiente para me favorecer dele.

Respirei fundo. Quem disse que ia ser fácil? Em alguns minutos bati de novo, sempre devagar, com paciência. Chamei porque eu tinha certeza que ele estava ouvindo, a sala era pequena e dava para ouvir o cachorrinho do outro lado. Depois de umas três tentativas, finalmente ele se deu por vencido, abriu a porta e ficou parado na minha frente, com o cachorro no colo. Ele demorou a perguntar o que eu queria e quando perguntou, eu demorei a responder. Ficamos nos olhando, eu analisando a figura um pouco mais alta do que eu, com o rosto e os olhos vermelhos de chorar, o cabelo ruivo desgrenhado e as unhas roídas, além de manchas marrons no canto na boca e nos dedos. Ele andou comendo chocolate aos montes, com certeza. Ele tinha sofrido e era do tipo que demonstrava os sentimentos, fossem de tristeza ou de raiva, fossem de alegria e amor.

Ao vê-lo, eu me questionei sobre os motivos que me levaram a me apaixonar e a usar uma aliança, se eu ainda sentia aquele entusiasmo e aquela vontade de estar junto que eu sentia antes. Senti vontade de abraça-lo e dizer que eu tinha sido idiota em duvidar do que eu sentia, que eu estava louco para ficar com ele novamente, mas claro, as coisas não eram assim tão fáceis.

Meu Mais ou Menos Inimigo (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora