Seis da manhã.
Ela observa a janela que havia sido esquecida aberta. O dia que amanhecia esboçava cores ligeiramente amareladas e um tanto esverdeadas devido à vegetação das casas vizinhas. Uma calmaria marcava presença. Tudo parecia completamente certo, mesmo com tantos problemas acontecendo em sua vida e no mundo. Até os pássaros pareciam perceber a calmaria e comemoravam com uma salva de assobios baixinhos, mas encantadores.
Ainda deitada em sua cama, ela desvia seu olhar para seu lado esquerdo, observando a garota que ali dormia serenamente. Ela respirava devagar em seu sono profundo. Lentamente, ela aproxima sua mão para o rosto da outra, deslizando os dedos delicadamente sob a pele levemente fria de sua amada.
Ainda conseguia se lembrar de tudo que havia passado naquela noite.
Sentia-se sortuda e ao mesmo tempo deprimida. Ela não merecia passar por isso, mas não podia ir contra às decisões alheias. A garota se mexe e muda da posição em que dormia e solta um suspiro. Cris então decide se levantar, para evitar de acordá-la. Foi ao banheiro e em frente do espelho, despiu-se.
O espelho denunciava o avanço da doença. Suas pernas tremiam e seu corpo estava mais magro do que nunca. Tinha que sentar-se. Rapidamente. Uma súbita tontura atinge sua cabeça, fazendo-a se desequilibrar. Cris respira fundo, enquanto se apoia no box do chuveiro e senta-se na tampa da privada. Hoje seria um dia importante demais para se aborrecer, não podia ficar frustrada com qualquer coisa...
Se esticando para alcançar a torneira, ela começa a encher a banheira, ajustando a temperatura aos poucos. Ficou ali até que visse as rugas aparecerem em seus dedos. Lavou seu rosto e finalmente saiu da banheira, enrolando-se em uma toalha e indo assim mesmo em direção à cozinha.
O perfume da convidada era presente naquela área e Cris pôde finalmente ver a bagunça que fizeram ali de madrugada. Por sorte, nenhum copo foi quebrado. Com a toalha muito bem enrolada e presa em seu colo, ela começa a preparar o café da manhã. Café, torradas e algumas frutas deviam ser o suficiente, pensou consigo mesma.
Pegou tudo que havia preparado e os colocou sob a mesa em frente de uma janela, voltando a observar o lado exterior da casa. Havia algumas pessoas saindo para algum lugar, cachorros caminhando, crianças indo para a escola... o sol já denunciava que o dia seria quente e uma sensação quente e acolhedora preenche o peito de Cris. Ela sentiria falta de tudo isso se pudesse. Sentiria falta de sentir o sabor quente do café em sua boca. Do suor escorrendo pelas suas costas. De todos os cheiros e sabores, de todas as sensações e toques. De todas as conversas e lembranças. De todos que conhece, conheceu e daqueles que nunca conhecerá. Mas já havia feito sua decisão, não havia outro jeito, além de adiar o inevitável.
- Cris?
O barulho de pés se arrastando lentamente quebra completamente com a concentração de Cris sobre a paisagem externa. Amelie havia acordado.
- Está chorando?
Cris imediatamente leva suas mãos às bochechas, percebendo enfim as lágrimas que haviam deslizado pelo seu rosto sem que ela percebesse. As enxuga com as costas da mão e olhando para Amelie, sorri docemente:
- Bom dia...
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Ela.
RomanceEsclerose Lateral Amiotrófica [Também chamada de: ELA] "Nessa doença, as células nervosas se quebram, o que reduz a funcionalidade dos músculos aos quais dão suporte. A causa é desconhecida. O principal sintoma é a fraqueza muscular."