Colocando um ponto final!

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Era um dia de domingo, estava nublado, ela havia decidido que era chegada a hora, pois deveria enfim acabar com algo que já se arrastava por meses.
Entrou em seu carro e partiu em direção à casa que outrora foi o seu lar, ao chegar próximo a casa um arrepio invadiu seu corpo e todas as lembranças boas e ruins vieram a sua mente e de repente sentiu uma vontade louca de dar meia volta com o carro e sair dali o mais rápido possível, mas sentiu que não podia fazer isso, pois o fim já havia chegado mesmo antes de ter se decidido a colocar um ponto final e mesmo querendo desistir teve que seguir em frente. Quando chegou a porta da casa, as mãos tremiam, como um soldado que se alista para a guerra, sem ao menos saber o que lhe espera no campo de batalha, enfim, mesmo relutante ela apertou a campainha, e aqueles minutos que seguiram foram de uma espera torturante, foram os minutos mais longos de sua vida, a ansiedade e o medo tomaram conta do seu coração,  não podia imaginar naquele momento como ele estaria, como a separação o havia afetado, talvez quisesse vê-lo forte, mas como poderia se para ela a separação foi tão traumática que ela não era mais nem sombra da pessoa que foi um dia, se transformara em alguém que tentava aos poucos juntar o que restou para reconstruir uma nova história, tentando todo dia trilhar novos caminhos, aprendendo com os erros cometidos a nunca tomar decisões precipitadas. Talvez desejasse vê-lo da mesma forma, acabado, mas como poderia desejar-lhe tal coisa, porque apesar de tudo ele era um homem bom, talvez as circunstâncias da vida os colocaram em lados opostos, quase que adversários, mas não foi sempre assim, ele já havia sido em algum momento seu parceiro, amigo, esposo, ela não achava direito agora desejar-lhe tanto mal, ou talvez só não quisesse mesmo era sentir remorso.
De repente a porta se abriu e lá estava ele de pé com um sorriso no rosto, parecia até que havia ficado mais bonito do que quando estavam juntos, nem parecia que os anos o haviam afetado, mas como podia ter se recuperado tão rápido, pensou, mas logo sem demora pediu licença para adentrar a casa e foi logo falando o que queria, explicou-lhe que tinha vindo para conversar sobre a separação e que pelo fato dele não responder aos e-mails, telefonemas e nem as mensagens decidiu então ir até lá, se desculpou pela invasão e disse que queria terminar com aquilo bem rápido, mas enquanto falava uma criança desceu as escadas correndo e perguntando se o café já estava pronto, chamando-lhe de pai, e como se um buraco gigantesco a tivesse engolido, não conseguia entender o que estava acontecendo ali, parecia mais que tinha entrado no meio da gravação de um daqueles capítulos de novela Mexicana, no entanto sem saber as falas e nem o enredo da história. Naquele instante ela desejou levantar e sumir dali, mas as pernas não obedeciam, a voz teimava não sair, não conseguia falar nada.
Foi então que ouviu no fundo da sua quase inconsciência ele chamar o menino pelo nome de Rafael.  Como poderia ter dado esse nome a uma criança fruto da infidelidade, pensou, já que esse era o nome do filho deles que havia morrido após o parto, e para ela era doloroso até ouvir o nome do seu filho morto, porque a fazia lembrar a tristeza de tê-lo perdido, mas antes que todas as lembranças ruins viessem a sua mente, ouviu a voz do menino que sussurrava ao pai: - É Fernando meu nome papai não é Rafael! - Você se esqueceu de novo? Mas não era esquecimento, parecia mesmo que havia feito de propósito para mexer com seu psicológico, talvez quisesse apenas fazê-la lembrar um pouco da vida que tiveram juntos, porém a sua ideia não foi bem recebida, pois quando ouviu isso, decidiu ir embora naquele instante, porque se sentia sufocada, talvez fossem  as mentiras que agora havia descoberto ou talvez fosse toda aquela imagem de família feliz que inebriava seus pensamentos,  a ideia de que ele a havia enganado por tanto tempo, a deixava enojada, porque o relacionamento deles durou sete anos, e aquela criança não tinha mais que cinco anos. A raiva foi tão intensa que levantou e partiu para cima dele. - Se já não estivesse separada de você pediria o divórcio agora, faz um favor para mim assine esses papéis logo para que eu saia daqui o quanto antes. Ele implorou para que ela o ouvisse, tentando explicar o que parecia inexplicável, mas ela não quis saber, só repetia assine os papéis, mas de repente não conseguiu mais segurar as lágrimas e chorou, ele tentou abraça-la, mas logo tratou de afastá-lo dizendo; que ele não significava mais nada, e que o choro não era de amor por ele, mas de arrependimento por ter perdido tanto tempo amando alguém que nunca mereceu o seu amor, foi então nesse momento tomada de uma raiva intensa que resolveu contar-lhe que já estava noiva e só precisava dos papéis do divórcio para se casar novamente e se houvesse um pouquinho de respeito ainda entre eles, assinaria os papéis e a deixaria partir para sempre de sua vida. Foi o que ele fez, pegou uma caneta e com tanto sentimento no olhar ele assinou e quando estava já abrindo a porta para sair definitivamente da vida daquele homem, ouviu uma vozinha que veio da cozinha que disse: - Vem comer panqueca comigo! Como ela poderia recusar, aquele menino era uma vítima assim como ela, mesmo não querendo, decidiu então ficar por mais alguns minutos, mas o seu maior desejo era partir sem olhar para trás, chegar em casa logo, queria chorar e chorar até que aquela dor saísse do seu coração, e o menino insistia para que viesse logo, então não teve como adiar mais, e ela foi até a cozinha para experimentar as tão deliciosas panquecas, mas por pura inocência pensou se tratar das panquecas que tão bem havia ensinado o homem que um dia foi seu companheiro a fazer, ingenuidade dela, logo a realidade lhe deu um balde de água fria quando o menino disse: -Essas panquecas são receita da mamãe! A decepção foi tão grande, que ela se sentiu usurpada, como se alguém houvesse roubado o seu lugar de mãe e esposa naquela casa, porque nem o crédito das panquecas ela havia conseguido, nessa hora ele sorriu como se estivesse achando algo engraçado, mas de repente uma raiva a dominou, sentia raiva de tudo, daquela casa, daquele homem cínico, daquela família a qual ela não pertencia, foi então que tomada de uma coragem infinita ela perguntou: - Cadê sua mãe Fernando? É esse o seu nome, não? E quando o menino ia responder o pai o interrompeu pedindo que fosse pegar sua mochila, pois já estava atrasado para o colégio.
Aquela situação a estava irritando, pois afinal não tinha mais nada haver com aquele homem, então decidiu ir embora antes que aquela pobre criança voltasse para amolecer seu coração, mas antes que saísse pela porta o menino desceu as escadas correndo, deu-lhe um abraço bem apertado e perguntou-lhe quando voltaria, e quase sem resposta para dar-lhe, disse: - Vai em casa, pede para seu pai me ligar e a gente marca de fazer alguma coisa juntos, pode ser? - Tenho que ir estou atrasada! Ela não sabia o porquê, mas não conseguiu dizer não aquele menino, alguma coisa nele mexia com ela, talvez os olhos do pai que o menino tinha e que amava tanto, não soube discernir naquele momento o que seria.

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